Já não era a primeira vez que Shiroi levantava no meio da noite, suando frio, com as roupas ensopadas e o colchão encharcado. Parecia que tinha acabado de manipular uma técnica aquática de alto nível em cima de seu dormitório, quiçá tivesse jogado um balde cheio d´agua, mas não, era simples e puramente suor de nervoso, um nervoso que era submetido há, no mínimo, cinco semanas, contando a partir de seu último encontro com Takagi.
Como amigo de longa data do rapaz que desenvolvia aparatos envolvendo grande complexidade tecnológica para o vilarejo, Shiroi ajudou-o na produção de um novo armamento, uma espada baseada nas lendas, portada por importantes guerreiros que conquistaram reinos brandindo a lâmina. Esta empreitada necessitou um grande estudo sobre sociedades da antiguidade, e por conseguinte, a busca por livros sobre estas. Takagi, gênio, observava as técnicas de kenjutsu passadas pelos ninjas presentes na Era dos Estados Combatentes, enquanto o Jonin da Folha corria atrás de informações sobre um reino: Camm, de onde as histórias e registros contavam sobre guerreiros lendários e... uma espada em particular.
No mundo dos sonhos, já nos braços de Morfeu, encontrava-se jogado à base de uma estrutura colapsada com traços que não conseguia distinguir se eram rachaduras ou traços arquitetônicos. Sentia tudo em primeira pessoa, o que tornava a experiência mais vívida. Sentia dor, muita dor, um ardor afetava-lhe a perna, e ao observá-la, uma vergão tomava conta da coxa direita. Podia ver fios do próprio cabelo ensopado caindo-lhe pelo rosto, e embora invés de negros como de costume, tinham uma cor dourada que contrastariam na tez suada da cabeça. À frente, um homem de cabelos vermelhos, trajado em uma armadura de corpo inteiro extremamente incomum de coloração azulada, vociferava para um inimigo manchado por uma sombra. O último momento do sonho que se repetia por todas as noites era da espada do sombrio opositor atravessando a armadura de ponta a ponta, fazendo o sangue verter pela ferida e jorrar a ponto de manchar a visão do garoto em rubro, assim como substituir a cor da proteção. A aparência demoníaca do inimigo era a última coisa que conseguia enxergar antes de acordar desesperado por mais de uma vez. Tinha a face coberta por o que parecia uma mistura de tintura preta sobreposta com uma tintura branca, cujo padrão remetia instantaneamente a uma caveira.
No último dia, Shiroi passou o dia meditando sobre a situação. O livro sobre a família dominadora dos Fuinjutsu lhe pareciam ter desperto algo, e a imagem que lhe tomava os sonhos – ou pesadelos – era a mesma que estava registrada em uma das páginas principais de sua leitura. A arquitetura de Camm era idêntica a de seu sonho, incluindo as marcações nas estruturas que não eram identificáveis, e provavelmente tratava-se de um traço inerente ao reino.
Porém, o que o intrigava eram as visões. Poderia o ninja assumir uma persona de um velho morador do vilarejo atacado por um dos inimigos-caveira? Tudo era muito estranho e gerou uma intenção investigativa em seu próprio coração, que o compeliu a tomar como direção o Reino de Camm sob autorização do grande escalão da vila.
Cruzou a floresta com o sonho na cabeça, repetindo mentalmente passo a passo a fim de conseguir qualquer informação que o ajudasse, e agora prestando mais atenção, podia perceber alguns símbolos circulares que se repetiam nas roupas e nas estruturas, perpendicularmente às inscrições ilegíveis. Precisou passar a noite no mar, em um navio que partia para Camm, e mais uma vez o sonho veio à tona. Acordou mais uma vez ensopado, mas desta vez uma nova nuance tomava o ambiente.
Seu cabelo descoloriu. Além de ensopado, o colchão em que dormia estava preenchido com padrões em um tom negro, como se tivesse diluído uma forte tinta escura em poucas quantias de água. Repetiu o processo de sempre e entrou abaixo do chuveiro apenas para descobrir a fonte da negritude: seus próprios cabelos, ao passo que a tintura descia e cobria seus olhos, manchando o rosto e o peito. Desesperou-se momentaneamente, e esfregou-se até a tintura parar de verter.
Direcionou-se imediatamente para um espelho, e se deu conta de que estava no escuro. Procurou um interruptor tateando os lados atento, até esbarrar no mesmo por um descuido e deparar-se consigo mesmo. Louro.
Shiroi correu em disparada para o convés e encontrou-se com o capitão, que estranhou a nova cor de cabelo do tripulante, embora não tivesse realmente comentado a mudança brusca. A indagação do local era respondida com o nome que esperava: Baía de Uzushiogakure, estavam próximos do ponto em que atracariam o barco para que desembarcassem na manhã seguinte. Shiroi ficou zonzo, um zunido tomou conta de seus ouvidos e quando menos se deu conta estava estirado no chão, incapaz de se mover, observando o profundo céu estrelado.
