Mais um dia acabava de se iniciar, e a dupla, cada um no seu canto, apreciava a paisagem. Embora tivessem um objetivo claro em mente, não passavam todo o tempo realizando certos tipos de atividades, principalmente depois da melhora de Ethan. Por isso, eles tomavam um tempo para descansar e para refletirem sobre o que tivessem vontade, afinal eram livres para deixar a mente vaguear por onde seus corpos não conseguiam. Enquanto Ethan deixava as costas apoiadas no tronco de uma árvore, observando o nascer do sol, Oliver aproveitava o tempo livre para averiguar os seus pertences. O velho organizava cada um dos itens que trouxe consigo com perfeição, deixando-os perfeitamente alinhados sobre um forro de couro. Feito isso, tirou uma pedra peculiar do bolso e começou a amolar as suas espadas e Kunais.

O som metálico das Kunais riscando a pedra era responsável por todo e qualquer ruído presente naquele lugar esquecido por Deus, nem mesmo os pássaros faziam questão de agraciar os ouvidos dos dois com a sua canção serene. Tudo o que tinham era um sol forte se abatendo sobre os seus rostos e um barulho que ficava mais alto à medida que o tempo corria, indicando que alguém se aproximava. Quando finalmente a silhueta do responsável pelos passos apareceu no horizonte, Oliver se virou na direção do sujeito e o cumprimentou, erguendo a canhota. Logo em seguida, respirou fundo, como se já soubesse o que aquela presença significava.

— Há quanto tempo, Oli — Sem qualquer tipo de cerimonia, o velho retribuiria o cumprimento do outro. A falta de cabelo não o impedia de coçar a cabeça, da mesma forma que a falta de dentes não o impediria de direcionar um sorriso vazio na direção de Ethan. — Hm... Então ele que é o seu neto? Que estranho, achei que o garoto fosse mais alto.

— Vic, vamos deixar o papo furado para depois, pode ser? E então, você conseguiu encontra-lo? — Oliver não fazia questão de esconder a sua impaciência, de braços cruzados, não parava de fungar e bater o pé no chão, incessantemente.

— Parece que você continua o mesmo, afinal. Impressionante — comentou, antes de responde-lo. — Mas, respondendo à sua pergunta, digamos que sim. Mas temos alguns problemas. Não vai ser tão fácil assim chegar nele.

— Pra mim já o suficiente. O que está esperando? Vamos, não temos tempo a perder — Oliver se virou para o neto, que seguia encarando fixamente o nada, e começou a gritar. — Ethan! Vou precisar me ausentar por alguns dias. Então vê se cuida de tudo até lá! E nem pense em tocar nas minhas coisas.

Depois da despedida acalorada, com um jutsu simples os dois velhos desapareceram, não deixando qualquer rastro para trás.

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Ethan não teve muito tempo para processar o que acabara de presenciar, na verdade, há muito aquela missão do avô não fazia muito sentido para ele. Mesmo se esforçando, não via motivos que justificassem a presença de ninjas tão velhos em missões. Dentre todas as suas suposições, até agora, a existência de assuntos inacabados era a única ideia que não parecia absurda demais pra ser verdade. Quando pensou em acabar com o mistério de uma vez por todas, se lembrou que os dois não estavam mais presentes. Então, no final, tudo que restou para o garoto era um punhado de suposições infundadas e mais perguntas do que conseguia responder.

Não demorou muito até Ethan se dar por vencido; continuar pensando naquilo não o levaria a lugar algum. Por isso, do mesmo modo que fazia minutos atrás, encarava os céus, as nuvens e qualquer outro detalhe em volta capaz de prender a sua atenção por alguns instantes. Ele, apesar dos pesares, não era do tipo de pessoa que ficaria indo de um lado para o outro afim de garantir a segurança do assentamento, jamais optaria por uma abordagem tão trabalhosa. Ficar distraído com futilidades, em partes, era o seu jeito de dizer que se importava, caso contrário, apenas se levantaria e caminharia a esmo até as pernas começarem a doer.

Embora não fizesse muita questão de pensar adiante, já tinha todo um plano em mente. Durante os dias que passaria sozinho, sem ninguém para julga-lo, ficaria sentado debaixo de uma sombra volumosa enquanto observava o curso das coisas, assumindo o seu devido lugar de penetra naquele ecossistema. E se tivesse sorte, não precisaria se preocupar com nada. No entanto, pelo visto, ele tinha esquecido de avisar isso para a criatura que se esgueirava pelos topos das árvores, esperando o momento certo para atacar a sua presa.

