Naquela tarde chuvosa, o som da chuva suave tocava o telhado da minha pequena casa. Eu estava sentada em minha mesa, olhando para um pergaminho com cálculos, tentando economizar cada centavo que conseguia ganhar nas missões. Meu sonho de ter uma casa própria não era fácil de alcançar, mas eu persistia, cortando gastos e mantendo a esperança. Enquanto meus pensamentos divagavam, um leve bater de porta interrompeu meu raciocínio. Levantei-me e caminhei até a porta, abrindo-a com um suspiro. Do lado de fora, um mensageiro encharcado e ofegante segurava um pergaminho.

— Terumi-san. — Ele começou, enquanto tentava enxugar o rosto com uma das mangas. — Recebi ordens para entregar isso pessoalmente. É uma convocação do quartel-general. — Fez uma breve reverência.

Eu agradeci, pegando o pergaminho com uma leve reverência. Ele assentiu e se afastou rapidamente, voltando para o abrigo do quartel. Fechei a porta, desenrolando o pergaminho e lendo o conteúdo com atenção. Mais uma missão de nível C. Nada fora do comum sendo eu apenas uma Genin, mas o pedido em si, era bastante peculiar. Fui requisitada para cuidar de um jovem garoto, filho de uma família rica da vila. Ele tinha nove anos e, segundo a descrição, era um pouco mimado. Aparentemente, ele insistia em conhecer e ter amigos ninjas. A missão parecia simples, mas para mim, que ainda lidava com minha própria timidez, entreter e ensinar uma criança mimada parecia ser um grande desafio. Respirei fundo, guardando o pergaminho e me preparando para sair. Coloquei minha jaqueta ninja preta sobre as roupas, ajustei as sandálias antiderrapantes e peguei minha mochila com o essencial. A chuva ainda caía suavemente enquanto eu caminhava pelas ruas da vila até o quartel. Ao chegar ao prédio do quartel-general, fui guiada até a sala de um dos superiores, que parecia me esperar já com uma expressão séria, mas também com um toque de humor em seu olhar. Ele era um homem de meia-idade, cabelos grisalhos cortados curtos e vestia o uniforme tradicional da vila. Seus olhos, de um castanho atento, analisavam-me com cuidado enquanto eu me aproximava e fazia uma leve reverência.

— Terumi, sei que essa não é uma missão típica, mas acreditamos que você será perfeita para o trabalho. — Ele disse, entregando-me um segundo pergaminho, provavelmente com mais detalhes sobre a criança e a tarefa. — Esse garoto, Ryu, é único. E para ser sincero, sua família insiste muito para que ele tenha essa experiência. Ele é o único filho dos Hayashi, então você pode imaginar a pressão em cima dele. — Completou.

Assenti, entendendo melhor a situação. A família Hayashi era bastante conhecida na vila. Seu pai era um comerciante influente e sua mãe, uma respeitada figura social, sempre presente em eventos de caridade e nas festividades locais. Eles tinham dinheiro, status e uma grande preocupação com o filho, que, segundo boatos, era considerado difícil e exigente.

— Ele é… Bem, digamos, um pouco temperamental. — O superior continuou, com um sorriso. — Mas talvez ele tenha algo a aprender com você. Confio que saberá conduzir a situação. Lembre-se de manter a paciência e, se possível, ensine a ele algo sobre a importância da responsabilidade. — Suspirou.

— Entendi. — Respondi com um leve aceno. Minha voz saiu firme, embora sentisse um leve nervosismo borbulhar dentro de mim. Ser responsável por uma criança e ainda uma criança rica e mimada, era um novo tipo de teste.

O superior me observou por um momento antes de dar um último conselho:

— Apenas seja você mesma, Terumi. Às vezes, a melhor lição para alguém é ver a perseverança e o foco em outra pessoa. — Advertiu.

Com essas palavras encorajadoras, despedi-me e saí da sala, sentindo o peso da responsabilidade nos ombros, mas também uma pontada de curiosidade. O céu ainda estava nublado, e a chuva continuava fina, deixando um frescor leve no ar enquanto eu caminhava de volta para a saída do quartel. Próximo à entrada, outro mensageiro aguardava para me conduzir até a residência da família Hayashi. A casa deles era uma construção impressionante, uma mansão de arquitetura elegante, com jardins bem cuidados e estátuas tradicionais nas entradas. Caminhando ao lado do mensageiro, comecei a pensar em como eu poderia lidar com um garoto de apenas nove anos que tinha a atenção de uma família inteira voltada para ele. Quando finalmente chegamos à entrada da casa, um mordomo de aparência impecável abriu a porta, reverenciando-me formalmente. Ele era um senhor de idade, com cabelos prateados bem penteados e uma postura firme. Sua expressão era austera, mas ele parecia acostumado com a rotina de receber visitantes.

