Na penumbra que só uma noite serena no deserto poderia oferecer, o jōnin preparava-se discretamente para uma jornada que, embora simples em sua essência, carregava o peso de responsabilidades pessoais. As paredes do castelo, forjadas pela areia e pelo tempo, eram testemunhas silenciosas de seus preparativos.

— Pegou tudo que precisa? — a voz de sua mãe soou pela sala, tingida de preocupação enquanto observava o jovem Senju ajustar sua espada nas costas.

— Não vou precisar de muita coisa, mãe. Eu só vou buscar a espada pro senhor Kai na Vila dos Ferreiros do País do Vento e retornar — explicou, enquanto se posicionava junto à janela do quarto, a saída habitual para suas aventuras menos formais.

A mãe de Maeda, ciente das implicações de cada missão, não pôde deixar de adicionar um toque de leveza ao momento, talvez para aliviar a tensão que naturalmente acompanhava a partida de seu filho.

— Tente chegar antes do aniversário de Tamayo, não consigo imaginar o que ela fará com você se não estiver aqui — referindo-se à conhecida temperamentalidade da espadachim.

A lembrança da moça trouxe um sorriso ao rosto do jōnin, um misto de nostalgia e afeto. Ele se recordava vividamente do primeiro encontro com ela, quando esta recebera os membros do clã Senju no portão da aldeia após uma migração repentina. Desde então, as interações entre eles haviam sido um entrelaçar de confrontos e romance, a frieza de sua lâmina contrastando com a proximidade calorosa crescente entre ambos. Com o rosto corado pela lembrança e pelo comentário de sua mãe, Maeda assentiu brevemente.

— Preciso ir — com um salto ágil, desceu da janela ao chão, seus pés encontrando a areia fresca da noite. Movendo-se com a destreza que lhe era característica, iniciou sua viagem sob o manto estrelado do céu, rumo à Vila dos Ferreiros.

À medida que a noite se dissipava, dando lugar às primeiras luzes do amanhecer, o jōnin alcançou o limite da Vila dos Ferreiros. O portal de entrada era marcado por um torii amadeirado, um arco tradicional que se erguia com uma dignidade simples, mas profunda. As madeiras do torii eram escuras, desgastadas pelo tempo e pelas intempéries, contando histórias de passagens e de boas-vindas silenciosas a todos que cruzavam seu caminho.

— Quem vem lá? — A voz que interrompeu o silêncio matinal era jovial e feminina, emanando de uma guarita discreta ao lado do torii.

— Sou Maeda, da Areia. Vim buscar uma espada encomendada para o senhor Kai, também da Areia. Ele me entregou esse bilhete para comprovar — o Senju respondeu prontamente, exibindo um bilhete selado com o emblema da renomada família do ancião.

— Então finalmente vieram buscar a Tsumugari — disse a guardiã, referindo-se à espada com um nome que evocava a ideia de um ciclo, um giro completo. Ela emergiu da guarita, revelando-se na luz crescente da manhã.

A mulher era notavelmente bela, com cabelos loiros que esvoaçavam ao sabor da brisa matinal, emoldurando seu rosto com um brilho dourado que contrastava com a rusticidade da vila. Maeda sentiu um estranhamento momentâneo, um frêmito de algo indefinido, mas manteve a compostura pela qual era conhecido. Seguindo a moça por entre as ruelas da vila, permitia-se absorver a atmosfera do lugar. As casas da Vila dos Ferreiros eram estruturas simplórias, predominantemente construídas de madeira escura, similar ao material do torii. Algumas possuíam pequenos jardins dianteiros, onde ferramentas de ferreiro e flores silvestres coexistiam em uma harmonia trabalhosa. Cada residência parecia respirar uma história de artesanato e labuta, com detalhes minuciosos nas janelas e nas portas que sugeriam a habilidade e o cuidado dos seus habitantes. Chaminés dispersas entre as casas soltavam fumaça, anunciando o começo de mais um dia de trabalho no forjar de metais. O som suave das marretas batendo em bigornas começava a preencher o ar, uma sinfonia rústica que acompanhava o jōnin e sua acompanhante pela vila. Enquanto caminhava, o jovem ninja contemplava a estética da vila enquanto refletia sobre a arte e a dedicação que aquele lugar respirava, uma pausa reflexiva antes de completar sua missão.