A criatura humanoide, de pelagem negra e caninos afiados, estava prestes a dar início a caçada, visando rasgar a pele do garoto com as suas garras e presas afiadas. Porém, antes de o fazer, utilizou os seus instintos apurados para vasculhar os arredores em busca de outros predadores. Assim que confirmou que não havia nada em seu caminho, saltou.

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Ao realizar a sua ofensiva mortal, visando acabar com aquela frágil existência, a criatura já tinha tudo friamente calculado, afinal nascera para isso, era por natureza um predador silencioso e meticuloso. Se aproximaria sem alardes, observaria os arredores e, por fim, colheria a recompensa em sangue e carne — este era o plano. Embora tudo tivesse sido pensado para não deixar margem para falhas, ele não contava com o fato daquele garoto desavisado ser tão inquieto. Não tinha como imaginar aquilo. Então, quando estava prestes a concluir a sua ação, não pôde fazer nada assim que o mancebo rolou pelo chão.

A priori, Ethan não tinha a intenção de se salvar com um movimento tão ágil quanto aquele, mas, enquanto admirava o que a natureza tinha para mostrar, acabou vendo que uma sombra se aproximava com velocidade por cima. Ele não teve tempo para assimilar o fato e reagir, era verdade, tudo que precisou fazer foi confiar nos seus reflexos, que mais uma vez o tiravam de uma enrascada.

Depois do susto, não parou, assustado, completava o movimento apoiando ambas as mãos no chão e tomando um impulso suficiente para se afastar 20 metros do que quer que fosse aquela coisa. Os seus movimentos iniciais tiveram sucesso, no entanto, a reação do animal não tardaria. Com um rugido estridente, quase como um uivo, anunciava a sua cólera para aqueles que estivessem dispostos a ouvir. Então, após os seus olhos ficarem vidrados na figura do garoto, na sua presa, não demorou muito para dar continuidade ao ataque anterior. Mas, diferente de antes, a raiva potencializava os seus movimentos, tornando-os imprevisíveis e ágeis.

Mesmo que a velocidade fosse a sua principal força, Ethan não podia fazer nada quanto as incessantes investidas. Por sorte, ainda podia contar com o domínio apurado sobre o seu corpo para desviar das garras da fera, inclinando o tronco em momentos oportunos e saltando para trás. Entretanto, a defesa perdia a eficiência à medida que a criatura se adaptava às esquivas. Cada vez que as suas garras rasgavam o ar, mais se aproximavam do alvo, e caso Ethan não fizesse nada a respeito, ela continuaria se adaptando e acentuando ainda mais a sua velocidade e precisão.

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Apesar de não ter muitas experiências reais de combate, Ethan sabia que se comportar da forma como estava não o levaria a lugar algum. Ele estava apenas postergando o inevitável. Se não desse um jeito de contra-atacar, seria pressionado até as suas habilidades não serem mais o suficiente. Por isso, dispensando por completo a necessidade de selos de mão, ele concentrou o seu Chakra afim de aumentar a destreza dos seus movimentos. No entanto, quando estava a um passo de sobrepujar a velocidade da fera, ele hesitou. Mesmo evitando ao máximo o assunto, ainda tinha dúvidas em seu coração. Fugir do que aconteceu dias atrás não traria nada de bom, e aquela era prova que precisava. Nesse momento, não importava o quanto queria sobreviver, se recusava a usar a sua herança genética. Acima de qualquer medo irracional da morte, tinha medo de voltar a “apagar”, acordando dias depois sem qualquer lembrança do ocorrido.

Não sendo capaz de reagir com toda a velocidade, continuou com aquele jogo de gato e rato, onde tinha a disposição apenas as suas habilidades corpóreas e uma meia dúzia de jutsus que não seriam tão úteis. A criatura, por outro lado, não apresentava qualquer sinal de fadiga ou preocupação, continuava no encalço do jovem, saltando à medida que ele saltava, dando aos seus golpes a devida precisão. Depois de inúmeras investidas, finalmente ela conseguiu se aproximar de Ethan, marcando a sua camisa com marcas de garras. Dessa vez, era quase como se conseguisse antevir os passos do garoto, não lhe dando qualquer chance de resposta.

Sentir a morte passar tão perto, no entanto, fez Ethan perceber que tinha de fazer algo, urgentemente. Os seus batimentos irregulares e respiração descompassada atestavam o fato; ele estava com medo e, para piorar, não sabia o que fazer. A única coisa que sabia era que precisava ser rápido, já que o intervalo entre os golpes do inimigo era curto demais para que pudesse tentar estratégias mais elaboradas. Desse modo, não tento qualquer poder de escolha, agiu.

