A próxima missão de Musashi seria um pequeno desafio. Pelo menos é o que passava pela cabeça do rapaz. O pergaminho entregue ao ninja dizia que seria necessário fazer guarda no portão sul de Konoha, já que o guarda oficial não poderia ir e não havia nenhum outro ninja disponível. Konoha vivia uma época de bonança, então provavelmente nada ocorreria. Absorto nestes pensamentos, o jovem mal percebeu que já era o fim de tarde e sua missão já estava se aproximando. Rapidamente o jovem se vestiu e foi em direção ao portão sul da vila. Em alguns minutos, indo pelos telhados de Konoha, o jovem de cabelos escuros e semblante profundo diz ao único ninja que estava no posto.

- Uchiha Musashi se apresentando para o serviço, senhor.

O tom militarizado pareceu apropriado para a ocasião. Musashi foi recebido pelo ninja que o colocou de guarda do lado de fora do portão. O jovem rapaz nunca tinha enfrentado aquela situação e... suas lembranças de Konoha não eram as mais pacíficas. De lá veio o renegado que matou Koji. Mas esses pensamentos logo foram afastados pelo garoto que se punha atento ao seu redor. Tudo estava tão silencioso e calmo que Musashi se permitiu admirar o que havia ali pela primeira vez.

As árvores que o cercavam, os grilos e corujas que faziam seus barulhos noturnos. Mas nada foi mais impactante que a imagem da lua sobre aquele cenário. Enquanto estava perdido no feitiço lançado pela lua, uma moita se moveu abruptamente. Musashi se atentou e confirmou que não havia vento ali. O rapaz logo se preparou para reagir. Da sombra da floresta vieram um casal de coelhos correndo. O jovem ninja suspirou e relaxou. No entanto, logo se armou de novo ao perceber que algo maior vinha atrás. Quando Musashi percebeu que era um lobo e que ele estava realmente focado nos coelhos, relaxou novamente. E incidentes como este foram os únicos que ocorreram ao longo de toda a noite.


No dia seguinte, pela manhã, Musashi se aproximou do supervisor que havia feito guarda de cima da torre e reportou por questões protocolares:

- Nenhuma ocorrência ao longo da noite, senhor.

- Certo Musashi... Eu... Tava ali em cima. - disse o supervisor estranhando aquela postura do ninja - Eu vi que não aconteceu nada. - num suspiro desinteressado o ninja mais velho concluiu - Pode ir, Musashi. Já acabou nosso turno. Eu espero a próxima guarda chegar.

Musashi achou aquela postura estranha. Mas isso pouco ficou em seu pensamento, já que estava indo em direção à sua casa e sonhava com a cama quentinha na qual poderia dormir pelo resto do dia. Ou não.

A missão para qual fui convocado hoje era bem longe do que imaginei que um ninja deveria fazer e do que os professores – que só falam das batalhas e das grandes guerras – jamais me contaram: eu seria o quebra-galho de um escritório administrativo por um dia. Isso me soava bastante esquisito mas... Vamo lá, né. O Hokage mandou. Rapidamente me visto e saio de casa às 8h30 da manhã. Meu horário era às 9h00, e iria até as 18h. Em poucos minutos de caminhada cheguei no escritório. Logo na entrada vi uma pilha de caixas bem ao lado da porta principal. Me causou estranhamento porque aquilo feria a apresentação da empresa. Ignorei o fato e me apresentei.

- Bom dia. Sou Uchiha Musashi, sou o ninja que vocês requisitaram hoje.

- Oh meu jovem! Vem cá! Que bom que você chegou, hoje temos pouco serviço. Assim que você terminar, você pode ir, beleza?! No máximo 16h você tá indo pra casa! Missão mole essa!! – Disse um senhor gordinho e risonho. Acredito que fosse o chefe naquele lugar.

Acenei com a cabeça e me aproximei do senhor que me contava quais seriam minhas tarefas da manhã. Entre elas estavam: pagar contas no banco, levar alguns documentos em três pontos distintos de Konoha, varrer o escritório – que tinha algo em torno de 700m², pedir e buscar o almoço de todos os funcionários. Isso, para a manhã. Se aquilo era um dia tranquilo, não quis saber como seria o dia atribulado. Além do mais, porque diabos pediriam uma ajuda ao Hokage para um dia “de pouco serviço”? Aquele gordinho não me enganava. Conhecia esse tipo. De longe.

Deixei meu kimono guardado no canto da sala e comecei por varrer o escritório, depois fui ao banco e em seguida levar os documentos. Estava voltando para o escritório por volta das 13h e o gordinho já não estava tão risonho:

- Poxa, Musashi. Você se atrasou pra pedir comida pro pessoal! Vem, vem, vamos pedir comida.

