Não há mesmo nada que possa ser feito? Você é um especialista, vai me dizer que isso não pode ser resolvido com facilidade? — A senhora resmungava para o homem, que com suor frio escorrendo da testa a encarava com tristeza e um sentimento de impotência. — Eu… sinto muito.


Meus doze anos poderiam ter sido marcados por um sentimento de realização de sucesso, não fosse o caloroso incidente na residência Abusaki. É dito que até hoje pode-se ouvir o crepitar da madeira incandescente ou os gemidos de dor dos fantasmas que carregam suas pesadas correntes pelas escadas. A incerteza do que os próximos anos reservavam aos descendentes do clã Uzumaki parecia assombrar os membros ainda vivos daquela singela família de criadores de insetos da seda. Era de se esperar o medo e o caos após um incidente de tamanha proporção, mas o espírito fraco de alguns foi martelado após a provação de um embate, tornando-se mais rígido que metal e mais afiado do que qualquer arma.

Os dias antes agitados com treinamentos desgastantes se tornaram dias tediosos e amargurados, pois apesar dos olhos não funcionarem mais como devido, ainda poderia sentir a reprovação e desdém daqueles que me cercaram durante anos com cobrança e expectativas. Sentia apenas dor, meus olhos queimavam diariamente, como um lembrete do que havia perdido naquele dia, sentindo culpa como se eu mesma houvesse feito tudo sozinha, apesar disso dificilmente ser verdade.

Chisato, minha avó materna, realizou por mais de vezes, visitas à clínicas ou herbários, na esperança de adquirir uma cura para minha condição — não por amor, mas por dever de continuar meu desenvolvimento. Todos os métodos de tratamento não pareciam ter efeito, se não fosse o caso de trazer algum tipo de efeito adverso ou negativo. Durante meses, quase um ano já havia se passado, mas com o corpo desgastado e inutilizado, procurei acalmar a mente através da meditação, controlando a respiração e buscando o desenvolvimento de meu espírito. As energias internas se tornavam cada dia mais perceptíveis, como se meus sentidos se ampliassem gradativamente para enxergar mais o interior, embora o externo se fechasse cada vez mais.

Com a busca contínua por métodos alternativos, uma solução adversa foi apresentada para a anciã, sendo esta uma possível condenação, junto ao castigo perfeito para a criança quebrada. As doces palavras de um estranho enganaram tão bem à ela que um experimento incompleto lhe pareceu atrativo, quase perfeito até, embora as chances de uma morte rápida e dolorosa fossem altas. Uma solução para o problema viria, no fim, de uma forma ou outra, não é mesmo?

Sem outra alternativa de treinamento se não o refinamento de controle do chakra e da vitalidade, passei diversos dias em foco total, canalizando as energias que constituem meu ser, aprimorando minha capacidade sensitiva para uma melhor utilização. Cada segundo era constituído de ínfimos outros, como se o tempo parecesse não passar naquela sala silenciosa. Não um tique de relógio ou som das folhas que balançavam ao lado de fora daquela mansão, sequer o sibilar característico da serpente albina à meu lado, mas a distração parecia ser muitas vezes o próprio bater de meu coração, que se acelerava ao pensar na possibilidade de nunca voltar a enxergar. O sentimento negativo dificultava o treinamento, já que atrapalhava meu foco e motivação, trazendo pensamentos e dúvidas, como o questionamento se tudo isso não seria em vão no fim. Para que me esforçar tanto se meu corpo já não servia mais de nada? Havia sentido em continuar tentando? Por que não simplesmente desistir?

O tortuoso silêncio em questionamento me consumiu rapidamente, turvando a percepção para a aproximação de Chisato, a anciã da família, que abriu a porta e disse poucas palavras — Esta é minha neta, espero que possa curá-la. — E então, sem qualquer aviso, fechou o fusuma que enclausurava-me ao silêncio e à solidão, me deixando ali, só com meus demônios outra vez.


Mentiria se dissesse que não sabia dos riscos, já que minha vó fez questão de me apresentar todas as possibilidades antes de qualquer coisa. Uma vida plena em meio à deficiência e incapacidade ou uma rápida e dolorosa morte, era uma escolha relativamente fácil no fim das contas, embora fosse um pouco cruel me fazer tomá-la. Meu poço de dor se camuflou mais uma vez como um belo sorriso, escolhendo participar da experiência, crendo que seria a melhor alternativa, já que esperar pacientemente não me traria milagre algum, apenas mais dor.