— Senhorita Terumi, seja bem-vinda à residência Hayashi. — Ele disse em um tom cortês. — O jovem mestre Ryu está à sua espera na sala principal. Ele foi instruído a se comportar… — O mordomo fez uma breve pausa, como se ponderasse a escolha das palavras. — … da melhor forma possível. — Completou.

Acompanhei o mordomo através do corredor principal, passando por quadros e esculturas que exibiam o gosto refinado e o estilo opulento da família. A cada passo, eu me preparava mentalmente para a primeira interação. Ao chegar à sala, fui recebida por um garoto de olhos brilhantes e uma expressão confiante, quase desafiadora. Ryu parecia pequeno em seu traje formal, com uma camisa branca impecável e um colete azul-marinho. Seus cabelos eram escuros, penteados cuidadosamente, mas com uma mecha rebelde caindo sobre a testa. Ele me observava com um misto de curiosidade e desdém, como se esperasse que eu fizesse algo espetacular imediatamente.

— Então você é a ninja que veio para me divertir hoje? — Ele disse, sem rodeios, cruzando os braços enquanto mantinha o queixo erguido, com uma expressão de expectativa arrogante.

Mantive a calma, respirando fundo antes de responder.

— Sou Terumi e estou aqui para passar o dia com você, Ryu. — Respondi em tom calmo, tentando soar amigável. — Podemos fazer algumas atividades juntos e talvez até você possa aprender um pouco sobre o que significa ser um ninja. — Ele revirou os olhos, balançando a cabeça.

— Aprender? Eu só quero ver você fazer alguns truques ninjas. Não é para isso que serve um ninja? — Notei o leve desprezo na voz dele, mas mantive meu tom calmo.

— Ser um ninja é mais do que apenas truques, Ryu. Exige esforço, paciência e muito treinamento. E você sabia que alguns ninjas da minha idade passam horas, até dias, em uma mesma posição, apenas para se concentrarem? — Ele arqueou uma sobrancelha, parecendo desinteressado, mas eu percebi que havia um toque de curiosidade em seus olhos. Talvez ele não soubesse disso. Talvez o conceito de disciplina fosse completamente novo para ele.

Aos poucos, tentei conduzir a conversa, contando pequenas histórias de minhas missões e de como o treinamento constante e o esforço eram fundamentais para o que fazíamos. Ele escutava, embora demonstrasse impaciência de tempos em tempos, resmungando sobre como tudo aquilo parecia “chato”. Entendi, então, que esse primeiro contato seria um verdadeiro teste de paciência, não apenas para mim, mas também para ele.

Concluímos essa introdução quando ele, em um suspiro exagerado, perguntou:

— Tá, tá bom… mas podemos pelo menos fazer alguma coisa interessante agora? — Bocejou.

Sorri, assentindo.

— Claro. Vamos ver o que podemos fazer. Mas lembre-se: paciência e concentração são parte de qualquer atividade ninja. Então, antes de qualquer coisa, vou te ensinar como os ninjas se preparam para começar. — Mantive a postura doce.

Ryu cruzou os braços e me lançou um olhar de desafio, mas eu percebi que ele estava disposto a experimentar. E assim, começamos uma introdução que, para ele, seria apenas um dia de diversão; mas, para mim, era a chance de plantar uma semente de disciplina e respeito.

Considerações Finais:

Observei Ryu com um sorriso encorajador e fiz um pequeno gesto para que ele prestasse atenção. Era hora de mostrar a ele um pouco do que os ninjas podem fazer, mas eu precisaria adaptar a demonstração ao meu nível de habilidade e ao ambiente ao nosso redor.

— Ryu, acho que você vai gostar do que vou te mostrar. — Falei, tentando soar mais confiante. — Vou usar um jutsu bem básico, mas você verá como é útil no dia a dia de um ninja. — Levantei minha mão e deixei que meu chakra fluísse, preparando-me para executar o Kawarimi no Jutsu, ou Técnica de Substituição. Olhei ao redor e avistei um galho caído a alguns metros de nós. Satisfeita com a escolha, finalizei o selo com as mãos e me concentrei.

