2023:

2024:

A visita à biblioteca me agrada, como sempre. Saio de lá com o pergaminho de ninjutsus básicos sem muita noção de onde ir depois. Não aprendo desse jeito desde a Academia, penso, com certa nostalgia amarga. Tinha estado tão focado em aprimorar meu desempenho físico que estava até me esquecendo do prazer que sempre tive em me dedicar aos pergaminhos. Ler atenciosamente, memorizar detalhes, decorar selos de mão. Era desse jeito que eu funcionava, e ainda assim, parecia um cenário tão distante.

Decidi por estudar próximo do mesmo campo aberto que eu utilizava para o desenvolvimento de stamina e velocidade. Envolto em clareiras menos acessíveis do vilarejo, sua vegetação parasítica descuidada era espanto o suficiente e a garantia necessária para um tempo solitário. Porém, a garoa fraca que cai naquela manhã, envolvida com a névoa habitual, me faz buscar abrigo em um casebre de ferramentas próximo.

Sob aquela proteção, então, inicio o treino. O controle de chakra é uma dificuldade nada recente no meu cotidiano, e a lentidão em realizar os selos também não é nenhum auxílio. O grande problema é que não me bastaria apenas o conhecimento teórico das técnicas; a composição shinobi só funciona graças ao ecossistema de habilidades de um ninja. No meu caso, há muitas dificuldades a serem cobertas, penso. A velocidade e a capacidade física não são o meu forte — apesar de eu ter ultrapassado o caráter vergonhoso de minha formação da Academia graças às missões recentes, mas, ainda assim, não há nenhum destaque. O meu interesse no combate, portanto, sempre flutuou para as técnicas de longo alcance e as ilusórias como sendo minhas últimas alternativas de garantir uma vitória.

Em meus estudos, chego então no grande tabu: a técnica assinatura dos Hōzuki, o Suika no Jutsu. Dominá-lo sempre fora uma grande batalha. Até então, eu nunca o tinha usado em lutas, apenas de forma holística: liquefazendo meu corpo enquanto nado no mar e sinto-me mesclando com as marés. Nada disso me salvaria numa luta. O que me vale, então, carregar aquele sobrenome? Preciso me dedicar mais, me obrigo a pensar. As lendas piratas que tanto me fascinavam enquanto criança não valeriam de nada se eu sequer fosse capaz de utilizar a técnica mais básica que possuímos.

A torrente cai mais forte lá fora, as grossas gotas de chuva fazendo um barulho grave no telhado do casebre. Decido usar aquilo ao meu favor: abro a janela e inicio pequenas tentativas de manipulação de Suiton, minha maior e única afinidade elemental. Tomo o cuidado de trabalhar com poucas partículas daquela natureza, ou então me chakra se esgotaria com muita rapidez. A atividade é até revigorante. O balançar das gotículas, sua fluidez e versatilidade, a aparente fragilidade disfarçando um potencial caótico... era como um microcosmo do que eu esperava alcançar com minhas habilidades de ninja.

Minhas energias se esvaem, enfim, após todo o treino. A chuva ao menos está pouco torrencial quando finalmente recolho minhas coisas e saio do casebre de volta para a biblioteca — tomando o cuidado para proteger da água o pergaminho a ser devolvido.

Se o corpo não serve, penso, a mente servirá. Era um bom mantra, mas que infelizmente não se traduzia em instruções claras. Aquele treinamento seria um pouco usual, pois não havia um pergaminho específico para o assunto. Tudo o que me motiva é minha recente missão no vilarejo dos redemoinhos, o desejo de afiar a mente e a capacidade de desvendar ilusões.

Decidi que dividiria desta forma: primeiro, a percepção de ilusões — um bom exemplo era o Henge no Jutsu que utilizei para alcançar nosso objetivo; em segundo, eu deveria treinar a colocação e identificação de armadilhas — meu trabalho de campo não era dos melhores, mas era algo necessário em uma vida shinobi devido as contínuas viagens para fora do vilarejo; analisar o terreno e usá-lo ao meu favor.

Durante o primeiro ponto a ser coberto, estudo bastante o que facilitava a identificação de uma técnica ilusória. Felizmente, a arte dos Genjutsus me era uma aptidão favorita. Se eu tivesse a habilidade sensorial, o Kanchi, claro, seria ainda mais útil; captar variações de Chakra ainda era um conhecimento avançado demais para o meu nível. Ainda assim, prossegui com os estudos dedicados. Meu próprio exemplo, no caso da técnica de transformação, possuía algumas falhas visíveis. Me criticar é mais fácil, penso, assim identifico os erros que cometi e o que posso melhorar. Meu grande trunfo foi usar a atuação para complementar a aparência que assumi, o que em nada me protegeria caso houvesse contato físico — a técnica viria por água abaixo. E como identificar mesmo sem esse contato? Analiso e estudo todos os métodos preventivos: pequenos detalhes que uma transformação errônea deixa passar, variações contrapostas à luminosidade e afins.

Já o estudo de armadilhas segue de forma mais complicada. Não era viável compor meus próprios testes devido a falta de recursos, e também não havia um espaço livre para tal. Eu poderia usar o campo de treinamentos, de certo, mas seria complicado demais limpar o terreno e depois, correndo o risco de causar perigos para quem quer que fosse usá-lo em seguida. Acho melhor continuar na parte teórica. Decido então ir à biblioteca e vasculhar toda a documentação relevante que consigo encontrar. Por sorte, há uma seção modesta de pergaminhos de questões antigas da Academia. Testes estratégicos, cálculos físicos e estudos de campo... Perfeito. O que me resta, então, é analisar cada questão com cuidado, repassando as respostas para um gabarito pessoal. O trabalho acaba sendo dobrado pois não posso danificar os pergaminhos a serem devolvidos, então acabo tendo que redigir tudo uma segunda vez. No fim, isso é um auxílio: reescrever as questões me ajuda a memorizá-las melhor e a analisar ainda mais seus pormenores.

Com os cálculos finalizados, após absorver tudo o que consigo extrair dali, sigo rumo para devolver os pergaminhos à sua seção contida e mantenho minhas próprias anotações.

Quão complicado pode ser memorizar selos? Bastante, eu tinha aprendido com o tempo. A dificuldade não estava necessariamente ligada à estrutura dos selos de mão — apesar de alguns símbolos serem relativamente complicados e levarem um tempinho para serem aprendidos —, mas na agilidade em fazê-los e trocar de um para o outro. O símbolo do Cão era considerado fácil, por exemplo, mas inserido em uma sucessão rápida entre o de Cavalo e o de Lebre, era comum me embolar e até torcer os dedos.

Era curioso que aquele fosse o método mais comum de canalizar Chakra em prol de realizar uma técnica. Já tentei cronometrar minha velocidade antes: consigo fazer vergonhosos dois selos por segundo. No caso de técnicas mais elaboradas que exigiam até cinco símbolos, todos os preciosos instantes desperdiçados naquele preparo podiam lhe custar a vida no campo de batalha; eu sabia bem. Sacudo aquele pensamento obscuro que me leva de volta ao deserto de Suna e prossigo com o estudo do velho pergaminho.

Dedico boa parte do meu treinamento na memorização e agilidade dos selos mais complicados na minha concepção, e são eles: o focinho de dedos de Dragão, a sutileza do Pássaro, e o já mencionado selo de Cavalo, que requer determinado equilíbrio entre as articulações dos dedos. Minha maior dificuldade se encontra na variação rápida entre esses símbolos — me embolo assim que preciso trocar entre eles. Mas não desanimo; quando erro, repito a sequência novamente, sem desistir.

Quando consigo repetir os três sem tantas falhas, me direciono ao próximo passo: intercalar com os símbolos mais simples. Não demora para eu perceber que aquela estratégia fora uma boa ideia. Depois de memorizar a essência dos símbolos mais complicados, dividi-los entre os fáceis torna a sucessão mais tranquila. Não posso deixar a base de lado, entretanto. Apesar de serem mais simples de realizar, reconheço que também é importante memorizá-los para não causar problemas em momentos de necessidade. Dentre esses, meus favoritos são: o selo do Macaco, com as mãos em união tal qual um cumprimento; o da Cobra, com os dedos entrelaçados em uma posição bem cômoda; o do Javali, com as "garras" viradas para baixo; e, por fim, o selo do Cão, posicionado de forma que uma mão "massageia" as costas da outra.

Ao final do exercício, realizo mais algumas sequências de repetição de todos os doze selos básicos. Me certifico de, independente da velocidade em que os realizo, garantir que consigo fazê-los corretamente. O importante era memorizá-los em seu formato certo para gerar uma boa canalização do Chakra. De novo, existe um conjunto deles com o qual tenho certa dificuldade em realizar com rapidez — mas ao menos a forma está boa. Quando finalmente me dou por satisfeito nesse quesito, encerro meu treinamento.