Passei alguns bons dias em estado de êxtase, como se não importasse o resultado final, estaria livre de um sofrimento ou outro, uma situação de ganho inegável. Talvez não fosse felicidade no fim das contas, mas apenas um alívio imenso por sentir que um peso sairía de meus ombros, de uma forma ou outra. Seja a morte, seja a cura, algo mudaria em minha vida para sempre, então era razão para comemorar, independente do resultado.

Por dias, as preparações para o processo tiveram início, sendo uma delas a produção de chás diferentes, questionáveis até, com aromas diferentes do que já estava tão acostumada. Alguns doces como frutas vermelhas, que já estava tão acostumada a beber, outros intragáveis como se me fizessem beber lama. Não era incomum que recolhessem amostras de sangue ou me cutucassem a pele afim de entender mais a respeito de minha resistência, mas no fim de tudo, talvez o método não fosse tão “científico” quanto imaginei, já que ao final de um mês de provações, fui chamada para uma sala fria, onde tudo teria início.

Descalça e com poucas vestes, caminhei pelo cômodo gélido com medo, me sentando no que parecia ser o centro de algo grandioso. Sentia uma leve sensação de calor, como se houvessem velas ao meu redor, além de poder ouví-los rabiscando algo no chão de pedra, círculos e círculos, espirais intermináveis que levavam diretamente até mim. Me perguntei nesse momento se havia um limite para a alma, para o que um ser humano é capaz de aguentar numa jornada como essa, uma jornada de dor. Minha esperança é a de que houvesse luz no fim do caminho, pois era para lá que rumava sem espera.

Ouvi o homem a qual minha avó havia me mostrado, falar algumas palavras, numa tentativa de me tranquilizar em uma situação tão adversa, apesar de ser impossível não estar nervoso em um momento como esse. Seus movimentos de mãos produziam sons característicos que já estava acostumada a ouvir no período de academia. Os selos eram rápidos, sendo também muitos, mas quase impossíveis de se ouvir. Me lembro de haver um aviso, mas o que veio depois nubla minha memória até hoje, como se o cérebro buscasse esquecer o grande sofrimento passado nesse momento.

Pequenos flashes restaram desse momento, após o toque que ativo a técnica de selamento, a dor em todo meu corpo adormeceu o corpo quase de imediato, apagando os sentidos e me tornando nada mais do que uma boneca sem vida por horas e mais horas. Minha consciência se esvaiu, sem qualquer sentido restante, caí ao chão frio e ali fiquei, até onde posso recordar.

Dias se passaram, mas além de enjoo, ondas de extremo calor e uma sensação de vertigem recorrente, nada pareceu mudar. Era difícil saber se estava aguentando os efeitos adversos com força de vontade ou se apenas era inabalada por eles, mas era óbvio para mim que sobreviveria, mesmo sem minha visão restaurada, continuaria vivendo para encontrar outras formas de recuperá-la.


O homem limpa sua testa e se aproxima de Chisato, que esperava sentada à mesa em um pequeno zabuton de cor bege, tomando um chá que exalava uma grande quantia de vapor. Ele se senta ao lado oposto da mesa, tomando para si um copo também, atirando o líquido quente garganta adentro, afugentando o frio agressivo do inverno. A mulher o pergunta se o experimento ocorreu conforme o planejado, curiosa se poderia retornar o treinamento de sua querida neta ou se deveria começar o planejamento de seu funeral. O homem a encara com calma inabalável, embora estivesse nervoso e inquieto. — Parece que sua linhagem foi capaz de desacelerar os efeitos do selamento. Estou incerto se ele possuirá algum efeito sequer, mas apenas o tempo dirá.

Ela o encara, franzindo o cenho em genuína curiosidade. Parecia sentir uma quantia razoável de admiração por sua neta. — Era de se esperar, ela sempre foi forte. Mas quanto tempo será necessário para vermos os resultados? — Sua indagação foi justificada, mas o homem apenas se silenciou, sem qualquer resposta.