Me apressou. “Comida pro pessoal”, entendi. Tudo bem. Fizemos o pedido e, pra minha surpresa, o meu estava incluso. Fui buscar a comida, por volta das 13h30 e, quando cheguei, entreguei a comida a todos. Fui me sentando pra comer e o senhor falou comigo:

- Musashi, são 14h. Seu horário de almoço já foi, e ainda temos um bando de coisa pra fazer.

- Sim, mas eu estava resolvendo as c—

O senhor me cortou jogando um amontoado de pastas na mão. Me mandou organizar todas elas, de uma maneira específica. Quando eu acenei minha compreensão ele apontou pro restante das pastas que teriam que ser organizadas. Era uma mesa com duas pilhas de pelo menos meio metro de documentos. Mas, se fosse só isso, eu estaria bem. O senhorzinho gordinho bonitinho saído do inferno me pediu pra colher o pagamento de todos os clientes em aberto – cerca 40 espalhados por Konoha, limpar os dutos de ventilação – por dentro, instalar os móveis dentro daquelas caixas que vi mais cedo – sim, eram móveis para instalar – e, a cereja do bolo: ele pediu que eu lavasse a louça de todos os copos, pratos e talheres sujos pelos funcionários naquele dia. Tanto os do almoço, como todos os copos que usaram para café ao longo do dia e uma coisa era certa – aquele pessoal não gostava de copo de plástico.

Bufei de raiva e parti pros afazeres. Com fome. Mas, sem dar um pio, eu fui fazendo as tarefas, uma a uma.  Organizei as pastas, limpei os dutos, fui recolher os pagamentos e voltei pra instalar os móveis. Terminei essas tarefas às 18h10 minutos. Suspirei aliviado e me dirigi ao gordinho.

- Senhor, já deu meu horário. A única tarefa que ficou por fazer foi a louça, mas o ninja de amanhã assume isso, certo?

- O que? – de repente o senhor gordinho, risonho, engrossou o caldo – Você enrola o DIA TODO, e agora vai embora sem SEQUER terminar todo o serviço?! O Hokage precisa saber disso. Konoha não faz mais ninjas como antigamente!!!

- Mas senhor, já deu meu horário e eu nem almoç - fui interrompido

- Eu vou ter que reduzir o seu pagamento, meu jovem!!!

Repentinamente, senti uma coceira na cabeça. Num ponto bem específico. Uma coceira aguda. Nomeei essa coceira de... Ódio. Fuzilei o senhor amaldiçoado com profundidade e recolhi os 3 copos que só ele havia usado naquele dia. Passei pelo escritório recolhendo as louças e levei para a pia. Lavei tudo com algum cuidado, mas o cansaço já não me permitia executar aquela tarefa no máximo de eficiência. Era tanta louça que só terminei de lavar tudo às 19h30. Fui em direção à sala do chefe me reportar:

- Tudo pronto. Estou me retirando. O senhor sabe onde botaram a minha comida? – indaguei, esperando pegar minha comida e matar minha fome o mais rápido possível. Eu só havia me alimentado pela manhã.

- Ah, o meu filho apareceu aqui logo depois que você saiu pra resolver as coisas e ele não tinha almoçado ainda. Como você não quis almoçar aquela hora, acabei dando a comida pra ele. Achei que estaria tudo bem pra você.

- Eu... – não era comum eu me sentir daquela forma – EU... – elevei a voz – EU NÃO QUIS COMER?!?! VOCÊ ME ENCHEU DE COISA PRA FAZER, DIZENDO QUE MEU HORÁRIO DE ALMOÇO JÁ TINHA PASSADO!! – gritei com o cliente. Desculpe, Hokage-sama. Mas não deu pra aguentar. – VOCÊ ME SEGURA ATÉ DEPOIS DO HORÁRIO, ME FAZ TRABALHAR COMO UM BURRO DE CARGA, ME DEIXA COM FOME E AINDA FAZ AQUELE SHOWZINHO QUE FEZ AGORA POUCO?! – dei dois passos em direção ao gordinho que agora se parecia com um neném. Um daqueles que tinha sujado a fralda. – Grrrh!!!

Rosnar foi a coisa mais racional que passou pelo meu cérebro aquela hora. Com um movimento abrupto eu peguei meu kimono dobrado e saí pisando firme, bufando de raiva. O gordinho ainda tem a pachorra de dizer:

- Você trabalha muito bem, menino!! Será um grande ninja!!!

Na minha cabeça só passava: “Se eu for bom mesmo, eu juro que eu volto aqui e te estrangulo, seu miserável”. Eu sou uma pessoa pacífica, serena. Mas também não tenho nenhum nervo de aço. Demoro pra perder a compostura mas... Bom, a gente viu o que acontece quando eu perco. A caminho de casa, ou melhor, de um restaurante (pra poder me alimentar finalmente) eu fui me acalmando e sendo tomado pela tristeza de estar com fome. Depois que me alimentei, fui pra casa descansar. Antes de pegar no sono eu decidi: eu nunca mais trabalho praquele desgraçado.