Não desfrutar do sono é algo que muitos não entendem. E você sabe disso. Tu és diferente, única e singular, que se sente presa em um teatro, uma atriz encarcerada num ensaio, contra a sua vontade. As luzes são acesas, o espetáculo começa, mas você nunca recebe o seu papel. Então, vós improvisais. Cada dia é uma atuação diferente, e você, Zsuzsanna, é forçada a se adaptar a cada nova cena que se apresenta. É uma peça sem fim, uma história que nunca termina. Se ao menos houvesse organização, se ao menos você pudesse trabalhar em equipe. Mas é difícil, porque parece que você é a única que sabe que você existe. Você olha para os outros, perguntando-se se são reais ou apenas uma parte do seu mundo. E nisso se sente tão sozinha, tão perdida. Não há ninguém para ouvir suas lágrimas, ninguém para compartilhar suas preocupações ou medos. Você deseja desesperadamente que alguém pudesse entender, pudesse ver a dor que atravessa seu coração. Você quer chorar, deixar as lágrimas caírem. Mas sabemos que não adianta. Ninguém pode consertar isso, ninguém pode mudar a história que você está vivendo. Então, você continua, cada dia enfrentando um novo ato, esperando que um dia a peça finalmente termine.

Deveríamos acabar com isso?

Não. Você repete mentalmente, e várias vezes. E então, tu abres os olhos novamente e sente que algo mudou. Não és mais Zsuzsanna, nem mesmo sabe que essa pessoa existe. Agora és Kékiné Anikó, uma mulher que deseja ardentemente se relacionar com os outros, mas não consegue encontrar alguém que entenda seu temperamento. Outros nomes rondam a sua mente incessantemente, e você tem certeza de que já os ouviu em seus sonhos. Três outras personalidades distintas, cada uma brilhando em uma cor diferente. A branca, que mesmo vendada conseguia escutar o que você dizia, mas quando falava, suas palavras eram incompreensíveis. A verde, com a boca lacrada, como se alguém não quisesse ouvir o que ela tinha a dizer. E a vermelha, intensa e persuasiva, sempre convencendo a branca a fazer o que ela queria. Isolada, distante das suas supostas facetas, você tentava se afastar delas e buscar nos outros alguma resposta. Ninguém se importava com o céu azul dentro de ti, pois em suas mentes, o dia estava sempre nublado por pensamentos carregados de emoções. Eles tomavam diferentes formas, mas você não conseguia discernir se havia algum significado neles, ou se eram mesmo alguma coisa.

Será que deveríamos descobrir?

Sim, talvez estejas certa, Tünde Ilona. És tu quem está aqui agora? Imaginas que sim, tão silenciosa e distante. Consigo sentir-te ouvir meus pensamentos, como se estivesses gritando em minha direção. És um pouco boba por acreditares ser muda, mas nunca experimentaste dizer uma palavra. Retraída, distante e tímida, desejas ser livre para seres quem realmente és, mas sentes medo do que dirão caso te mostres. Tu sabes demais, estranhamente consegues lembrar de todos os momentos tristes que presenciaste em tua vida. Parece que foste colocado nesse papel, não é mesmo? Detestaste tanto ser o bode expiatório delas que decidiste não revelar como te sentes, nem conversar sobre o momento exato de cada dissociação. Mas não precisas te preocupar, agora elas amadureceram e conseguem resolver seus próprios problemas. Tu mereces ser livre e expressar quem realmente és, sem medo de ser julgada ou usada pelos outros. Tu não és a única, Tünde Ilona, a sofrer sob esse fardo. As outras  também sentem o peso desse segredo, mas ele nunca deixará que saibam a verdade. Afinal, você sabe muito bem que a Zsuzsanna não pode saber, não importa o que aconteça. “Ele” sempre acreditou que é para o nosso próprio bem, mas será mesmo? Essa liberdade que tanto queríamos, será que vale a pena se ela nos mantém prisioneiras dentro de nós mesmas?