━━ Muito bem... ━━ Ouviu do além, uma voz retumbante em seus ouvidos. ━━ Não se desespere, criança. Infelizmente, você faz parte de um plano, e eu sou o culpado disso. Peço que, por favor, não ignore minhas palavras. ━━ Soou o homem. O tom de voz lhe soava estranhamente familiar, embora fosse impossível mensurar sua origem. ━━ Este selo de transcrição é uma espécie de gravação, então não tente me responder. ━━ disse. ━━ O homem que você vê morrer em seus sonhos... bem, este sou eu. Morri para protegê-lo. ━━ Falou brincando, embora o tom fosse melancólico e a voz de choro fosse predominante. ━━ Agora... ouça bem com atenção.
━━ Você é um bastardo. Sim, um bastardo da família Pendragon de Camm, uma ramificação antiga dos Uzumaki de Uzushiogakure. ━━ Revelou. ━━ Suas técnicas, a origem que você pensa que conhece de si mesmo... é uma mera ativação de seu cérebro por meio de minha técnica de vedação especial. Ela só seria quebrada se você se aproximasse de nosso lar, e bem... aqui estamos: arredores de Camm. Seu pai é um homem importante, o Rei de Camm, para ser mais exato. Ter um filho bastardo seria a pior das coisas que lhe poderia acontecer, então você me foi confiado, um grupo diferente ao dele. Quando morri, deixei um selo que ocultaria sua verdadeira identidade, e meus companheiros lhe levaram para um exílio no País do Fogo. Você estava com seus cinco anos, este é o motivo de não haver lembrança alguma. E... eu só espero que esteja tudo bem, Uthred.
Paralisado, era impossível de mover um centímetro do próprio corpo, grande parte disso em fato de sua cabeça estar girando à toda com o expurgo e a liberação da técnica de vedação do homem em sua cabeça. Como alguém poderia ter tantas informações? As memórias começavam a voltar e tudo era muito vívido, ao passo que as lembranças de sua infância como um Yuki começavam a desvanecer a ponto de se tornarem apenas uma vaga memória do que realmente estava acontecendo. "Um bastardo d...", era isso que se tratava sua identidade. ━━ Aconteça o que acontecer... ━━ soaram as últimas palavras do homem. ━━ Não se esqueça de seu nome, Uthred Pendragon, filho de Uther. ━━ o discurso emotivo parecia ter chego a um fim, mas mais uma vez a voz vociferou. ━━ Esqueça técnicas de gelo. Quando estiver pronto, volte para casa. Vá para Camm.
━━ Shiroi. ━━ repetiu baixinho. A voz lhe faltava à garganta, agora seca como um pedaço desértico. Estava de olhos fechados, e os abriu-os para deparar-se com a lua, cuja iluminação natural lhe ofuscou a visão. Sentia um enorme aperto no coração, embora jamais pudesse ter certeza do que havia acontecido. Sabia, sim, dentro de seu coração, encontrando-se profundamente com os próprios sentimentos que cada palavra se tratava da mais pura verdade contada a ele por um ente querido do passado, o qual não era possível recordar o nome pelo borrão que preenchia a própria mente. A energia se esvaía de seu corpo e o ninja da Folha já não se sentia capaz de sequer manter-se de pé. Ele estendeu a mão e manipulou o próprio chakra - ou o pouco que restava - para expô-lo à natureza na forma que aprendera desde criança. E nada aconteceu. Como último movimento de suas energias, jogou-se contra o chão do convés do navio. Sentiu a dureza da madeira que compunha o solo, e então entregou-se à falta de energia.
[...]
Mais uma noite fora preenchida com sonhos estranhos, principalmente o último que tivera. Ajudara seu amigo, Takagi, a realizar um grande experimento e dava continuidade a um sonho antigo que o atormentava, provavelmente agindo como uma resposta a seus pensamentos recentes, incluindo uma ida a um reino antigo. Tudo parecia não passar de um grande fruto da própria imaginação estimulado pelo próprio anseio. Para ele, seria loucura ele renegar a própria linhagem. A cama do Jonin, como de praxe, estava ensopada, e decidiu tomar um banho para poder retornar a dormir.
Os olhos de Shiroi marejaram quando observou a si mesmo no espelho, quando e uma mecha de cabelo, outrora presa na sobrancelha, pendeu pelo rosto. Estava igualmente ensopada em suor, nascido dos pesadelos. Tratava-se de uma mecha dourada. Uma mecha dos Pendragon. O Dourado... de Camm.
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