Eu estava sentado debaixo de uma árvore, lendo um livro de histórias fantásticas, quando um moleque mais jovem passa correndo, rouba meu livro e sobe em cima da árvore.
EI! Devolva!
Crônicas de um Shinobi III. É este que faltava em minha coleção.
Uma perseguição se inicia, escalo a árvore mas o moleque, como um macaco, habilmente pula para baixo.
Vc é lento. Precisa treinar mais.
           O garoto sai correndo em disparada, escala uma parede, e pula telhados até desaparecer. Fico olhando congelado, a negatividade me impede de correr atrás, eu sabia que não conseguiria alcançá-lo. “Maldito.”
Sem minha leitura, desço da árvore e me sento no chão, triste com o que havia acontecido. A voz do moleque, como um sussurro ecoa em meus ouvidos “Vc é lento. Precisa treinar mais.Vc é lento. Vc é lento”. Uma lágrima escorre em meu olho. Limpo escondendo a fraqueza, mesmo estando sozinho. “Eu preciso treinar minha velocidade…”. Repito o movimento que havia feito perseguindo o menino e escalo a árvore desajeitado. Aproximadamente levava 5 segundos para chegar no topo. “Preciso ser mais rápido”. Desço da árvore com um pulo. Me afasto 7 metros. Corro com toda minha velocidade em direção a arvore, salto e apoio o pé em seu tronco, que desliza e me derruba no chão. Me levanto rapidamente, olho ao redor se ninguem havia visto. “Se eu me excedo fico desajeitado”. Recuo novamente e repito o movimento, dessa vez cuidando para não escorregar. Desajeitado, chego ao topo em um total de 6 segundos, um pouco mais devagar que anteriormente por pegar impulso com 7 metros de distancia. Repito o processo, tentando exceder o limite anterior. “1, 2, 3, 4, 5!” Chego no topo. Subo e desço a árvore mais 20 vezes até alcançar incríveis 3 segundos. Em parte por ter “aprendido” a rota mais rápida para chegar ao topo, mas também por lentamente desenvolver uma inteligência muscular relacionada a pulo, corrida, escalada. Seu corpo estava se adaptando a explosões de velocidade a curta distância.
         Quando o sol já estava se pondo passam caminhando pelo parque o moleque que havia roubado o livro e um amigo, estavam conversando sobre a história fantástica.
EI! Onde está meu livro??!
As crianças ao ouvirem minha voz saem correndo, mas desta vez não fico parado e corro atrás. Corro 8 metros até eles, eles correm fugindo em direção a uma casa. Me movia mais agilmente, e estava quase os alcançando quando o moleque pula na calha da casa e escala para o telhado. Seu amigo, menos hábil fica para trás. Quando alcanço seu amigo, ele começa a chorar. Olho para cima e vejo que o outro moleque já havia sumido.
Não bata em mim! Buáááá
Tsc... vaza ô fedorento
Não havia alcançado o moleque que me roubou o livro, mas com certeza agora já não era menos agil do que ele. Seu amigo havia me distraído, lhe dando tempo suficiente para sumir entre os telhados.

    Misui (meu amigo e antigo sensei de Juken) havia me chamado para uma conversa e uma partida de shogi (xadrez) em sua casa. Sentamo-nos frente a frente, com o campo de batalha quadriculado nos separando. Havia o senhor feudal/dragão rei  (rei), o kage/general de prata (rainha), os anciões (bispos), os shinobis/cavaleiros (cavalo) e a torre. A frente do exército se alinhavam os camponeses/lanceiros (peões).
    Misui abre o jogo, movendo o camponês a frente do rei duas casas. Fico pensando, haviam 2 boas possibilidades: ou eu repetia seu mesmo movimento ou abria o camponês da casa ao lado em direção a casa C5, assumindo uma estratégia mais defensiva. Fico com a primeira, pois era a primeira vez que jogavamos junto e queria testá-lo.
    Misui: - Seu pai e eu nos encontrávamos todas as terças para jogar uma partida...
    Misui comenta e abre seu primeiro ancião em uma longa diagonal que para na casa C4.
    Misui: - Há muito o que aprender com o shogi.
    Aquele ancião avançado me incomodava. Podia ser uma armadilha, era preciso me proteger. Movo meu cavalo para defender o camponês avançado.

    Este jogo representa uma guerra. O mais óbvio é pensarmos de forma macro, imaginarmos grandes confrontos de exércitos gloriosos, afinal as peças nos orientam a pensar desta forma. O que poucos percebem é que apesar de representar uma batalha, este jogo é sobre pura estratégia.
Misui filosofa sobre o jogo enquanto move sua kage para uma posição arriscada, ameaçadora.

    Estratégia é algo para se pensar grandes batalhas, mas também pequenos combates, corpo a corpo. O conceito se estende a combates políticos, simbólicos. Não seria errado enxergar as peças brancas como a família Soke e as pretas a Bunke.
Sua voz ecoa em meus pensamentos, mas minha concentração estava completamente focada naquele kage fora de posição. “♕...”
As vezes achamos que estamos jogando, quando na verdade estamos sendo jogados. É isso que eu quero que você entenda.
Sua voz me deixava confuso. Precisava repelir este kage de qualquer forma, ela era o perigo. Avanço o cavalo de forma que ele se posicionava ameaçando o kage inimigo. “Ele irá recuar!”.

    Misui: - Xeque-mate.
    - Esse é o mate do ancião. Misui fala isso movendo seu kage para a posição fatal.
    - O importante desta estratégia é a iniciativa e a velocidade. É um ataque fulminante, tudo ou nada. Mesmo sendo a peça mais forte do jogo, ao abrir seu kage você se vulnerabiliza. Isso acontece quando é necessário proteger algo ou alguém muito valioso em campo de batalha. O kage, geralmente, deve ser poupado para o fim do jogo e por isso não pode assumir quaisquer riscos. A estratégia do ancião reverte esse princípio e, por isso, é fatal e frágil simultaneamente. O único elemento que pode compensar este tipo de fragilidade é a surpresa.
    Misui sorri enquanto guarda o jogo.
    - Isto é uma metáfora. Pense em tudo que aconteceu aqui traduzido para sua realidade.