Os olhos pesavam de uma maneira estranha, como se todo o corpo estivesse sob efeito de medicamentos pesados. Era de se esperar, estando em um hospital, mas a falta de voz e força me fez entrar em desespero. A luz estava fraca no quarto, e não havia ninguém. Pela pequena abertura entre as pálpebras notei que o quarto era escuro, iluminado por algumas poucas velas presas na parede. Estava sem entender o que era tudo aquilo, até alguém entrar no cômodo com um sorriso largo. —‌ Hora hora, então ele acordou. Finalmente, posso usá-lo como bem entendo. ‌—‌

Várias perguntas começaram a aparecer em minha mente. Como fui parar ali, quem era aquele homem, como conseguira me tirar de dentro do hospital? Aos poucos tudo começava a fazer sentido. ”Não há quase ninguém na vila!” Naquele momento, ao pensar isso, não foi o medo que tomou conta de mim.

—‌ O… que… ‌— As palavras não saiam dos meus lábios, estava mesmo completamente dopado por alguém desconhecido. —‌ Ah, não tente falar, você não vai conseguir. Preciso que esteja acordado, mas não precisa estar se movendo. Vou aproveitar que seu corpo é imortal, para conseguir o que desejo. Quero ver até onde consegue ir. ‌—‌ Com seu sorriso maléfico, o homem puxou uma seringa. A agulha tinha o tamanho do meu antebraço, com uma espessura nada chamativa. —‌ Vamos lá! ‌—‌


Os olhos ainda pesavam, o corpo não tinha força para usar chakra ou se mover. Me perguntava se alguém apareceria para me ajudar, e torcia para que isso ocorresse o mais rápido possível. Embora fosse imortal, ainda sentia dor. O remédio entorpecia meus sentidos e inibia o uso de chakra, mas não me impedia de sofrer com a dor. Gritava a todo o momento quando o homem arrancava parte da minha pele e injetava líquidos estranhos em minhas veias, como se aquilo fosse mesmo uma tortura.

—‌ Que lindo. Você realmente tem um poder incrível. Olha essa regeneração. Vou poder usar isso na minha pesquisa. ‌—‌ As lágrimas não paravam de escorrer involuntariamente pelos olhos que mal se abriam, mas que conseguiam ver o rosto do homem em um borrão. —‌ Bom, agora vou te deixar um pouco. Aproveite para descansar, logo volto. ‌—‌

O homem deixou uma seringa presa em meu braço, tirando parte do sangue que corria por minhas veias. Não conseguia ver seu rosto para tentar reconhecê-lo, nem mesmo seria possível sair dali no meu estado atual. Queria que alguém me ajudasse a sair das mãos daquele maluco, mas como? Tentava mover o corpo, mas nada acontecia. Pensei que já tinha visto todo o mal do ser humano, mas as ações daquele homem me mostraram que havia muito mal para ser descoberto.


Por mais cansado e sem forças que estivesse, a visão começara a clarear conforme os dias se passavam. Logicamente não conseguia saber se era dia ou noite, e quanto tempo tinha se passado desde a minha chegada ao hospital após o combate no castelo. A esperança de alguém me salvar se esvaia como o brilho da minha própria alma diante de tal situação, passando a aceitar aquele destino tenebroso como o meu futuro e presente, assim como parte do meu passado.

—‌ Ah, que bom que está acordado. Pelo visto está bastante fraco. Acredito que tenha que comer algo. ‌—‌ Aquele sorriso me enojava e me irritava de uma forma inexplicável e imensurável. Se não estivesse naquele estado, certamente fincaria uma kunai em seu coração. —‌ Me deixe em paz. ‌— Naquela altura já conseguia pronunciar uma pequena frase, antes de perder o fôlego e quase desmaiar. —‌ Ohh, mas para que tanta falta de educação. Sabe, seus pais não te educaram bem, pobre almas. Devem estar bem onde estão agora. ‌—‌ Aquela sensação, como eu havia esquecido.

As palavras ditas sobre os meus pais me encheu de fúria. A adrenalina percorreu todo o corpo e por um segundo consegui ver um pouco melhor o rosto do homem, embora as sombras me impedissem de reconhecê-lo. —‌ Ah não não, nem pense nisso. ‌—‌ Ele percebeu que o remédio estava perdendo seu efeito, e por isso correu para injetar um outro líquido na seringa que estava presa ao meu braço. —‌ Deixe de ser estressado, apenas disse a verdade. ‌—‌


Todo aquele tempo recebendo medicamento fez com que meu corpo se tornasse resistente. Passei a sentir os movimentos dos braços e das pernas, por mais fracos que fossem. No entanto, ao perceber que o corpo ganhava resistência aos remédios, também entendia que o homem não podia saber sobre isso. Aquele era um momento importante, poderia descobrir quem era aquele ser maléfico que me mantinha preso.

Embora estivesse sozinho, algo estava estranho. A sensação dos movimentos do corpo não era a única coisa que sentia. Havia outra coisa, algo bem lá no fundo, algo que não sabia explicar. Havia algo diferente, uma energia poderosa percorrendo meu corpo. Junto a isso também notei que as feridas não mais se regeneravam, como se eu tivesse perdido o poder de cura de Jashin. Aquilo me deixou com mais raiva ainda, mas ao mesmo tempo confuso. Havia feito algo que desagradou ao deus da morte? Algo que o fez me largar? Perguntas que não seria respondidas.

—‌ Ora ora, já está acordado. Muito bom, agora posso continuar. Vamos ver como está. ‌—‌ Esperava que ele se aproximasse logo de mim para que a luz da vela mais próxima iluminasse seu rosto. A ansiedade aumentava, e quando finalmente vi sua face, tremi. Aquele homem era da família Greyrat, basicamente era um primo distante da minha mãe que a muito tempo queria ser líder da família.

Minha mãe era a próxima a se tornar líder, e isso sempre o deixou com raiva. Mesmo assim me mantive quieto, fingindo estar paralisado pelo remédio. Não dava sinais de que conseguia vê-lo, até ele tentar injetar um outro remédio. —‌ Ah não, sério que não está se curando? O que houve? Será que forçar você a despertar sua habilidade interferiu na sua regeneração? ‌—‌


Diante da situação em que me encontrava, precisei reagir com a maior calma. O outro Greyrat havia percebido o que tinha acontecido comigo, vendo que talvez não precisasse mais das minhas amostras. De acordo com o que ele tinha falado, sua tentativa de liberar um fator genético adormecido em meu DNA foi a causa da perca da imortalidade. Ele sabia que eu era o último Greyrat da linhagem de minha mãe, o que me tornava mais propenso a ser o líder da família do que ele. Foi isso o que fez com que tentasse algo contra mim.

Pelo horário que ele havia falado o dia já tinha virado de um para outro. Estávamos de noite pelo que percebia. Até então comecei a pensar, vendo que era possível estar em algum ponto na casa daquele homem. Havia recobrado boa parte dos sentidos, além do controle sobre o corpo. Ele não sabia, o que o faria perder tudo.

Conforme os minutos se passavam comecei a notar que conseguia cristalizar a matéria com o meu chakra, algo que nunca tinha feito antes desde então. Por mais que fosse em pequena quantidade devido ao meu estado físico, seria o bastante para fugir. Usei isso ao meu favor quando cristalizei as amarras que me mantinham naquela maca. Como não havia ninguém ali, não foi difícil sair. O mesmo aconteceu com a fechadura da porta, que logo se abriu. Estava em um corredor escuro, me apoiando nas paredes para conseguir andar.

Aos poucos comecei a ouvir uma discussão, tendo a voz do Greyrat falando alto com raiva. Ouvi passos mais à frente e uma luz aparecendo, fazendo-me esconder em uma outra porta próxima. OS passos passaram por onde eu estava e então aproveitei essa abertura para sair, logo pela luz que vinha no fim do túnel. Me deparei com um jardim extenso, por onde tentei correr até o lado de fora. Aquela residência ficava na parte mais afastada do centro da vila, onde geralmente os nobres ficavam. Me escondi em meios aos becos escuros e fui andando lentamente até o quartel general, justamente para alertar o que havia acontecido comigo.

Os guardas seguiram até a residência e prendeu todos os que estavam em seu interior. Estava claro que todos sabiam do que estava acontecendo, já que foram quem ajudou o outro Greyrat. Precisei voltar ao hospital para me tratar dos ferimentos e desgaste, realmente tendo a certeza de que havia perdido a minha imortalidade.

Fui informado que alguns ninjas médicos no hospital eram pagos pelo homem que me sequestrou, e foi assim que ele conseguiu me tirar dali. Felizmente esses foram expulsos e presos, não precisando me preocupar mais com toda a situação em que me encontrava. Estava exausto e confuso, mas descobrira que minhas habilidades era diferentes do que tinha quando fui derrotado no castelo. Para mim, precisava agora domar tal poder ao meu favor. Queria saber o que mais eu podia fazer com aquela habilidade, e somente treinando seria possível descobrir. Faria isso após sair do hospital, e até mesmo alertaria Toru sobre o ocorrido, assim que o mesmo chegasse a vila.

Considerações: