Luma estava em pé defronte a pia, de face taciturna, terminando de secar a louça da janta, quando recebeu a mensagem. Estava sendo convocada de última hora, ao que tudo indicava. Como kunoichi, não era uma novidade, porém. Mesmo genins podiam ser chamados a qualquer horário do dia ou da noite, bastando surgir a necessidade.

A garota deixou o pano sobre a mesa, subindo até seu quarto para reunir seus equipamentos. Enquanto andava pelos corredores e subia as escadas era impossível não pensar em como aquela casa parecia enorme e esmagadoramente vazia sem Batafurai. Ainda que tenham se passado todos aqueles anos, a sombra da sensei ainda andaria pela casa, entristecendo a garota em luto.

Fechou o cinto com a bolsa ao redor da cintura e prendeu a bainha de sua katana ali. Jogou a capa por cima dos ombros, abotoando o fecho, deixando que ela se fechasse na frente de seu corpo e cobrisse todo seu tronco. Olhou mais uma vez para aquele quarto, enquanto que, com tristeza, pensava sobre como já fora absurdamente feliz ali. Então saiu, indo até o local indicado.

Após receber as instruções, a mesma dúvida da atendente se repetia na mente da genin, que também não entendia o porquê de ter sido selecionada. Deixando a modéstia de lado, a garota sabia reconhecer suas habilidades, mas não se considerava estando muito acima da média. Afinal, não havia conseguido salvar sua mestre, provando ainda ser fraca.

Ainda assim, não havia o que ser feito sobre. Uma vez tendo recebido uma missão, as regras shinobi a obrigavam a ir até o fim. Suspirando, a garota se dirigiu até o grupo indicado.

— Haku — ela disse, para ninguém em específico, apenas esperando que o detentor daquele nome respondesse. — Eu sou Luma Chounmei, estou me apresentando para a operação.

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Aquele grupo era... Grande. Luma queria ter outra definição para usar, mas naquele instante apenas era capaz de pensar nisso.
Embora preferisse atuar sozinha, não seria essa a primeira vez em que trabalharia em equipe. Fora, afinal, em uma dessas missões que sua sensei havia morrido. Sendo inevitável se recordar desse detalhe, a garota se viu obrigada a responder a todos com apenas um leve aceno de sua cabeça. A exceção foi a Nara, para quem seu olhar foi afiado, como se estivesse analisando não apenas seu corpo, mas sua alma dentro dele.

Sarutobi, Senju, Yamanaka, Nara, Lee, Uchiha e, é claro, contando com ela, Hyuuga. Esses eram os clãs que iriam compor o time. Todos esses (excluindo o seu próprio) a genin só conhecia por nome, não tendo se dedicado a estudar mais profundamente sobre – um erro que procuraria corrigir, caso voltasse viva. Assim que foram dispensados, Luma ficou sem saber o que fazer.

Ela já havia organizado seus equipamentos, e não tinha mais familiares para se despedir. A ideia de voltar para a aquela casa fazia seu estômago revirar; não, ela não precisava passar pela mesma tortura duas vezes seguidas. Olhando para os lados, ficou alguns instantes observando a garota que se deitara nos bancos. Uchiha... Tsumiki? Ela realmente tinha um problema em guardar nomes próprios. E outro grande problema, não sabia lidar com interações sociais. Suspirou.

— Você não queria estar aqui — começou dizendo. — Ou não queria fazer parte de um grupo.  

Disse aquilo baseado nas reações da garota. Se era ou não a maneira correta de se iniciar um diálogo, não tinha como saber.

— Ou apenas se considera superior a todos os outros? — Indagou, deixando a cabeça tombar levemente por cima do ombro. Apesar das perguntas incisivas, seu tom era monocórdico, como sempre — Por mim tanto faz, mas eu preferiria que pudéssemos cooperar nessa missão. Realmente, não preciso de mais peso na consciência.  

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Aquela costumava ser uma das suas melhores recordações.
Era um dos, talvez entre os últimos, pilares que mantinham sua mente sã.
O orgulho estampado nos olhos de Batafurai quando Luma se formou Genin, enquanto a sensei a presenteava com a katana que fora de sua filha, a pequena Shiso, que havia morrido em combate. Não era só um presente, não era só uma arma para a ajudar a cumprir suas missões no mundo shinobi.
Naquele momento, naquela hora, após todos os anos que passaram juntas em Konoha, a jounin a estava reconhecendo como uma filha.

Ao ser forçada a corromper aquela lembrança, Luma, internamente tendo consciência do que estava fazendo, gritava em silêncio para que aquilo terminasse. Sua mente se dividia entre a falsa sensação de estar gostando daquilo, e o desespero velado, e assim sua consciência ia aos poucos se rachando sobre ela mesma. Tal como uma casa que desmoronava, Luma podia sentir as paredes quebrando, o teto desabando sobre si, e o chão abrindo em uma fenda para o abismo da inexistência.

"Por que isso está acontecendo?", ela pensava, em desespero. "O que eu fiz de errado?"

Fora atacada por uma companheira de equipe enquanto se oferecia para ajudar. Por quê? Luma odiava tanto aquele sentimento que viu nos olhos da Uchiha, a arrogância que havia tomado conta de seu ser.

