A Vila da Areia vivia dias de rotina, imersa em uma calmaria enganosa. As ruas eram estreitas e empoeiradas, onde o sol parecia brilhar sem piedade, refletindo no solo granulado e nas paredes desbotadas das casas. Crianças corriam, desenhando mapas imaginários na areia, enquanto os mais velhos, sentados em bancos de madeira, trocavam histórias de um passado que parecia eternamente distante. Os mercados, com suas barracas de lona desgastada, exibiam uma modesta variedade de frutas secas, peixes salgados e tecidos coloridos que balançavam suavemente ao vento. Era uma visão de serenidade em meio ao caos, onde cada suspiro parecia sincronizado com o bater das asas das pombas que se aventuravam pelos telhados. No entanto, essa tranquilidade aparente escondia um mundo de segredos e sombras, onde as missões mais obscuras eram tramadas em silêncio. Maeda era a personificação dessa dualidade. Estava no alto de um pico, erguido como um guardião sobre a vila, observando cada detalhe com olhos treinados. Vestia o uniforme padrão de sua ordem: roupas negras justas que lhe permitiam liberdade de movimento, um colete cinza, proteções nos braços e luvas firmes. As sandálias ninja, com seus picos, facilitavam a travessia pelas regiões montanhosas. Um solitária bolsa de armas pendia de sua cintura, pronta para ser usadas. No ombro esquerdo, a espiral tatuada marcava sua identidade secreta. Seu rosto estava oculto por uma máscara de oni, expressão de terror e mistério. Por cima de tudo, um manto branco com capuz, que cobria até seus cabelos, conferindo-lhe um ar espectral e intocável.

Foi então que o som familiar de um corvo rasgou o silêncio — Crááá — nisso ergueu a cabeça e avistou o pássaro negro contra o céu azul. O corvo desceu em um voo gracioso, pousando no braço direito estendido de Maeda, que lhe serviu de poleiro com naturalidade. À pata do corvo estava preso  um pequeno cilindro. Já ciente do que se tratava e com movimentos precisos, soltou o cilindro e desenrolou a mensagem. O pedaço de pergaminho desgastado revelava um único nome e um local, sem outras explicações.

Laboratório, Zona Leste
Hōki Shabriri

Era uma missão típica da Anbu - anonimato e segredo eram a norma. O Empalador não estranhou a falta de detalhes. Sabia que sua tarefa começaria pelo local mencionado. Ali, encontraria pistas que o conduziriam até sua presa final. Ele olhou uma última vez para a vila abaixo, antes de desaparecer nas sombras, movendo-se como um espectro, quase que invisível, mas definitivamente letal.

O Senju movia-se saltando silenciosamente de telhado em telhado pelas construções do centro da Aldeia da Areia. Suas pernas dobrando-se como molas e estendendo-se com força controlada, permitindo-lhe atravessar os espaços com graça felina. Seus pés pousavam suavemente nos telhados de argila, mal provocando um ruído ao aterrissar. O destino era a zona leste, onde rumores indicavam a existência de um laboratório de pesquisa. Conhecia bem cada esquina e cada sombra daquela aldeia, mas a localização exata do laboratório permanecia um mistério. Ao se aproximar da área, uma imponente construção destacou-se no horizonte, contrastando com a arquitetura modesta dos arredores. Ele parou por um momento no beiral de um telhado, suas narinas captando o leve cheiro de produtos químicos misturados com a areia quente da aldeia.

— Isso é novidade — murmurou para si mesmo, um leve toque de surpresa na voz abafada pela máscara de oni.

Escolheu uma posição estratégica no telhado de uma casa vizinha, de onde tinha uma visão clara da estrutura e seus arredores. A construção destacava-se pela imponência e pela modernidade, destoando das edificações tradicionais da aldeia. Observou os guardas distribuídos em pontos estratégicos: um estava postado na entrada principal, outro fazia patrulha ao longo da lateral oeste do prédio, enquanto dois guardas adicionais circulavam a parte de trás, num padrão de vigilância bem ensaiado. Em virtude disso, focou-se na estrutura, notando uma claraboia no telhado, uma entrada potencial. Avaliou rapidamente a rota e, com um salto gracioso, flexionou suas pernas e lançou-se no ar, o manto branco esvoaçando levemente ao vento. Suas mãos enluvadas agarraram firmemente a borda da claraboia, e ele se içou para dentro com a suavidade de uma sombra. Ao aterrissar no chão do corredor, flexionou os joelhos para absorver o impacto, pousando silenciosamente como uma pantera.

