O sol timidamente começava a se erguer nos céus quando Ethan finalmente retornou ao acampamento. As vestes do garoto estavam completamente rasgadas e cobertas de sangue, sangue esse que ainda escorria aos montes pelos seus braços. Não obstante, ainda ostentava marcas roxas por todo o corpo, que mesmo assim não chamavam tanta atenção quanto os cortes por toda a extensão dos braços e pernas. Enquanto andava rumo a barraca planejada para o seu conforto, respirava pesadamente, dando indícios de que logo o seu corpo cederia. Àquela altura, Ethan já não conseguia enxergar um palmo além do seu nariz, tudo à sua volta tinha se transformado em um borrão repleto de formas esdrúxulas.

Assim que deu a sua jornada por encerrada, flagrando um clarão laranja que se assemelhava a fogueira que tinha sido acesa na noite anterior, não se preocupou com mais nada, apenas foi em direção à sua morada temporária e desabou em cima do saco de dormir que aguardava pacientemente o seu regresso. As horas seguintes seriam um completo mistério para Ethan, onde a única coisa que conseguia se lembrar, com dificuldades, era que a cabeça doía. Em momento algum, imaginou que seria capaz de sentir uma dor tão aguda e pertinente quanto aquela; nem os seus piores pesadelos eram capazes de abrigar algo tão nefasto.

Nada além do vazio acompanharia Ethan nos 4 dias em que ficou inconsciente. Quando acordou, o seu corpo continuava o mesmo, todos as peças estavam no lugar. Contudo, cada movimento seu era acompanhado de pontadas de dor. Olhando mais atentamente, via que seus braços e pernas estavam envoltos por uma manta branca com algumas manchas pertinentes de sangue. Isso, por sua vez, acabava por limitar ainda mais a sua mobilidade. Assim que percebeu aquilo, desconfiado, Ethan tentou se lembrar do que havia acontecido. No entanto, a procura do Jonin parecia não ter dado em nada; se lembrava de correr, depois de voltar para o acampamento ao amanhecer, e só.

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Logo que recobrou a consciência a cabeça continuava doendo, era verdade, mas ainda assim Ethan não recuou, ignorava tudo aquilo que o afastava do seu objetivo. Então, sem demora, se levantou e buscou empurrar a cortina verde desbotada que servia de porta para a barraca, sentindo um incômodo momentâneo assim que a luz do sol foi projetada contra os seus olhos. Em resposta, Ethan posicionou as costas da destra rente aos olhos, buscando um refúgio, tentando se acostumar com a sensação. Por fim, andou até a beira da fogueira e tomou um lugar ao lado do avô, observando que o mesmo terminava de preparar um chá de ervas.

— Já está acordado?! — Ao flagrar a presença do neto, a surpresa no rosto de Oliver não poderia ser maior. Olhava o garoto de cima a baixo, curioso com o fenômeno.

— Uma hora tinha de acordar — ainda de mal humor por causa da dor de cabeça, retrucou.

Após isso, Ethan pegaria uma daquelas xícaras amassadas pela alça e se serviria. Com a outra mão, agarrou com firmeza o bule, o inclinando até ser capaz de ver o líquido esverdeado escorrer pelo bico. No entanto, tão rápido quando agarrou a xícara, viu ela escapar por entre os dedos. Como se desperdiçar todo aquele chá não fosse o suficiente, observava cada parte do seu corpo colapsar. Os dedos estavam rígidos como pedras. Quanto aos braços, esses voltavam a ficar encharcados de sangue à medida que Ethan tentava se mover, mostrando a ineficiência das faixas em seu braço. Não muito tempo depois, caiu no chão, tendo que amortecer o impacto da queda com o ombro direito. Sem que Ethan tivesse qualquer poder de escolha, via também os músculos de ambas as pernas se contraindo — lhe causando uma dor insuportável no processo.

— Calma. Não precisa se esforçar tanto — Segurando a cabeça do neto com todo o cuidado do mundo, Oliver parecia entender os motivos por trás daqueles sintomas. — Ethan, por hora, você precisa descansar um pouco. Com tudo que você andou fazendo, isso não me surpreende.

— O que? — Ainda confuso com o ocorrido, Ethan tentava achar sentido nas palavras do velho. Mas antes disso, tomou algum tempo para analisar o seu comportamento. As palavras acolhedoras, o toque afável e, por fim, a permissão para “descansar”; nada daquilo fazia sentido, aquele não era o Oliver rabugento que conhecia. A dor até que tentava tomar toda a sua atenção, mas, diante de tantos elementos inexplicáveis, nada pôde fazer, a mente de Ethan encontrava meios de deixar todo o sofrimento em segundo plano.