Num piscar de olhos, eu desapareci na frente dele, substituindo-me pelo galho, que agora estava onde eu estava instantes antes. Eu reapareci logo em seguida, a uma curta distância, ao lado do arbusto onde o galho estava. Ryu arregalou os olhos, visivelmente impressionado.

— Uau! Como você fez isso? Você sumiu de um lado e apareceu do outro! — Ele praticamente pulava de empolgação, enquanto examinava o lugar onde o galho havia ficado. Eu me aproximei novamente e tentei explicar com simplicidade:

— Esse é um truque chamado Kawarimi no Jutsu. Quando estamos em perigo, conseguimos trocar de lugar com algo ao nosso redor para evitar ataques. É uma das primeiras habilidades que aprendemos, mas é muito útil. — Ryu ficou calado por um momento, absorvendo tudo o que eu tinha dito.

— E o que mais você pode fazer? Você consegue lançar fogo ou algo assim? — Perguntou com um olhar ansioso, provavelmente esperando um jutsu mais chamativo. Ri um pouco, surpresa com a curiosidade dele.

— Na verdade, sim. Eu consigo lançar uma bola de fogo. — Respondi, vendo o rosto dele se iluminar ainda mais. — Mas essa técnica é muito perigosa, especialmente em lugares fechados como este. — Ele assentiu, parecendo compreender, mas ainda fascinado pela ideia.

— Ah, então eu adoraria ver isso lá fora qualquer dia desses. — Disse ele, cheio de expectativa.

— Combinado. Vou te mostrar quando estivermos em um lugar seguro e com bastante espaço. — Sorri, contente com seu interesse.

Para manter o ritmo, abaixei-me, pegando um punhado de folhas úmidas do chão, e me concentrei em meu chakra novamente, ativando o Henge no Jutsu, a técnica de transformação. Com essa técnica, eu assumi a aparência de Ryu, só que alguns centímetros mais alta e com um sorriso confiante. Ryu deu um passo para trás, surpreso, e soltou uma risada incrédula.

— Você… Você se transformou em mim! Que incrível! — Finalmente eu parecia ter toda a atenção dele. Desfiz a transformação e sorri, satisfeita com a reação dele.

— Essa é uma técnica usada para enganar inimigos ou se infiltrar em lugares sem ser notada. Ela pode até parecer simples, mas é bem útil em várias situações. — Expliquei uma das inúmeras situações que poderia ocorrer de usar aquela técnica.

Ele me observava com uma expressão fascinada. Era interessante perceber que, apesar de ser mimado, Ryu parecia estar aberto ao que eu estava ensinando. Era como se, por um instante, ele tivesse esquecido sua vontade de que eu o tratasse como um príncipe e, em vez disso, estivesse realmente interessado no que eu fazia como ninja. Aproveitei o momento para introduzir um ensinamento.

— Ryu, sabe, ser ninja é muito mais do que saber fazer esses truques. Ser ninja é proteger os outros, tomar decisões difíceis e sempre agir com responsabilidade. — Eu não conseguia notar, mas eu estava me saindo melhor do que imaginava.

Ele balançou a cabeça, e notei uma centelha de entendimento em seu olhar. Para um garoto de nove anos, essa seria uma ideia nova, mas talvez fosse um passo para fazê-lo pensar de outra forma sobre sua vida e as pessoas ao seu redor.

Considerações Finais:

À medida que a tarde avançava, a chuva deu lugar a um céu limpo e estrelado, e o clima começou a ficar mais ameno. No jardim da mansão, a criança e eu ainda estávamos praticando, e eu pude perceber que ele estava mais atento agora. Ele havia parado de fazer perguntas tão imediatas e estava prestando mais atenção nas coisas que eu explicava. O menino estava absorvendo a ideia de que ser um ninja era mais do que apenas realizar truques. Eu sabia que era hora de mostrar a ele algo que realmente o impressionaria, algo que fosse mais próximo do que ele sonhava como um "grande poder" dos ninjas.

— Ryu, você queria ver algo mais impressionante, não é? — Falei, com um sorriso, sentindo um pouco da ansiedade que sempre senti ao usar o Katon: Gōkakyū no Jutsu.

— Sim! Quero ver! Vai ser incrível, eu sei! — Ele respondeu, seus olhos brilhando de expectativa.