Dentro do prédio, seguiu sua intuição e lógica apurada, escolhendo os corredores que o levariam ao centro administrativo. O ar era denso e levemente úmido, carregando o odor metálico e acre de produtos químicos. As paredes de concreto, nuas e frias, refletiam os passos abafados do ninja. Cada movimento seu era cuidadosamente planejado, evitando as áreas mais iluminadas e se movendo rapidamente pelas zonas de penumbra criadas pelas interseções dos corredores. Ele raciocinava: a construção moderna e imponente sugeria um projeto recente, possivelmente com arquitetura racionalista. Os corredores principais seriam largos, bem iluminados, enquanto as áreas secundárias, onde ocorriam os experimentos, estariam mais afastadas, em áreas menos acessíveis para não chamar atenção indesejada. Seguiu pelos corredores principais, notando as placas indicativas e as portas reforçadas.

Finalmente, encontrou uma sala marcada com símbolos administrativos. A porta estava trancada, mas não foi um obstáculo. Com movimentos precisos e silenciosos, usou uma pequena lâmina para destravar a fechadura. A porta cedeu sob suas habilidosas mãos, revelando um escritório repleto de arquivos. Ele buscou rapidamente entre os documentos até encontrar o que procurava: informações sobre Hōki Shabriri. O nome destacava-se em relatórios detalhados, evidenciando seu papel como chefe das manipulações biológicas no laboratório. Não sabia os motivos exatos para os líderes de sua aldeia, especialmente Ubuyashiki, desejarem a morte daquele Hōki, mas os documentos revelavam a gravidade de suas experiências biológicas, o que era razão suficiente para sua eliminação. Nisso os arquivos relevantes em sua bolsa, ciente de que poderiam ser úteis. Seguiu em direção à ala do laboratório onde, segundo os documentos, Shabriri passava a maior parte do tempo.

Sua presença emanava uma aura pesada e ameaçadora, como um presságio de morte. Cada passo seu era firme e deliberado, reverberando levemente no silêncio opressor dos corredores. As sombras projetadas pelas luzes fracas dançavam ao seu redor, conferindo-lhe um aspecto espectral. Suas vestes negras contrastavam com o manto branco que flutuava ao seu redor, como um fantasma emergindo da penumbra. O primeiro guarda estava de costas, distraído com uma prancheta, murmurando para si mesmo. O Empalador aproximou-se com a precisão de um caçador. Seus dedos enluvados deslizaram suavemente pelo pescoço do guarda, pressionando pontos específicos na base do crânio e sob o maxilar, onde os nervos principais se encontram. Houve um estalo seco e sinistro, e o corpo do guarda desabou, inerte, no chão. Ele continuou seu caminho, os corredores vazios e frios amplificando cada passo. O segundo guarda, de porte atlético, estava a alguns metros de distância, próximo a uma porta lateral. Observava as sombras nas paredes, alheio à presença de Maeda. O ninja avançou como uma sombra, suas mãos encontrando as laterais da cabeça do guarda. Com dedos precisos, pressionou pontos atrás das orelhas, onde os nervos eram mais sensíveis. Um movimento fluido e rápido torceu o pescoço do guarda, silenciando-o imediatamente. O corpo caiu em um sussurro abafado. Após alguns minutos de observação meticulosa, encontrou o terceiro guarda, um jovem nervoso, fixo na entrada de uma sala. As mãos do rapaz tremiam levemente. O Anbu saltou silenciosamente, agarrando o guarda por trás. Uma mão cobriu a boca do jovem enquanto a outra desferia um golpe preciso na base do crânio, apagando-lhe a vida. Depositou o corpo no chão com cuidado, e prosseguiu.

Chegando à sala que procurava, encontrou Hōki Shabriri de braços cruzados, como se já o esperasse. Seus olhos fixaram-se nas pequenas telas ao fundo, exibindo imagens ao vivo dos corredores. Câmeras de monitoramento ocultas, um deslize que ele não poderia ter cometido. Shabriri sorria, exalando uma intenção assassina tão maligna que o Senju sentiu seu corpo momentaneamente paralisado.

— O que você esconde atrás dessa máscara? — a voz do cientista ecoou, fria e desdenhosa, enquanto sacava uma katana longa e reluzente.

