De certa forma o dia começava bem animado naquele dia. Pouco a pouco, eu ia me preparando para me afastar de casa, ou melhor, eu já havia me preparado, mas me faltava coragem de enfrentar o mundo sozinha, de fato, sem a ajuda de alguém como Raika. Eu acordei cedo naquela manhã, mas estranhamente eu estava animada por sair mais uma vez de casa para uma missão. Eu ficaria o dia todo fora e isso valeria muito a pena, uma vez que eu não teria que ficar deitada na cama em meu quarto pensando nas inúmeras possibilidades de chances da minha futura conversa com a mulher ser completamente um saco.  Me levantei, fui até a cozinha, não havia café pronto, como várias vezes encontrei, feitos por Raika, mas tudo estava tão calmo e parado, como se congelado no tempo há alguns dias, pois eu não a via já tinha um tempo. Nossos horários se desencontraram frequentemente e eu já sabia em meu íntimo que isso não era apenas uma coincidência qualquer. Preparei um pouco de arroz, peixe frito e um pouco de chá para acompanhar. Me alimentei em completo silêncio, enquanto os pássaros, por sua vez, cantavam na janela de casa, como se celebrassem mais um dia de vida. No momento seguinte, lavei a louça e terminei de arrumar a mesa e o fogão, deixando tudo em perfeita ordem como se nada tivesse acontecido antes, pronto para mais um uso. Meus pés tocavam o chão frio desprovidos de qualquer calçado, me dando pouco a pouco a sensação de frio que subia por todo meu corpo. Antes de sair para a missão, precisava me aprontar, portanto fui ao banheiro, me despi completamente e tranquei a porta. Com muito cuidado, ajustei o chuveiro para que a temperatura saísse de forma agradável, nem muito quente ao ponto de me causar ardência e desconforto, frio para que me congelasse naquela manhã. Ao me certificar que estava tudo pronto, comecei meu banho enquanto refletia sobre a vida. — “Logo estarei fazendo essa rotina sozinha, de fato. Eu acho que não vou me acostumar com a solidão.” — Refleti, passando as mãos ensaboadas em meu corpo, gentilmente. Terminei lavando meu rosto e torcendo gentilmente meus cabelos arroxeados, para expelir o máximo de água possível. Fui ao quarto e me vesti como de costume e sequei meus cabelos, preparando minha longa trança habitual.

Sai de casa em seguida, rumo ao portão de Konoha, pois sabia que provavelmente seria a primeira a chegar no local marcado como início daquela missão de escolta de três pesquisadores renomados da vila da folha. Passado algum tempo de caminhada reflexiva, cheguei ao local esperado, sem dificuldades e para minha surpresa, de fato não havia ninguém. Escorei no portão, vendo que outros ninjas saíam para missões fora da vila, seguindo suas vidas enquanto eu permanecia no aguardo dos meus protegidos. Quando finalmente, os três vieram, juntos, carregando em suas costas mochilas com seus itens para realizar coletas e amostragens.

— Bom dia, Terumi! Que jovem Kunoichi linda, sua beleza de fato ganha fama a cada dia. Sou o Makoto. — Concluiu, Makoto. O mais jovem entre eles, tinha por volta dos 22 anos. Era alto, bonito e tinha olhos azuis. Seu comentário quanto a minha beleza de fato me causou um desconforto natural, já que a timidez não me deixava esconder que comentários como aquele, me faziam ficar desconfortável. De qualquer forma, aguardei os demais se apresentarem.

— Cale a boca, Makoto. A Jovem ficou claramente desnorteada com este comentário! Bom dia, Terumi-san, me chamo Tanaka. — O homem era o mais velho dali, seus cabelos brancos eram o diferencial. Carregava no rosto uma aparência experiente e um olhar severo, principalmente com seu parceiro, mais novo.

— Bom dia, eu sou Ranma. —  O terceiro apenas acenou a cabeça e disse seu nome. Era o mais tímido entre eles, mas com certeza, muito menos do que eu.

— Bom dia a todos. Para quem não me conhece, sou Terumi. Serei a guia de vocês, por favor me sigam e ficaremos bem. — Tentei transparecer uma confiança genuína.

Desde minha última missão de escolta de um homem medroso, agora eu tinha um pouco mais de experiência quanto a lidar com a timidez e ser mais clara em minhas ordens. De qualquer forma, todos balançaram a cabeça, concordando com meu jeito sucinto de coordenar a todos. Meus pés começaram a marchar, levando comigo, por conseguinte, os demais que me seguiram conversando entre eles. A missão era de fato simples e todos aparentavam estar mais preocupados em fazer suas pesquisas do que sair correndo floresta adentro como loucos assustados. Estava tudo bem até ali e eu gostaria, profundamente, que continuasse até o final.