"Luma, você sabe por que nasceu com esse poder?", sua mestre a havia questionado, enquanto morria em sua frente naquela floresta. Na época não soube responder, mas agora, enquanto era forçada a desferir o que talvez fosse o milésimo golpe de espada, ela havia finalmente encontrado a resposta.

"Para proteger as outras pessoas", Batafurai lhe disse. Mas a sensei havia errado na forma como apontou esse dever. A jounin apenas morreu pois estava liderando uma equipe de crianças contra um adversário monstruosamente poderoso. Ela precisou se sacrificar pois o sistema shinobi coloca crianças para lutar em guerras de adultos. Isso é honra, eles dizem. Isso é tradição nesse mundo.
Então o mundo shinobi deve acabar.

Luma usaria, sim, sua força para proteger os mais fracos. Mas faria isso massacrando toda e qualquer pessoa que fosse um pilar desse sistema sujo.

Ouvindo os gritos de dor de sua sensei sendo ferida por ela mesma, uma lágrima pingou no chão, enquanto outras escorriam por suas bochechas. Ninjas não choram, porém. Essa foi a última das dádivas humanas a que Luma se permitiu.

— Cale a boca — diria, talvez tanto dentro da ilusão quanto no mundo real, dirigindo-se tanto para o genjutsu quanto para si mesma. — Isso jamais aconteceria.

Luma jamais ergueria sua arma contra sua mestre. Como ainda tinha consciência do que fazia, juntar os pontos e concluir que se tratava de um genjutsu não seria difícil.

Controle de chakra era uma das grandes especialidades do Clã Hyuuga, a base da qual todas as suas técnicas se originavam. Toda a rede era regida por tenketsu's, que os Hyuuga podiam acessar livremente para forçar a liberação de chakra pelo corpo. Luma, avançando esses estágios, já havia inclusive dominado os dois primeiros portões do Hachimon Tonkou, provando o seu incrível controle.

O ódio mais uma vez tomava conta de si, tal como aconteceu no dia da morte de Batafurai. Aquela vadia Uchiha, Luma a faria pagar por ter maculado suas lembranças.

— Não ouse insultar a memória da minha mãe! — Iria declarar por fim, tentando, ao máximo, forçar a inversão de sua rede de fluxo de chakra. Enquanto fazia isso, caso conseguisse, talvez fosse possível ver o ar ao redor de seu corpo tremulando, conforme o chakra era expelido por ele, transbordando de dentro de si, infundido com toda sua fúria crescente.

Caso conseguisse se libertar, Luma olharia para os lados, momentaneamente confusa, procurando onde a Uchiha havia se enfiado. Em seguida, lembrando do combinado, a garota correria em direção ao portão da vila.

Quando se aproximasse, caso conseguisse ver a garota ali com o grupo, por alguns instantes seus olhos emitiriam um brilho assassino, mas que em seguida se apagaria. Em seu lugar, surgia uma feição que era puramente o oposto da Luma de momentos atrás.

— Ohayo, Tsumiki-Senpai! — Luma diria ao pousar entre eles, passando um braço ao redor dos ombros da Uchiha e colando a lateral de seus corpos, como se já fossem grandes amigas. — Eu não sei o que aconteceu, acabei me distraindo e não vi quando você saiu.  Podemos terminar nossa conversa outra hora?

Um sorriso que era ao mesmo tempo inocente e empolgado estava estampado nos lábios da genin, cuja voz sequer havia tremido em momento algum. O olhar de canto que lançava para a senpai não era nada menos do que sugestivo. Ela então viraria o rosto para o restante da equipe, ainda sorrindo, e diria para Haku:

— Peço desculpas pelo atrasado, capitã. Eu estive pensando, esse aqui é um grupo grande, não é? E o inimigo já pode ter se dividido, para causar confusão em nosso país, ou apenas se esconder. Andando todos juntos chamaríamos muita atenção, perdendo qualquer efeito surpresa. Portanto, o que acha de nos dividirmos em duplas? Assim podemos cobrir uma área maior de busca.

Caso a equipe iniciasse seu trajeto, independente de ter seguido a sugestão dela ou não, a pequena Hyuuga ativaria seu byakugan. Com sua visão se estendo por cerca de 5,5km em todas as direções (incluindo abaixo da terra), criaria para si uma bolha de percepção absoluta. Devido a capacidade do doujutsu de reconhecer fluxos de chakra e enxergar através de técnicas de invisibilidade e camuflagem, como o Meisakure no Jutsu, esperava conseguir identificar qualquer ameaça muito antes que essa sequer tivesse a oportunidade de vê-los ou senti-los chegando. Como pegara o hábito de fazer, sua cabeça se movia aleatoriamente para os lados, de maneira a sempre buscar compensar o minusculo ponto cego.

Paralelamente, agora tendo sentido os efeitos de um genjutsu em primeira mão, a garota estaria atenta para o fluxo de chakra dos membro de sua equipe. Dedicaria alguns momentos em decorar a cor do chakra de cada um ali, para o caso de se perderem e alguém tentar se transformar em um deles, além de procurar se certificar que não estavam sendo controlados, coisa que ela seria capaz de dizer apenas reconhecendo a perturbação na rede de chakra.

Tendo, possivelmente, uma perfeita visão da Uchiha independente de onde ela estivesse, um pequeno sorriso ambíguo se formaria no canto dos lábios da kunoichi.

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