Sentindo a ameaça iminente, teve que despender parte de suas reservas internas para recuperar os movimentos, a tempo apenas de desviar de um golpe minguante da lâmina de Shabriri. O som metálico do aço cortando o ar — shiiing — reverberou pelo ambiente. A luta começou com uma explosão de movimentos. Maeda sacou duas kunai, suas lâminas brilhando à luz fraca da sala. O Hōki avançou com a katana, desferindo um golpe horizontal. O Senju bloqueou com uma kunai, girando o corpo para diminuir o impacto e contra-atacando com a outra lâmina. O adversário aparou o golpe com destreza, girando a katana para desviar a kunai com um som metálico agudo — clang. O som das lâminas se chocando — clang, clang — ecoava pelo espaço. Era uma coreografia mortal. O Anbu usava sua agilidade – 22 m/s – para se esquivar e atacar com rapidez, enquanto o cientista, com movimentos precisos e calculados, manejava a katana com habilidade. O shinobi atacou novamente, uma série de golpes rápidos com as kunai, tentando encontrar uma abertura. Em um movimento ágil, deslizou por baixo de um golpe da katana, levantando-se rapidamente para tentar um ataque na lateral. O inimigo bloqueou com o cabo da espada, empurrando o mascarado para trás. Os dois se encararam, ofegantes, cada um medindo o próximo movimento do adversário. Maeda lançou uma kunai, que Shabriri desviou com um movimento rápido da katana. Aproveitando a distração momentânea, avançou, a outra kunai pronta para o ataque. O som das lâminas cortando o ar — swish, swish — era incessante, uma sinfonia de morte que preenchia a sala, mas então reinou silêncio. Apesar de simples, a estratégia mostrou-se funcional e sangue jorrou pelo aço.

O Empalador contemplou o corpo inerte do Hōki, estirado no chão como um trágico epitáfio da vida que ali findara. Seus olhos vidrados fitavam o vazio, desprovidos de qualquer vestígio de vitalidade. O vitorioso limpou as lâminas das kunai, o sangue escarlate sendo removido por um pano imaculado que ele arrancou dos trajes do morto. Guardando as lâminas novamente em sua bolsa de armas, fez uma varredura final pelo aposento. Nada de valor investigativo ou informativo se apresentava. A sala, agora um cenário de morte e destruição, estava despida de qualquer utilidade para seus superiores.

Preparando-se para sua partida, retirou quatro papéis explosivos, seus dedos ágeis trabalhando com destreza. Colocou o primeiro na base de um pilar central, calculando que a explosão ali comprometeria a integridade estrutural do edifício. O segundo foi posicionado próximo à porta, assegurando que qualquer rota de fuga ou possível evidência fosse obliterada. O terceiro, cuidadosamente colocado sob uma mesa de metal repleta de equipamentos de laboratório, garantiria que a explosão espalhasse fragmentos de destruição. O último papel foi estrategicamente posicionado junto a um suporte de metal que sustentava parte do teto, assegurando que o desmoronamento fosse completo e controlado. Com tudo devidamente preparado, deslizou para fora do edifício com a mesma furtividade com que havia entrado. Retornou ao telhado de onde anteriormente observara a construção, sua figura espectral se fundindo com as sombras. Ergueu a destra e formou o selo do confronto. No mesmo instante, os papéis explosivos reagiram em uma sinfonia de destruição — BOOM! BOOM! BOOM! BOOM! — um concerto de caos cuidadosamente orquestrado. O edifício começou a desmoronar, os escombros caindo de maneira controlada para não causarem danos às construções vizinhas. Maeda desapareceu nas sombras, dirigindo-se à sede da Anbu da Areia.

Ao chegar, encontrou Ubuyashiki, que o aguardava no salão principal. Sem proferir uma única palavra, entregou os documentos recolhidos no laboratório. O chefe maior examinou os papéis, um sorriso quase imperceptível surgindo em seus lábios.

— Imagino que concluiu sua missão. Se bem o conheço, acredito que causou estrago no vilarejo mais uma vez. Mandarei pessoal para limpar a bagunça. Dispensado.

Em silêncio, o portador da Nove-Caudas assentiu, a máscara ocultando o sorriso de satisfação que se formava em seu semblante. Sem mais delongas, virou-se e desapareceu no véu da noite que já caía, fundindo-se com a escuridão como uma sombra viva. Caminhou pelas ruas desertas, seus passos ecoando suavemente na quietude noturna.