Kaguya esticou uma mão na frente do rosto para fazer sombra, em uma tentativa de proteger os olhos contra o brilho fulgente do Sol que entrava pela janela. Era inverno, com temperaturas baixíssimas que poderiam facilmente beirar os 14º, e os ventos frios se esgueiravam por entre as cordilheiras que ocultavam a vila, chegando até o quarto da kunoichi.

Kaguya apoiou uma perna sobre a outra, ainda deitada, em uma pose que faria as damas da sociedade de Iwa estremecerem se vissem. Sacou da gaveta ao lado da cabeceira de sua cama uma caixinha prateada com um brasão indistinto, já muito corroído pelo tempo. Tomou um cigarro de dentro dela e, com um estalar de dedos, produziu faíscas que o acenderam. Meteu aquilo entre os lábios e tragou o sabor do fumo, antes de expelir a fumaça pela boca.

Por alguns instantes a garota se distraiu olhando para a caixinha: passou o polegar por cima das inscrições, buscando sentir a textura das letras em uma tentativa de entender o que estava escrito ali: “Chi ga subetedearu toki, subete wa chidesu”, era o que ela tinha quase certeza. “Quando sangue é tudo, tudo é sangue” – parecia ser o tipo de lema que uma grande família nobre ostentaria. Mas Kaguya não tinha uma grande família, ou uma pequena, ou família alguma. Era só Kaguya, desde que conseguia se lembrar.

Mesmo nas últimas semanas, quando a garota foi acometida por uma doença que a deixou de cama, teve que se virar sozinha na maior parte do tempo. Contou, é claro, com as visitas ocasionais de Sanji, que vez ou outra aparecia para lhe trazer comida e fazer companhia por alguns momentos, mas sempre tendo que retornar para o restaurante.

Deixou de contemplar a caixinha de prata para olhar a própria mão, que havia usado para acender o cigarro. Sua Kekkei Genkai, o Bakuton, ou, a Liberação de Explosão. Dentre várias outras coisas, ter descoberto essa habilidade era o que levava Kaguya a enxergar a si mesma como tendo sido escolhida pelo destino para ser alguém grandiosa. Uma arma ambulante, capaz de explodir alguém apenas com o toque de suas mãos.

Expelindo cinzas, a kunoichi fez força para se pôr sentada sobre a cama. Foram duas semanas, no mínimo, longe de sociedade: por mais que Kaguya estivesse feliz em não ter que lidar com outras pessoas que não fossem Kaguya, aquilo se demonstrou um atraso terrível em sua meta de se tornar chuunin o mais rápido possível. Ela amassou o restante do cigarro no cinzeiro, espreguiçando-se antes de se colocar totalmente em pé.

Caminhando até o banheiro a garota ligou a torneira, enchendo uma mão em concha para então jogar tudo na cara, em uma tentativa de espantar os vestígios de sono ainda insistentes. Com um último bocejo, entrou debaixo do chuveiro, refletindo sobre o que deveria fazer em seguida. Seu retorno ao mundo dos vivos precisava ser triunfal, sublime, magnânimo! Afinal, ela era Kaguya, aquela que se tornaria a maior Cozinheira desse mundo!

Bem, teria que pensar em algo durante o caminho. Independente do que fosse fazer, estava na hora de recuperar o tempo perdido.

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