— Qual o nome daquele jutsu, mesmo? — Estar em constante movimento, lutando pela própria vida, não impediu Ethan de conversar consigo mesmo enquanto achava uma solução para o problema — Ah! S-H-U-N-S-H-I-N — Sussurrou, antes de dar vida ao selo de mão necessário para acelerar os seus movimentos.

Assim que a técnica foi concluída, Ethan não iria mais fugir. Ele esperou pacientemente por uma brecha, e quando conseguiu uma percorreu os 5 metros que os separavam, inclinando o tronco na direção contraria ao golpe e acertando o algoz no queixo com a palma da mão esquerda. Não obstante, moveu os pés afim de dar um pequeno giro ao redor do próprio eixo, o que possibilitou que ele se reposicionasse e desse uma cotovelada no centro do peito da criatura.

Obtendo sucesso na investida, achou prudente se afastar, observando as reações do animal no processo, esperando que aquilo tivesse sido o suficiente para desencoraja-lo. Com esse propósito, voltou a utilizar a técnica de movimentação para saltar uma distância de 30 metros, tomando o impulso necessário para obter sucesso no movimento.

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Se mover daquela forma trazia muitas memórias à tona, de uma época em que Ethan não era capaz de utilizar as habilidades do seu clã, a sua kekkei genkai. Na ocasião, Oliver parecia não se importar com aquilo, exigia que o neto fosse rápido, e ponto. Não importava como faria, se fosse capaz de acompanhar o ritmo dos treinos, já estava de bom tamanho. Por isso, Ethan acabou aprendendo a utilizar aquela habilidade básica de uma forma única. Quando criança, o seu controle de chakra era péssimo, sabia disso melhor do que ninguém, o que o obrigava a evitar desperdícios, mesmo que, a princípio, o custo do jutsu fosse risório. Mas o verdadeiro desafio acontecia no fim do dia, quando estava exausto demais para recuperar as energias, quando o simples ato de se mover causava diversas dores pelo seu corpo. Era nesse momento que Ethan precisava ser o melhor, precisava suprir as expectativas impostas pelo velho.

No início, Ethan era só uma criança curiosa que observava o avô se exercitar, maravilhado com as peripécias realizadas diante do seu olhar curioso. Mas depois de alguns anos, tudo era banal. Com o tempo, o fascínio de outrora não passava de uma lembrança, nada do que fazia durante os treinos lhe causava algum fascínio. Tudo que passava pela sua mente durante os treinos era que precisava ser mais rápido. Se escorando unicamente nesse pensamento infantil de ser o melhor, Ethan não se limitou aos efeitos básicos da técnica de movimentação. Ela era a sua única arma para lidar com a velocidade monstruosa de Oliver, por isso, não aceitou os limites impostos pela sua incapacidade. Ethan treinou por meses a finco até poder alcançar resultados satisfatórios, sem se importar com os efeitos que afligiam o seu corpo, não ligando para o que viesse a acontecer consigo.

Porém, inevitavelmente, os anos passaram, e com isso Ethan conseguiu aos poucos dominar os seus dons naturais. As técnicas ainda não eram utilizadas com perfeição, diferente do avô que detinha uma maestria invejável do elemento, mas mesmo assim Ethan passou a se apoiar unicamente nelas, deixando a técnica básica de movimentação para trás, como um brinquedo velho que tinha sido superado há muito por outros. No entanto, agora que encarava aquela figura humanoide, não tinha mais habilidades herdadas para lhe salvar. Não tendo outra escolha, deixou o orgulho e a vaidade de lado, decidindo fazer uso do Shunshin no Jutsu, embriagando o corpo com a velocidade que era sua por direito, aquela que reagia com o seu corpo em uma ressonância única.

Ethan não tinha mais motivos para se segurar, então, sem demora, tomaria em mãos a espada que carregava na parte inferior das costas e olharia uma última vez nos olhos do animal, assinando a sua sentença de morte. Depois disso, apenas um selo de mão seria visto naquele campo de batalha antes de Ethan se jogar na direção do inimigo, passando por ele pela esquerda, ficando a 1,5m da fera. Por fim, a lâmina do Jonin foi de encontro ao pescoço daquele ser único, fazendo a sua cabeça rolar pelo chão e o seu sangue esguichar. Após o julgamento da espada ser concluído, Ethan caiu de joelhos, exausto. Assim como outrora, voltava ficar inconsciente, mas dessa vez, se lembrava perfeitamente do crime cometido em prol da sua sobrevivência, se lamentando por ter deixado a situação chegar nesse ponto.

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