Considerações Finais:

Não demoraria para que nossa caminhada começasse a nos afastar do vilarejo da folha, afinal todos ali, exceto eu, carregavam uma chama de entusiasmo crescente em seus corações. Eu estava respirando profundamente, andando pouco a frente dos três homens. Minha estatura destoava das demais, visto que eu era baixa o suficiente para bater no ombro de Ranma, que entre eles, era o mais baixo. Eles conversavam e caminhavam no mesmo ritmo, enquanto eu me mantinha alerta aos sinais da natureza, imaginando se iríamos ter complicações climáticas. Aparentemente, naquela manhã não iria chover e eu poderia descansar aliviada quanto a necessidade de alguém sair correndo e escorregar em algum barranco enquanto fugia desesperado das sombras das árvores. — “Graças a Deus, esses caras parecem ser mais responsáveis do que meu último cliente. Eu estava com trauma de ricos egocêntricos e suas manias.” — Pensei comigo mesma, a sombra de uma árvore na qual escorei com a mão para poder olhar para trás e me certificar que estavam bem, logo atrás de mim.

— Todos vocês, atenção em meus passos, vamos sair da estrada agora, não podemos nos separar. — Os orientei quando finalmente chegassem ao meu lado.

— Senhorita, Terumi. Com licença, poderíamos ir há algum riacho? Gostaria de coletar amostras de água e… — Disse Ranma, porém fora interrompido abruptamente.  

— Fala sério, cara. Para de querer se exibir, fala que você quer água porque seu cantil ficou vazio. — Advertiu, Makoto, rindo-se.

O mais velho entre eles, Tanaka, pôs a destra sobre o rosto e começou a balançar a cabeça negativamente em sinal de clara insatisfação, mas não disse nada. Eu por minha vez, apenas acenei com a cabeça, positivamente a necessidade de Ranma. Com a minha mão esquerda, orientei aos três que me seguissem, pois eu conhecia um riacho de águas potáveis e frescas naquela região. Por fim, seguimos dali, com os três falantes contemplando as próprias conquistas e eu atenta, me encolhendo em meus pensamentos íntimos enquanto estava atenta ao redor. Quando chegamos ao riacho, esperei que todos saciassem suas necessidades, inclusive, dando espaço a todos que quisessem atender o chamado da natureza. Eu fiquei em completo silêncio e quando os homens retornaram, voltei a me dirigir a eles, como uma comandante focada.

— Agora que estão saciados. O local é próximo daqui, tenho certeza que estão ansiosos para chegar, mas não se afastem, por favor. Eu não quero topar de frente com nenhuma surpresa desagradável. — Suspirei, lembrando que naquela área havia animais selvagens.

Todos balançaram a cabeça e pareciam de acordo com minha ordem. Embora eu ainda fosse jovem, minha influência sobre as pessoas começava a aflorar, como se todos pouco a pouco me olhassem como alguém responsável, afinal de contas.

[...]

Depois de mais algumas horas de caminhada, finalmente chegamos ao ponto onde os batedores haviam relatado em suas rondas à vila. Os três, entusiasmados, partiram cada um para um pequeno sítio aberto, preparando cada um sua pequena bancada improvisada com seus kits de pesquisa. Ranma era o especialista botânico, este preparava uma bancada sobre uma larga pedra que parecia ser perfeitamente esculpida para aquela função. Ele jogou seus apetrechos sobre ela, além da mochila entreaberta e se dirigiu à mim.

— Preciso colher amostras de plantas. Pode me ajudar? Não quero me afastar deste local, sinto que tem plantas que nunca vi aqui antes. — Seus olhos me fitaram de canto, com um movimento sutil, como se não quisesse perder o seu verdadeiro foco, que era a flora daquele local.

Balancei a cabeça novamente, afirmando que o faria e que ele poderia ficar à vontade. Os outros dois homens pareciam mais focados em montar seu acampamento metodicamente, mais lentos. Nisso Tanaka e Mikoto tinham em comum, um certo ritual ou tradição, seja lá o que fosse.  De qualquer modo, parti dali, mantendo-os em meu campo de visão os três homens. Felizmente não precisei andar muito para que o homem interessado em plantas apontasse para que eu colhesse alguma coisa. Ele me apontava e eu colhia, simples assim, com um puxão com minha mão direita, fui apanhando as amostras. Seu olhar era de reprovação, pois eu claramente não tinha uma afinidade natural para botânica, haja vista minha forma meio bruta de tratar as plantas, mas isso não era por mal. Depois de recolher um número satisfatório de folhas, raízes e flores, o homem havia me sinalizado com um assobio agudo para que eu retornasse com elas. Eu as trouxe, colocando sobre a pedra. Dali em diante, o processo de extração das informações das amostras não era mais comigo, portanto dei o espaço necessário para que ele trabalhasse. Outro que parecia pronto para começar, após metódica organização de seus itens de pesquisa, era Tanaka, este escolheu um tronco de árvore caído para usar de bancada.