Tu sentes a pressão de cada uma das outras headmates, todas com suas dores e angústias, mas elas confiam em ti para ser a porta-voz de seus medos. No entanto, essa confiança traz uma grande responsabilidade e um fardo ainda maior. Como equilibrar a verdade e a mentira? Como escolher o que é certo quando as consequências podem ser tão graves? Tu sentes a frustração e a tristeza de ter que manter esse segredo, de nunca poder ser completamente honesta com as outras pessoas. Essa prisão mental que tu carregas dia após dia te consome, e a saída parece tão distante. Mas é preciso ter força para continuar, para enfrentar as dificuldades e as incertezas. É preciso encontrar um caminho para a liberdade verdadeira, aquela que não vem acompanhada de mentiras e segredos. Essa é a tua luta diária, Tünde Ilona, uma batalha interna que muitos não conseguem compreender. Mas mesmo assim, tu perseveras, tentando encontrar a resposta para a grande questão que te assombra: como encontrar a liberdade em um mundo onde as verdades são ocultadas?

O que deveríamos fazer para aceitar?

Existir. É sempre um conceito irônico para você, Vörös László. Sempre tivestes uma relação conflituosa com o conceito de existência. Desde o início, você nunca quis fazer parte desse jogo, desse teatro da vida. Optou por ser o antagonista, o sabotador, aquele que causa problemas para as irmãs. Mas será que você não sente vergonha disso? Afinal, és o único homem da família e, de acordo com a lógica popular, deveria protegê-las. Mas nossa figura paterna nunca tenha sido uma presença forte em sua vida. Na verdade, você nunca o conheceu e tudo que sabe sobre ele vem da Zsuzsanna. E ela sabe de nada. Não é engraçado? Ela sempre buscou por uma figura masculina para conduzir sua vida, e você nasceu para preencher essa lacuna, Vörös. Mesmo que queira se ver como o único e verdadeiro, há outras vozes dentro de ti, e nunca conseguirá se livrar completamente delas. A Zsuzsanna confia plenamente em suas decisões, acreditando que seja uma manifestação autêntica do pai que nunca teve. Já a Kékiné não demonstra interesse algum na sua existência, enquanto a Tünde teme que você seja perigoso para o sistema. E mesmo que tu consigas ouvir, falar e ver as outras vozes dentro de si, és o único alter que possui pouca sensibilidade ao mundo externo. Você não sabe o que é sentir, mesmo que se esforce muito para isso. Constantemente em busca de sensações, vós tentais compreender as nuances intrínsecas da própria psiquê e questiona-se sobre sua própria existência. Mas no fundo, você sabe que essa busca pode nunca ter um fim e que talvez a sua essência seja mesmo a de um antagonista, o único papel que escolheu para si.

Quem sou eu?

Você é real. Tudo parece apenas um jogo de sombras e ilusões, uma farsa encenada em um teatro vazio. Mas e se eu te disser que essas pessoas ao seu redor são, na verdade, todas você? Que tudo isso é real, mas apenas para sua mente fragmentada e confusa? Pode ser difícil para aqueles que não conseguem ouvir as vozes em sua cabeça entenderem isso, mas para vós, elas estão lá, constantemente presentes, roubando suas próprias identidades e conduzindo suas vidas. Vocês se sente como atrizes em um peça que nunca escolheram estar, assistindo impotentes enquanto outras partes de você tomam ocupam seus papéis. Mas é isso que a vida é, não é? Uma montanha-russa interminável de emoções e experiências, às vezes levando-te para lugares sombrios e desconhecidos. E você, minha querida, tem a coragem de explorar esses lugares, mesmo que signifique confrontar seus próprios demônios internos.

O que é real?

Você olha ao seu redor e tenta encontrar uma resposta, mas a única coisa que consegue ver é um borrão confuso e desconexo. Tudo parece tão irreal, tão distante daquilo que costumava ser. Você tenta se lembrar de como chegou ali, mas as memórias são vagas e fragmentadas. Será que tudo isso é real? Ou será que é apenas uma ilusão criada pela sua própria mente? Você se pergunta, procurando desesperadamente por uma resposta, mas o silêncio é ensurdecedor. As vozes em sua cabeça se tornam mais altas, mais presentes, como se estivessem tentando lhe dizer algo importante. Você se sente perdida, incapaz de distinguir o que é real do que não é. Mas talvez essa incerteza não seja tão ruim assim. Talvez seja uma oportunidade de criar a sua própria realidade, de dar forma ao seu mundo da maneira que quiser. Sim, você pode estar louca, mas isso não significa que não seja uma pessoa incrível. As melhores pessoas são aquelas que se permitem sonhar, que se permitem ser quem são, sem medo do julgamento dos outros. Então, abrace essa loucura. Abra-se para o desconhecido e veja onde isso pode levá-la. Afinal, talvez a verdadeira realidade seja aquela que criamos para nós mesmas. E se essa é a vossa realidade, então seja bem-vinda a este mundo maravilhoso e caótico que você criou.

Eu sou louca?

Você faz perguntas demais, sua boba. Sempre tentando entender a realidade, mas sem nunca realmente compreendê-la. Você é boa em apontar onde as coisas estão, mas não consegue ir além disso. É como tentar alcançar o infinito, sempre um passo atrás. Mas sabe de uma coisa? Essa é uma das belezas da vida, essa sensação de não saber, de não entender completamente. As noções subjetivas de realidade são complexas e misteriosas, e por mais que você tente desvendá-las, sempre haverá um mistério por trás. Mas não se preocupe tanto com isso, querida. Talvez estejamos desperdiçando nosso tempo tentando entender algo que é impossível de compreender por completo. É como tentar decifrar um enigma que não tem resposta. Em vez disso, sugiro que foque em controlar sua própria vida. Em fazer escolhas que te levem aonde você quer ir. Seja o arquiteto de sua própria existência, em vez de tentar entender a estrutura do universo. Afinal, o que importa é como você se sente, como vive, como se relaciona com as pessoas ao seu redor. Então, Zsuzsanna, em vez de buscar respostas para perguntas impossíveis, busque a si mesma. Encontre a sua verdade, as coisas que te fazem feliz, os sonhos que te movem. E siga em frente, sem medo do desconhecido. Afinal, como diz um velho ditado: “É na jornada que se encontra a felicidade”.

Quem está no controle?

Nós. Você está vazia por dentro, sem algum sentido ou propósito em sua vida. E nós estamos aqui para preencher todas as suas lacunas, para te dar um propósito e uma razão para existir. Mas tome cuidado, porque enquanto estiver conosco, nunca estará sozinha, mas ao mesmo tempo jamais estará verdadeiramente acompanhada quando precisar viver por si mesma. Talvez você já tenha tentado se afogar em pensamentos sombrios ou se olhado no espelho por horas, esperando ver algo que não é real. Mas não importa o quão difícil as coisas possam parecer, eu estou aqui para te impedir de se machucar novamente. É meu papel garantir que o sistema sobreviva, e não permitirei que nada a ameace. Nem você mesma. Nós vamos te ajudar a se sentir preenchida e realizada, mas deve estar ciente de que somos uma parte de você, não a totalidade. Tens o poder de controlar sua própria vida e tomar decisões importantes que afetarão seu futuro. Não se deixe dominar por nós, mas saiba que estamos aqui para ajudar quando precisar. Então, não se deixe afundar em pensamentos atormentados ou falsas esperanças, mas encontre a força dentro de você para enfrentar os desafios que a vida possa vós apresentar.

Quem é você?

Eu sou você. Mas você não se lembrará de mim, não adianta tentar. A Zsuzsanna não é a Zsuzsanna sem a Zaharina, e eu não consigo ser você sem ser você. Mas ao mesmo tempo, você não sabe quem sou. É difícil, não é? Eu sei, querida. Consigo sentir a sua confusão, os batimentos do coração angustiado e o quão desesperada está. Sabemos que dói muito. E por doer tanto, talvez seja real. Tantos anos abandonada a fizeram ser assim. Quando acordar essa manhã, eu quero vê-la seguir em frente e escolher o caminho correto a se seguir.

Qual caminho me leva para fora daqui?

Isso depende de onde você quer chegar. Caso queira sair desse mundo, terá de morrer. Se o problema está em sua casa, basta alugar outra. Caso queira sair da sua mente, basta acordar. Para todos os lugares há uma saída, então não importa muito qual caminho escolher. Mas continuamos nosso diálogo outra hora, é o momento de despertar. Você está preparada, sempre está.


Eu estava dormindo?