Ethan

Dentre todos os participantes do torneio ilegal que ocorreria no coliseu, havia um rosto inconfundível, um nome que já tinha o poder de alcançar os quatro cantos do país da terra. Mas, naquele momento, não passava de mais um homem disposto a colocar a vida em risco em troca daquilo que lhe traria prazer, assim como todos os outros. Alguns possuíam dívidas demasiadamente altas e viam uma salvação no torneio, um meio para enriquecerem com esquemas elaborados de apostas. Outros apenas almejavam se provarem como lutadores hábeis, procurando alguma emoção para preencher suas vidas, assim como era o caso do Ronin. Queria provar para si que poderia enfrentar de igual para igual os lutadores marciais mais habilidosos de Iwagakure.

Os competidores foram conduzidos por um corredor estreito abobadado, com paredes ásperas e irregulares. Da mesma forma que era esperado de uma invasão, todos apresentavam passos silenciosos e apressados, uma vez que sabiam o tão pouco tempo que possuíam. Posteriormente, após todos se alojarem no centro da arena, refletores improvisados se acenderam e focaram nos rostos da maioria. Em volta, os espectadores também tomavam lugares afastados na arquibancada. As pessoas dispostas a assistir ao espetáculo, em sua grande maioria, tratavam-se de apostadores. Afinal, todo pé-sujo e família criminosa da vila via no evento a oportunidade de multiplicar seus ganhos. No entanto, diferente do habitual, uma comoção atípica se instaurou no momento em que um dos refletores focou no rosto de um dos participantes. Ethan, um dos ninjas mais promissores da nova geração, estava entre os lutadores. O garoto cobria o rosto com a destra, tentando se acostumar com a luminosidade.

— Senhora e senhores, temos algo inédito aqui! — o apresentador do evento forçou a garganta para se fazer audível. — Temos um ninja de Iwagakure conosco. Mas não se enganem, ele não é um ninguém. Apenas a menção de seu nome já é o bastante para fazer com que homens fujam amedrontados. Para muitos, é tido como o Kage que nunca foi, aquele que deveria ter sido eleito como a terceira sombra da terra. Ethan, o Ronin!!! — com a revelação, apostas começaram a ser refeitas, enquanto alguns simplesmente fugiam apavorados do coliseu.

Diferente dos espectadores, os competidores encheram-se de ânimo ao descobrirem que poderiam ter a chance de enfrentar alguém como ele. Em seus delírios de grandezas, imaginavam a repercussão que a batalha teria se conseguissem derrotar o garoto. Por isso, todos aqueles sujeitos mal-encarados se viraram e começaram a encará-lo. Sem que uma palavra sequer precisasse ser proferida, as regras da competição mudaram. A partir daquele momento, todos tinham apenas um inimigo, o garoto com o manto bege que esvoaçava com a brisa fria da madrugada. Não poderia haver prêmio maior.

Minutos depois, quando o sinal sonoro foi dado, o início da competição foi decretado, com alguns homens partindo com os punhos levantados e a toda velocidade. Ethan, por outro lado, manteve a calma ao sentir que todos o tinham como alvo. Respirou fundo e pensou uma última vez no samurai que precisava matar, entendendo que precisava superar aquela barreira para continuar trilhando o caminho da vingança. Em vez de sacar a espada, tudo o que fez foi utilizar a visão acentuada para estudar os arredores, mapeando a posição dos opositores e tentando descobrir suas intenções pela forma como se moviam. Estava atento à cadência com que seus pés se moviam, à inclinação dos joelhos, à forma brusca com que os braços eram flexionados. Os olhos e a cabeça não pararam de se mover por um segundo sequer, enquanto inclinava o corpo e se movimentava para os lados. Desviava de cada investida como uma folha dançando ao vento.

Alguns não demoraram muito para entender o abismo que existia entre ambos, percebendo que, não importava o quanto se esforçassem, não passavam de crianças para o Ronin, visto que o mesmo nem os considerava merecedores da sua espada. Mas, apesar da postura passiva, Ethan sabia que não poderia ganhar apenas se defendendo. Portanto, após avaliar a habilidade da maioria dos participantes, resolveu testar sua própria força, liberando uma técnica que ainda não havia aperfeiçoado. Desde o dia em que foi abandonado pelo seu antigo mestre, Ethan se afundou ainda mais, dedicando cada segundo de seus dias para aperfeiçoar as habilidades de esgrima, e era o que pretendia demonstrar quando finalmente sacou as espadas.

Abriu os braços e deixou o chakra e a sua vontade banhar as lâminas, resultando no surgimento de chamas de chakra e faíscas negras, que emergiram e rastejaram a partir do inferno que Ethan mesmo criara para si. Inevitavelmente, a liberação súbita de poder devastou os arredores. Enquanto os espectadores arregalavam os olhos na arquibancada, grande parte dos competidores caiu de joelhos ao terem suas vontades sobrepujadas. Os que permaneceram de pé suavam frio, como se pudessem ver o que estava para acontecer, mas mesmo assim não demoraram mais do que alguns instantes para avançarem em uma investida desesperada. Aquele demônio precisava ser eliminado, pensavam. Então, todos partiram ao mesmo tempo.


— Nitōryū! — disse para si em um sussurro discreto. Porém, naquele momento, as chamas enfraqueceram e as faíscas perderam sua expressão, ao passo que Ethan sentia pontadas de dor que o impediam de concentrar o chakra em sua plenitude. Entretanto, lembrou-se do porquê lutava. Ele lembrou de cada promessa feita, da sensação de se sentir a pior pessoa do mundo. Mais do que qualquer um, entendia que não poderiam existir fraquezas e imperfeições enquanto caminhava lado a lado com a morte. “Viver pela espada, morrer pela espada”, o pensamento surgiu como um mantra, dando forças para que voltasse a dar vida e expressão às chamas que se moviam livres nas espadas.

Por fim, em resposta aos avanços desesperados, Ethan cruzou os braços, mantendo ambas as espadas apontadas para cima. Então, tencionando os músculos dos braços e pernas, impulsionou-se em direção aos adversários. Durante a investida, começaria a girar ao redor do próprio eixo, realizando uma única linha de corte que tinha a intenção de combinar a força de ambas as espadas para cortar aqueles em seu caminho. A agilidade e força empregada no movimento fizeram com que as lâminas reluzentes fossem banhadas em vermelho. Era o mesmo vermelho que cobriu o chão da arena como se fosse lama, em um som característico. Respingos desse mesmo tom rubro mancharam as roupas e o rosto.

Logo que as espadas retornaram à bainha, em um movimento sútil, não havia mais motivos que prendiam Ethan ali. Desse modo, deu as costas para a exibição de brutalidade e selvageria, onde ainda era possível ouvir os gritos de agonia e as súplicas de morte.