— É aqui! Esta é a casa do senhor Kōzaburō, o ferreiro mais antigo de nossa aldeia — disse a mulher.

A dita casa se destacava nitidamente no contexto da vila. Enquanto as demais residências ostentavam uma simplicidade rústica, a casa de Kōzaburō transpirava uma aura de antiguidade bem cuidada, misturada a toques de modernidade que falavam da proeminência de seu proprietário. Os detalhes em madeira trabalhada ao redor das janelas e portas eram mais elaborados e preservados com um verniz que refletia o brilho suave do sol matinal, e pequenos adornos metálicos nas dobradiças e maçanetas adicionavam um toque de refinamento e durabilidade.

— Obrigado… — A hesitação do jōnin revelou que a moça ainda não havia se apresentado, criando um breve momento de embaraço compartilhado.

— Oh, céus! Me perdoe. Me chamo Ikumi Mito — respondeu ela com uma ligeira curva, suas feições bronzeadas contrastando com seus cabelos loiros, que caiam em ondas leves sobre seus ombros, refletindo nuances douradas à luz do sol. Seus olhos, um azul claro quase translúcido, refletiam um espírito vivaz e acolhedor. Ikumi se afastou, deixando Maeda à porta da casa do ferreiro.

O Senju bateu na porta. Não demorou muito para que ela fosse atendida por um senhor de aparência distinta e cheia de caráter. Kōzaburō, com suas sobrancelhas grossas e espessas que se arqueavam como asas de uma ave, um rabo de cavalo grisalho que adicionava um ar de dignidade e uma barba bem cuidada, observava o jovem com olhos astutos. A cicatriz na têmpora esquerda, a katana ao lado e o kiseru entre os lábios completavam a imagem de alguém que tinha muitas histórias para contar.

— O que quer? — perguntou o ferreiro, sua voz rouca pela idade e pelo fumo.

— Me chamo Maeda. Vim buscar a encomenda de Kai-sama — estendeu o bilhete selado, esperando que isso validasse sua presença e propósito.

— Não chame minha Tsumugari de encomenda rapaz, tenha mais respeito pela arte — Kōzaburō respondeu com um meio sorriso, assegurando ao jōnin que sua correção era mais uma lição do que uma repreensão. Ele então se afastou da porta, convidando Maeda a entrar.

Ao adentrar a oficina de Kōzaburō, Maeda foi imediatamente transportado para um mundo que transcendia a rotina de sua vida de ninja. O espaço era uma sinfonia de elementos artesanais, onde cada ferramenta e cada pedaço de metal contava uma história de dedicação e perícia. As paredes estavam adornadas com armas de várias eras, cada uma com sua própria aura de mistério e lenda. Grandes bigornas, pesadas e desgastadas pelo tempo, ocupavam o centro do espaço, enquanto fagulhas voavam de forjas que ainda brilhavam com o calor de um trabalho recém-concluído. O ar estava saturado com o cheiro de metal aquecido e carvão, e o som de martelos contra o aço formava uma melodia rítmica e hipnotizante. Luz suave filtrava-se através de pequenas janelas, iluminando partículas de poeira que dançavam no ar, criando um efeito quase mágico. Para o Senju, era como entrar em um templo sagrado dedicado à arte da metalurgia, onde cada peça produzida carregava um espírito próprio.

— Aqui está — disse Kōzaburō, interrompendo o encantamento de Maeda.

Ele entregou a espada Tsumugari, cuidadosamente embrulhada em um tecido exuberantemente decorado, realçando ainda mais a solenidade do momento. A admiração do jōnin ra palpável, e o velho ferreiro percebeu o brilho nos olhos do jovem.

— Gosta do que vê? — perguntou, um sorriso leve tocando seus lábios.

— Isso tudo é incrível — respondeu Maeda, ainda absorto no ambiente e na peça que agora segurava — Eu sou bom com espadas, mas apenas utilizando-as. É outra sensação conhecer como elas são forjadas.

Kōzaburō assentiu, compreendendo a profundidade do momento para o jovem espadachim.

— Sabia que os guerreiros mais antigos forjavam suas próprias espadas? As lendas dizem que quando um guerreiro usava a espada que ele mesmo forjou, sua conexão com ela era tão grande que ele se tornava invencível — compartilhou o ferreiro, seus olhos brilhando com o respeito pelas tradições antigas.

A mente de Maeda foi capturada por essa imagem: o guerreiro e sua espada, uma extensão de seu próprio ser.

— Quer aprender como fazer uma boa espada e ser como eles? — Kōzaburō lançou a proposta, vislumbrando talvez um potencial não apenas no talento marcial do Senju, mas em sua capacidade de abraçar uma arte tão nobre quanto a que ele dominava.

— O senhor me ensinaria? — A voz de Maeda vibrava com uma mistura de reverência e entusiasmo.

— Considere-se meu aprendiz. O primeiro em anos! — Kōzaburō respondeu com um brilho nos olhos, claramente satisfeito com a disposição do jovem. Ele pegou a Tsumugari das mãos do jōnin e a colocou delicadamente sobre uma bancada próxima. Com um gesto firme, agarrou o menino pelos ombros e o guiou até o centro da oficina.

— Repita o que eu fizer — instruiu Kōzaburō, assumindo uma posição diante de uma grande bigorna.

A lição começou com o ferreiro aquecendo um pedaço de metal no forno até que brilhasse num vermelho vivo. Ele então o colocou sobre a bigorna.

— Preste atenção na cor do metal; ela nos diz a temperatura e o momento certo para forjar. Muito quente, e o metal pode quebrar. Pouco quente, e ele resistirá a forma — Kōzaburō explicava, enquanto demonstrava como golpear o metal com o martelo, transformando-o com cada batida.

O Senju observou atentamente e depois imitou os movimentos de seu mestre, sentindo o peso do martelo em sua mão e o metal cedendo sob a força de seus golpes. A sensação de moldar algo tão resistente era ao mesmo tempo humilhante e empoderadora.

— Cada golpe deve ser preciso e medido. Não é apenas sobre força; é sobre entender o material e trabalhar com ele — o velho instruiu, enquanto ajustava a postura de seu aprendiz.

Kōzaburō então mostrou como utilizar diferentes ferramentas para afinar as bordas e suavizar a superfície do metal. A cada nova ferramenta e técnica, ele explicava sua função e importância, mostrando como pequenos detalhes podiam mudar drasticamente o resultado final.

— A paciência é tão importante quanto a habilidade. Uma boa espada não pode ser apressada — disse ele, enquanto poliam a lâmina juntos.

Maeda sentia cada vibração do metal através do martelo, cada mudança de textura sob a lima. A cada momento, a conexão entre ele, o metal e o fogo parecia crescer, uma dança de elementos guiada pelas mãos experientes de Kōzaburō. Por fim, o homem mostrou ao jōnin como tratar o metal para aumentar sua durabilidade e beleza, mergulhando a lâmina recém-forjada em um tanque de óleo para temperá-la.

— A têmpera é crucial. Ela define o caráter da espada, sua tenacidade e sua capacidade de manter um fio cortante — explicou ele, observando a lâmina sibilar ao contato com o óleo frio.

A primeira lição terminou com o velho mestre colocando a espada ainda quente sobre a bancada e dando um passo para trás, permitindo que o aprendiz absorvesse tudo o que havia ensinado.

— Como se sente? — perguntou Kōzaburō, com um misto de orgulho e curiosidade.

— É mais do que eu poderia imaginar — respondeu Maeda, sua voz cheia de admiração e um novo respeito pela arte da forja.

— Bom, volte quando estiver pronto para mais. Sei que tem uma entrega para fazer e eu novas armas para produzir — disse Kozaburo.

— De fato, Mestre. Nos vemos em breve — respondeu Maeda.

Ambos se curvaram em reverência e então se despediram. O retorno fora feito, tal como a entrega da Tsumugari a Kai.