Eu tomei um pouco de ar, respirando fundo, concentrando meu chakra e fazendo os selos necessários. Estava um pouco nervosa, pois aquele jutsu era poderoso demais para ser realizado em um lugar fechado como aquele. Mas, olhando para Ryu, percebi que ele estava realmente interessado, mais do que apenas uma criança mimada que queria se impressionar. Ele queria aprender, ele estava começando a entender o que significava ser ninja.

— Olha bem, Ryu, o que vou te mostrar agora é uma das minhas técnicas mais poderosas. Mas é importante saber que precisamos de muito cuidado ao usá-la, principalmente dentro de casa. O fogo não perdoa. — Avisei, com uma expressão mais séria, querendo passar a responsabilidade que o poder de um ninja carrega.

Fiz o último selo e, então, concentrei o chakra em meu peito. Sentindo o calor crescendo dentro de mim, a energia do fogo se formou na minha boca. A pressão foi sentida no ar, e de repente, uma grande bola de fogo se formou diante de mim, iluminando o espaço ao redor com uma luz intensa.

— Katon: Gōkakyū no Jutsu! — Gritei, soltando a bola de fogo para o céu, onde ela se dispersou em uma explosão de chamas e calor. Ryu deu um pulo de surpresa com seu rosto iluminado pela luz das chamas. Ele parecia extasiado.

— Uau… Isso foi demais! Você… Você realmente pode fazer isso? Isso é o poder de um ninja! — Ele exclamou, com um sorriso largo, parecendo mais contente do que nunca.

— Sim, mas sempre com muita responsabilidade. Esse poder pode ser útil, mas também muito perigoso se usado no lugar errado ou na hora errada. — Expliquei, me aproximando dele. Ryu parecia absorver a lição, e estava mais calmo agora, já não tão entusiasmado apenas com a ideia de poder, mas com o que ela significava.

— Eu entendi. Um ninja precisa ser responsável. Não é só sobre fazer coisas legais. Eu... vou tentar ser assim também. — Ele disse, com um sorriso um pouco mais tímido, mas sincero.

Eu sorri, satisfeita. Ele estava aprendendo e isso era o mais importante. O dia havia sido um sucesso, apesar dos meus receios iniciais.

[...]

Já era tarde quando terminei minha missão. Antes de ir embora, me despedi de Ryu com um aceno de cabeça e um sorriso.

— Cuide de si mesmo, Ryu. Lembre-se do que eu te disse. Ser ninja não é só sobre poder, é sobre como usamos esse poder para fazer o bem. —

Ele assentiu com firmeza, mais maduro do que quando começamos o dia.

Voltei para a vila, o coração mais leve. Eu sabia que, apesar de ser uma missão simples, havia deixado algo importante com ele. O garoto começava a entender que ser ninja era uma responsabilidade e não apenas um conjunto de habilidades para se exibir.

[...]

Ao chegar ao quartel-general, encontrei o senhor que me havia dado a missão. Ele estava esperando e sorriu ao me ver.

— Como foi? — Ele perguntou, com um olhar curioso.

— Foi mais difícil do que eu pensei. — Falei, me sentando à frente dele, com um sorriso cansado, mas satisfeito. — Ryu é uma criança com muita energia e um desejo imenso de ser visto como um grande ninja. No começo, ele estava mais interessado nos truques e na ideia de poder, mas... eu consegui mostrar a ele o que realmente significa ser um ninja. — Ele pareceu satisfeito com a minha resposta, acenando com a cabeça.

— Você fez mais do que apenas entreter o garoto. Ele precisará de mais tempo para entender totalmente, mas você plantou a semente. E isso é o que um verdadeiro ninja faz: ensina e compartilha. — Ele disse com um sorriso.

— Sim, e me sinto feliz por isso. Acho que foi bom para mim também, ver como o que faço tem um impacto, mesmo que pequeno. — Eu falei, refletindo sobre o que tinha aprendido também. Ensinar alguém a ser responsável, a ser parte de algo maior, foi uma experiência que eu nunca tinha imaginado.

Eu saí do quartel-general naquela noite sentindo que, de algum modo, meu próprio caminho como ninja havia se tornado mais claro. Eu não apenas protegia a vila e cumpria missões, mas também estava ajudando a moldar o futuro daqueles que ainda estavam em busca de seu próprio caminho. E isso me fez sentir mais conectada com o que significava ser de Konoha.

Considerações Finais: