- Lentamente fazia minha rotineira caminhada pelas ruas do Vilarejo Oculto da Pedra. Assim como todos os dias - Mantinha o trajeto de sempre. Com as mãos a frente do corpo e a expressão tímida-sorridente em meu rosto, passava a falsa impressão de gentileza por aqueles que cruzavam o caminho.  Soube que o gabinete havia convocando-me a me encontrar com alguém em um local próximo de onde eu estava no momento, e sem hesitação, desviei os passos do caminho comum para seguir através das batidas estradas de terra, alcançando algo que mais se assemelhava a um cadáver do que um dia pudera ser chamado de vila. E Nele, havia um único homem, que me repassava as informações quanto a missão. Aparentemente, havia um idoso o qual deleitava-se com a violação de corpos, tirando-lhes o descanso para tomar seus pertences. O objetivo era simples: Aprisionar o sujeito ou simplesmente eliminá-lo.

Assim como todas as outras vezes, apenas acenei a cabeça em sinal de concordância com um leve balanço para a frente, seguido de um cumprimento tradicional — "Hôa!" — Ditei, sorrindo de maneira tímida. Na sequência, arrumei as tranças que se encontravam a frente de meu peito, seguindo pela busca do maldito campo. Eu já havia ouvido falar que o tal era bastante visado por familiares, que regularmente retiravam os corpos pútridos de seus túmulos para prestar homenagens. Apesar disso, eu não via propósito nisso. Beleza após a morte? Não - Não. A beleza deveria ser na hora da morte. Eles estavam errados.

A Brisa gélida colidia com meu rosto, e os olhares eram mantidos neutros. O sorriso já não mais podia ser mais visto em meu rosto. Os braços, escondidos nos mantos do longo Haori branco faziam com que a jaqueta branca fosse jogada ao vento, balançando - Ainda que estivesse presa ao redor de meu pescoço por uma fina corrente de prata. Mas, em determinado momento, algo familiar veio à tona: O Cheiro da morte, o qual eu tanto buscava. Eu já sabia que estava por perto, mas me impressionei ao perceber que o campo da morte se encontrava tão próximo. Os incontáveis corpos jogados ao léu, abandonados ao esquecimento e apodrecendo conforme o tempo passava moldava uma paisagem fúnebre e extremamente macabra. Não pude conter o leve sorriso ao vê-la. Era lindo - Belíssimo. Por mais que o que viesse após a morte não costumasse ser tão atraente, ver amontoados de mortos  desta maneira tão bela me fazia pensar naquilo como um dos mais lindos quadros que já vi em minha vida. Inesquecível.

Contra o sol, me vi em direção a uma silhueta peculiar e curvada que se encontrava ao longe, assemelhando-se a um velho que por ali passava. Mas não era qualquer velho, não é mesmo? Talvez eu já houvesse encontrado meu alvo, mas não poderia simplesmente matá-lo. Ele compartilhava de uma visão artística tão bela quanto a minha. Um amigo? Não - Mas destruir seu fúnebre quadro seria injusto. Me aproximei lentamente, com uma das mãos cobrindo parte do rosto para que eu não fosse cegada pela intensa luz solar. O velho então levantara a voz, falando de maneira caipira e requisitando ajuda para empurrar o carrinho, após um silêncio ensurdecedor.

— "Ara Ara ~ Por que não? Você poderia me dizer o seu nome, senhor?" — Ditei com o mesmo falso sorriso de sempre, enquanto me dirigia ao carrinho, para auxiliá-lo.

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- O Velho parecia realmente ser bastante estranho. Ainda contra o sol, percebia alguns movimentos levemente suspeitos por parte do ladrão de cadáveres, levando uma das mãos até a cintura, por mais que fosse difícil identificar o que ele realmente queria fazer naquela situação. Auxiliando-o no carregamento daquele vagão com três cadáveres, me sentia verdadeiramente em casa. Era comum corpos podres se decomporem nas ruas em meu vilarejo natal. Não havia respeito algum pelos mortos, e aqueles que caíam, eram ali deixados para apodrecerem com o tempo. O Cheiro pútrido tornou-se parte de nossa rotina, e canibalismo não era algo muito incomum por lá também, fosse de carne viva ou morta.

Ainda continuava com o sorriso tímido, ouvindo o que o velho tinha a dizer na sequência. Seu nome havia sido proferido - Shitaino Aijin. Ele ainda elogiava a minha aparência por mais uma vez, mas com certeza estava a desconfiar de mim. Então, ele questionou-me sobre o meu próprio nome. Com uma leve risada, sem jogar olhares ao mesmo, respondi, calmamente: — "É Victoria." — Ditei, me apresentando formalmente ao homem. Se ele pensava que eu era uma ninja de Iwa que havia vindo cobrar as contas do passado? Talvez sim, mas era um risco que eu estava assumindo.

A Caminhada continuou pelas terras áridas e desprovidas de vida. Os pássaros negros que nos rodeavam, como se esperassem pela morte de um de nós, observavam fixamente cada movimento. Vinte minutos se passaram como se fossem cinco, e a paisagem antes maldito deu lugar a uma simples cabana no meio do nada, a qual o velho magricelo fez questão de abrir rapidamente. Mesmo com a baixa luminosidade, ainda era capaz de enxergar algumas coisas, ainda que irrelevantes. Era uma vida simples, levada por um homem que dedicava toda a sua existência por algo que amava e que compartilhávamos: Enxergar prazer na morte, ainda que em estágios diferentes da mesma. Não demorou muito para que ele retornasse, pedindo por ajuda para que eu carregasse as coisas até lá embaixo. Ainda com o sorriso tímido e semblante gentil, gargalhei levemente.

— "Ara Ara ~ Me desculpe, senhor, mas você acha mesmo que eu vou cair em uma armadilha desse nível? Não se esforce, eu sei muito bem o que você está planejando. De qualquer forma, você já deve ter percebido que eu venho de um lugar o qual você despreza. Não se preocupe, no entanto." — Dei uma leve pausa. — "Eu aprecio o seu trabalho, sabia? Por que não tomamos um chá neste tempo livre? Não há motivos para nós, que somos tão semelhantes, destruirmos as belas telas que o outro pintou por pouca motivação. A morte é um belo destino - Você também acha isso, não é? Mesmo que roube os pertences, ainda mantém os cadáveres junto consigo. É maravilhoso." — Ditei.

Então, de maneira amigável, tentaria levar aquela conversa. Eu tinha a expectativa de ser respondida da maneira que bem queria. Porém, se eu fosse incapaz de obter os resultados esperados através da fala, eu não teria opção se não usar a minha força oculta. Agora, a vida do velho estava em minhas mãos, e disso ele sabia bem.

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