Considerações Finais:

Não demorou muito para que o senhor viesse até mim, com a mesma premissa de precisar de ajuda para que eu coletasse as coisas para sua pesquisa.

— Você poderia me ajudar a pegar para mim qualquer coisa de origem animal que encontrar por aí? — Ele foi direto, sequer um por favor, mas isso não foi por mal. Tanaka era o mais velho dali, às vezes ele mesmo se esquecia que o respeito deveria partir dele também, embora adorasse corrigir Makoto por falta de respeito.

Eu suspirei, como se estivesse entediada, mas não haveria jeito. Para ganhar tempo e não ter que passar o dia todo olhando para plantas e restos animais, eu tive de agir para ajudar, fora que embora eu tivesse ajudado Ranma, isso não significava que estaríamos fora dali antes do fim da manhã. Portanto, concordei com a cabeça que o faria. Meus olhos ficaram atentos a qualquer coisa que pude encontrar no chão, como pegadas ou rastros de qualquer matéria orgânica que poderiam desprender de um animal. Por azar o meu, acabei encontrando rastros de fezes de animais, recentemente deixadas ali, em quantidade suficiente para que fosse uma significativa prova da existência de algum animal de grande porte ali. Olhei para o senhor e ele me olhou de volta, sorrindo. Eu estava desconfortável, pois ele parecia animado com a descoberta, como se quisesse que eu coletasse aquela merda toda com as mãos e levasse até ele. Eu achei que apenas parecia, mas ele sacou da mochila um pote transparente e uma pequena colher de pedreiro, insinuando que eu deveria pegar aqueles itens para coletar o que ele queria. Empinei meu nariz, naturalmente eu não iria pôr a mão naquilo e, comecei a caminhar, dando a entender que se ele quisesse aquele monte de merda, ele mesmo o pegasse com as próprias mãos. — “Porque todo cara inteligente é egocêntrico e acha que todos tem que servi-lo?” — Refleti, caminhando para me afastar. Eu andei o suficiente para me afastar dos três, mas não os perdi de vista. Quando dei por mim, estava em um local que tinha uma série de árvores lascadas, como se fossem usadas para algum animal grande se coçar. Pude concluir isso, pois ao olhar para o tronco da mesma, havia uma quantidade absurda de pêlos fincados nela, presos após a fricção contra algum animal. Peguei os pêlos com cuidado, pelo menos desta vez eu não tive nojo, levei para Tanaka que já havia pego a merda, mas que deu um salto de alegria ao pegar uma prova mais “palpável” para que pudesse trabalhar. Dois já foram, faltava apenas o mais jovem que, por algum motivo, eu não conseguia enxergar naquele momento.

— Ei, gatinha? Me dá uma mão aqui. — Gritou, chamando minha atenção para o alto de uma pedra repleta de musgo pegajoso. — Daqui de cima consigo ver várias pedras legais, preciso que me ajude a coletá-las. — Ele concluiu.

— Ajudo, se prometer não me chamar assim de novo e se descer daí. — Eu disse, corada, tanto pela vergonha que ele me causou, tanto pela raiva que senti pelo comentário.

O homem riu-se feito um garoto. E eu me estressei mais ainda, porém ele concordou com um sinal positivo feito com a mão direita. Conforme ele me orientava, eu usava um pequeno martelo e talhadeira para quebrar partes menores de pedras que ele julgava como necessárias para sua pesquisa. Aquela região era rica de informações e não demoraria muito para que eu tivesse pelo menos uns 2 kg de lascas de pedras numa bolsa que ele me forneceu emprestada. Eu não entendia o que ele queria com aquilo, mas portanto que ele se comprometesse em não me chamar por aquele apelido deselegante e todos ficassem em segurança, eu concordaria em ajudar no que fosse necessário. De volta até ele, entreguei suas amostras. Ele havia escolhido o chão mesmo como bancada, pois tamanha era seu descompromisso com esses detalhes mais técnicos. Me sentei à beira de uma árvore, havia ajudado a todos a coletarem seus preciosos recursos e agora dependeria deles o trabalho.

[...]

Algumas horas depois, eu já havia descansado o suficiente do trabalho que tive anteriormente e todos já pareciam satisfeitos com suas pesquisas e amostras realizadas. Dei o sinal a todos, para que se reunissem comigo. Os homens pegaram suas mochilas carregadas de recursos e demais pertences. Eu, silenciosamente, balancei a cabeça em direção a eles, deixando meus cabelos balançarem com o movimento. Eles captaram a mensagem e então começamos a voltar para Konoha, sem mais delongas. No caminho de volta não tivemos nenhum imprevisto. A teoria de que quando se vai a um lugar pela primeira vez parece mais distante do que quando se volta dele, pois não demorou muito para que nós retornássemos ao centro da vila. Me despedi deles rapidamente e fui até o quartel-general, para relatar a missão. Não seria a única missão daquele dia, pois eu sabia que estava apenas começando.

Considerações Finais: