O céu crepuscular era anúncio de muitas coisas naquele distrito comercial, e pessoalmente meu momento ideal do dia. Significava o fechamento dos comércios, as despedidas acaloradas, a chegada dos negócios ilícitos, dos sussurros, da malícia. Para mim, era o fim de um dia de trabalho ajudando na mercearia quando não estou em missão. Hoje, entretanto, havia a sensação de que era só o começo.

Estou no horário certo, repito mentalmente, movendo o peso do corpo de um pé para o outro, imbuído de nervosismo. Minha paranoia começa a sugerir que não foi uma boa ideia marcar de o pequeno Nanami vir me encontrar aqui, num bairro não tão seguro. Começo a suar frio imaginando que algo possa acontecer com o pequeno loirinho... Claro, parte disso também vinha da vulnerabilidade — e vergonha — de deixá-lo ver onde eu morava. Jamais havia recebido visita de colegas antes.

Tanto tempo... Nossa primeira e única missão juntos em Uzushiogakure parecia ter se passado há uma infinitude. Saudades, sorrio lembrando do ninja com cara de irmão mais novo. Ele estava apto a vir acompanhado, afinal uma ida à praia seria mais interessante com mais gente. Hiperativo como é, deve ter uma boa gama de amigos. Eu, entretanto, não tenho quem convidar. Bem... exceto... Minha mente flutua, então, para alguém que descobri morar há algumas ruas dali. Tão perto. Logo, sinto um frio na espinha naquela noite de verão. E esse aí eu chamo do quê? Amigo? Suspiro. Só haviam alguns dias, era tão difícil de categorizar... É normal querer sentir o aroma do pescoço dos seus "amigos"? Ou fazer meus dedos se perderem por seus longos cabelos?

Patético. Afundo a cabeça nos braços. A iluminação da mercearia tintila com uma mariposa flutuando no vidro da lamparina. Isso é falta de missão. Quem está prestando serviços para a hedônica força militar de Kirigakure não tem tempo para aquelas besteiras. Hakari-sensei, lembro do meu apostador favorito de sobressalto. Navego rápido até o balcão da mercearia e retiro um embrulho que definitivamente está ali há mais tempo do que deveria. Investigo o confeito de chocolate sem muita certeza se ainda estava comestível. Era um presente, choramingo. Mas logo uma pitadinha de angústia me atravessa. É culpa dele por não me chamar para mais missões! Estava bom quando eu fiz...

E, assim, fico aguardando ali com um pedaço duvidoso de sobremesa nas mãos.

• Palavras: 400
  
• Aparência:Essa.
  
• Obs: Filler Status
  

Considerações:

Um grito. Um grito esganiçado, alto e constrangedor. Sinto o doce achocolatado ser esmagado entre meus dedos, tamanho foi o susto com a chegada de Nanami. Minha mãe, penso, com medo. Será que ela vai descer pra me dar uma bronca? Na frente do meu companheiro de time? Uma senbon na garganta seria menos doloroso.

— O-oi, Nanami... — Não posso deixar de ficar feliz em vê-lo; de fato, havia se passado um tempinho. Ele ficou mais alto? Talvez tivesse feito aniversário durante a virada de ano. O pensamento me dava uma pontinha de culpa por nunca ter lhe perguntado a data. — F-faz tempo, sim! Você cresceu... e-eu tive saudades — sorrio timidamente. Ao ouvi-lo, nem tenho um respiro para ficar triste ao saber que ele e Hakari estão saindo em missões sem mim; aquela outra informação era muito mais curiosa! Instintivamente, largo a ruína que havia se tornado aquele doce e agarro as mãos do Yamanaka, sujando-as de chocolate vencido. Me inclino para frente com uma expressão de choque. Nunca fui adepto às fofocas mesmo trabalhando naquela mercearia, mas tão logo o loirinho parece ser o confidente perfeito. — I-isso faz total sentido! Você nem sabe, Nanami, tenho tanto pra te contar! E-eu também conheci uma pessoa capaz de copiar Jutsus! E, você não vai acreditar, ela é do mesmo clã que...

Somos interrompidos. Nunca vi a figura de cabelos rubros antes na vida, mas era inevitavelmente imponente e despojada — me lembrava Hakari-sensei, um pouco, e o olhar dourado me remetia à Sum. Só que é bem mais desbocado que ambos... Missão juntos? Bem, quem seria eu para julgar, me enfiando em barcos por aí, também com uma certa pessoa fora do Time 2 e quase tendo meu primeiro beijo roubado?

— N-não somos irmãos... Meu nome é Naritoshi — murmuro. É então que percebo a bagunça que estou fazendo com o que um dia já foi um presente feito com muito carinho para meu mestre. Porém, o choque me atravessa com aquelas bebidas. Olho de relance para a escadaria atrás do balcão. Se minha mãe nos visse... Só me resta gaguejar aterrorizado: — V-vo-você n-não p-po-pode b-beber a-aqui — suplico, sentindo meu rosto arder. Imagino-o vermelho como um morango. Além disso, o Nanami era uma criança! Semicerro os olhos para o tal Crowley. Ele mesmo não parece tão mais velho assim... — P-por favor, g-guarda i-isso a-a-antes q-que a m-minha...

E então, Sum chega — com suas deslumbrantes mechas de neve em contraste ao sedutor tingimento preto nos lábios. Um visual arrebatador. Ao menos para mim. Sim, sim. Eu estou arrebatado. O que é aquilo? Virou uma festa? Em que eu sou o anfitrião sem nem ter sido avisado do evento? Minha mãe vai descer a qualquer momento e me esquartejar na frente deles. Que lindo.

— SUM — eu grito, me levantando de sobressalto e escondendo as mãos sujas atrás do corpo. Você é a minha saída. — Q-que bom que você c-chegou. — Vou titubeando até seu lado. — Este é Nanami, o outro integrante do Time 2 de Kirigakure e um colega querido. Nanami, esse aqui é... — um rapaz esquisito, peculiar e que insiste em me chamar pelo nome completo, o que, na verdade, é uma característica muito fofa e ai, meu deus, eu acho que estou me apaixonando por ele já que não deve ser natural querer beijar alguém que você conhece há alguns dias ou então perder horas de sono querendo saber como puxar assunto ou então pensando bobagens que eu não quero nem falar mas então quem é que delimita se as coisas estão andando rápido demais ou qual é o momento certo para — ... meu amigo. — concluo. Aponto para Crowley com o queixo. — Aquele ali eu acho que é um criminoso. — Me viro para Sum. — Combinamos de fazer uma visita à praia, quer vir conosco? Vamos indo — Para longe da mercearia, para longe da mercearia... — Vamos todos lá pra fora, andem, andem — continuo repetindo enquanto sigo porta afora do estabelecimento, torcendo para ser seguido.

[...]

O caminho para a praia seria repleto de boas histórias. Que grupo curioso, preciso concluir, com um sorriso no rosto. Primeiro, Nanaminho — meu colega de equipe por quem tenho um apreço genuíno. Como não querer apertar as bochechas desse moleque hiperativo e agitado? É o irmãozinho que eu nunca tive. Analiso-o de longe, com sua empolgação contagiante, pensando em como tenho sorte de poder assistir sua caminhada até virar um shinobi impecável. Já esse tal de Crowley... Passada a confusão inicial, tenho que admitir — o cara é super gente boa. Sua atitude irreverente na verdade é bem inspiradora; somos tão opostos no comportamento que não posso deixar de admirar sua liberdade. Se não fosse a criação restrita da Tubaroa Sem Descontos, quem sabe não seria eu a andar por aí com cerveja na bolsa? Espero genuinamente aprender uma coisa ou outra com esse moço.

E, por fim... Sum. Ah... meu querido Sum. Ali, sob a palidez lunar, ele está tão lindo quando da primeira vez que o vi. A lua nos une de novo, sinto minhas bochechas corando. A areia se desfaz entre meus dedos enquanto estou sentado, quietinho, admirando-o — seus longos cabelos e vestes esbranquiçadas lhe dão uma aparência fantasmagórica enquanto se move, quase como numa dança espectral ao redor dos outros Genins. Meu coração dói. Estou feliz. Estou tão feliz que parece injusto. Não preciso de mais nada além disso daqui, dessa companhia, de poder olhá-lo de longe... Será que ele se lembra da nossa conversa? Sobre a brisa que dá forma às ondas? Ali está, minha brisa, um rapaz peculiar que decidiu embaralhar todos os meus sentimentos e criar um maldito de um tsunami.

Agora, também sinto medo. Vê-lo ali... Quero tocá-lo. Tocá-lo uma vez... uma única vez. Ser sincero sobre o que sinto. Mas não consigo. Está tudo bem assim, minto. Só olhá-lo de longe. Terei outras oportunidades, tento me convencer. Assim, me levanto com um sorriso robótico estampado no rosto e me junto ao pessoal.

Seria uma noite feliz.