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Depois de alguns instantes, Ethan ainda estava preso com aquele quebra-cabeças, com as mesmas dores. Mas, em contrapartida, ele não ficaria debaixo daquele sol matinal por muito tempo, já que o avô, com uma força invejável, o carregaria nos braços. Tomando um certo cuidado para não agravar a situação do garoto, Oliver o levou até a sombra de uma árvore que ficava à esquerda de onde estavam.

— Não precisa ter pressa, ainda temos algum tempo sobrando. Na verdade, de acordo com o cronograma, estamos adiantados — depois de improvisar um travesseiro para o neto com alguns trapos que encontrou no meio das suas coisas, ele se despedia. — Ethan, mais uma coisa... Saiba que eu tenho muito orgulho de você, do homem que se tornou. Muito obrigado por me dar a chance de passar o meu legado adiante.

Ethan não reagiu. Ele não sabia como agir depois de ouvir aquilo o que mais desejava. Queria ficar com raiva do velho por tudo que teve que passar ao longo dos anos, por todas as vezes que foi rebaixado a lixo pelo mesmo, pelas noites que passou em prantos porquê não tinha se saído bem nos treinos. Mas no fim, nem mesmo aquelas palavras tinha o poder de mudar algo, a dor simplesmente não tinha desaparecido. Todos aqueles sentimentos estavam gravados na sua pele, jamais desapareceriam, iriam assombra-lo para todo o sempre, e não havia nada capaz de mudar este fato. Se tivesse sorte, algum dia poderia aprender a conviver com aquela voz que insistia em diminui-lo, falando que jamais seria bom o bastante, que por não ser rápido o suficiente perderia todos que amava. Aquela era a sua maldição. Eventualmente, a sua maior força se tornaria a sua maior fraqueza. Um ser fadado ao fracasso, esse era Ethan Kato.

— Por que isso agora?!! — Não conseguindo encontrar uma explicação que justificasse aquele comportamento, resolveu confronta-lo.

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— Se deseja mesmo uma resposta, basta dar uma boa olhada à sua volta. Jura que isso não é motivo o suficiente para sentir orgulho do meu estimado neto? — antes de continuar, esperou Ethan confrontar o que havia feito. — Sabe, nem eu acredito no que você foi capaz de fazer com esse lugar. Jamais pensei que voltaria a te ver tão sério, era exatamente como nos velhos tempos. Estranhei quando falava com você e não recebia uma resposta, e também não entendia como você conseguia se mover daquela forma enquanto lutava para manter a consciência. Mas, quer saber, isso não importa, não mais. Agora, vamos dar um tempo até prosseguirmos para a próxima lição. E não vai ficar se achando só porque melhorou um pouco, caso não saiba, desde os meus 15 anos que não preciso mais recorrer aos selos mão. Isto não é nada demais.

Enquanto Ethan lutava para entender o que aquelas palavras realmente queriam dizer, ele fitava os arredores, observando sinais que indicavam que ele esteve ali, usando as suas habilidades. Olhando para os pedregulhos que ficavam a 25 metros à sua direita, via algumas crateras que lembravam os seus socos quando estavam sob a influência da sua Kekkei Genkai. Mais adiante, notava também alguns bonecos de treinos completamente retalhados. E não muito longe dali, ainda conseguia ver algumas pedras dispostas como se fossem obstáculos em um circuito, mas não tinha muita certeza daquilo, já que eles estavam deteriorados demais para revelar algo.

Conforme analisava a cena diante dos seus olhos, o garoto ainda não conseguia dizer como tudo aquilo foi possível. Todo aquele estrago tinha sido feito por ele, não restavam dúvidas quanto a isso, mas como? Como poderia ficar de pé, andar, atacar, usar jutsus e enganar o avô se estava inconsciente? À medida que refletia sobre o ocorrido, a sua cólera cedia, não restando qualquer sinal dela minutos depois. Tudo que restou para Ethan após essa revelação foi uma expressão de medo no rosto, temendo que aquilo voltasse a acontecer.

Oliver, por sua vez, tentava desvendar as feições do neto, reparando em todas as nuances presentes em seu semblante. Ethan nunca foi fácil de decifrar com aquele olhar morto no rosto, o velho sabia disso, mas mesmo assim não viu problema algum em tentar. Se existia alguém que tinha chance de conseguir a proeza, era ele, ninguém havia passado mais tempo na companhia do garoto do que ele. No entanto, todas as suas tentativas não tiveram efeito. Por isso, depois de algum tempo, daria as costas e começaria a andar sem um rumo, dando algum tempo para Ethan, já que o mesmo aparentava estar mal.

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