Três batidas na porta anunciaram a explosão subsequente. Pedaços de madeira voaram para dentro do cômodo, com uma nuvem de fumaça obstruindo temporariamente a visão. Enquanto ainda tossiam, abismados e incrédulos, uma Kaguya totalmente enfurecida cruzou pela batente, os olhos vermelhos faiscando.

— Ei, você não pode… — foi tudo o que o homem com a cara que lembrava um rato teve tempo de dizer, antes da genin socar um punhado de papéis na boca dele. Ela manteve a mão sobre seu rosto, com a ameaça pairando no ar.

— “Esses são legítimos Kan no Kami” — a garota disse em um tom de voz forçado, imitando caricaturalmente a voz do homem. — “Não se preocupe, são produtos de primeira”. PORRA NENHUMA!

— Kaguya?! — A mulher na poltrona conseguiu finalmente falar, após parar de tossir. — O que pensa que está…

A genin esticou a mão livre na direção dela, a olhando pelo canto do olho.

— Shiiiiii — sussurrou. — Não me obrigue a explodir o andar inteiro — então voltou sua atenção para o homem ainda em sua frente, que parecia incapaz de falar (e não só por ter a boca cheia de papel). — Quando eu disser que quero comprar Kan no Kami, você me vende Kan no Kami, e não essas porcarias de criança fazer desenho — algumas faíscas começaram brotar entre seus dedos. — Caso contrário, vai descobrir que tubulações de gás às vezes podem vazar, e explosões acontecem por acaso, meras fatalidades imprevisíveis.

Dito isso, ela foi embora. Não sem antes, é claro, pegar um punhado de legítimos Kan no Kami.



Um relâmpago cortou os céus, iluminando o terraço do prédio. Já era noite adentro quando Kaguya saiu para o ar livre, abrindo os braços para receber a brisa gélida em sua pele. Respirou fundo, enchendo os pulmões de ar. Tirou do bolso do casaco uma folha de papel de tom levemente amarelado, dedicando alguns instantes a contemplar aquilo.

Kaguya era – obviamente – um gênio. Ela havia despertado sua Kekkei Genkai, e junto a ela o domínio de duas Naturezas Elementais distintas. Em testes anteriores, caso concentrasse seu chakra para Raiton, o papel em sua mão iria amassar. Se fizesse o mesmo com Doton, ela iria se esfarelar, como se virasse terra. Era, portanto, um método simples, e cem por cento efetivo, de praticar a Seishitsu Henka, a Transformação da Natureza do Chakra.

Uma pessoa normal poderia olhar para ela e dizer: “Kaguya, você domina duas transformações de chakra e uma kekkei genkai, isso não é suficiente?”, e então ela responderia que era exatamente por pensar assim que essa pessoa imaginária era classificada como “normal” nesse cenário que ela estava criando em sua mente enquanto pensava isso. Não, não era suficiente. Ela, afinal, era  Kaguya, aquela que se tornaria a maior e melhor Cozinheira que esse mundo já viu. Por conseguinte, obviamente seria também a melhor ninja que esse mundo já conheceu, pois não existe função mais nobre e importante que a de uma cozinheira. E alguém assim nunca, jamais, poderia olhar para seu estado atual e pensar: “Ok, chega. Hora de descansar”.

Os olhos carmesim da garota órfã eram um prenúncio do que estava por vir. Seu sorriso fulgente, um aviso para o mundo. A garota era uma verdadeira prodígio no uso de Ninjutsus, de maneira que tinha uma ideia geral do que deveria fazer ali. Superaquecer o chakra era o caminho para transformá-lo na mais pura chama. Fechando os olhos, ela se recordou dos princípios usados no Raiton e Doton, tornando o chakra agitado e endurecido, respectivamente, e na maneira como combinava as duas transformações para produzir as explosões de seu Bakuton.

Concentrando-se em sua rede, Kaguya buscou reunir e amassar seu chakra dentro de si, comprimindo-o de maneira que sua temperatura se elevasse. Por quatro vezes, acabou gerando explosões involuntárias pelas mãos ou pés, deixando que o chakra escapasse. Até que finalmente, após terem se passado algumas horas, conseguiu sentir seu corpo se aquecendo contra o frio da noite.

Tomando um dos papéis em mãos, a genin se concentrou em enviar chakra para ele. Seus lábios se dobraram em um sorriso vitorioso quando as pontas do objeto começaram a fumegar, até que finalmente todo o material entrou em combustão. Mesmo cansada, tentou mais algumas vezes, até se dar por satisfeita. Com o básico dominado, agora só precisava partir para o próximo estágio: os jutsus de Katon. Mas isso ficaria para amanhã, pois ela precisava mesmo tirar um cochilo.

Observações: