Inazuma havia acordado muito cedo naquele dia, seria um típico dia frio de inverno no ano de 20DG, se não fosse aniversário do garoto. O jovem Hoki estava completando 7 anos, mas ele não se empolgava tanto com aniversários, mesmo sempre fossem dias especiais e aquele, com certeza, Inazuma jamais esqueceria. A família tomou o café da manhã todos juntos e todos pareciam animados.

Saori: Vou precisar trabalhar hoje, Inazuma, mas no final da tarde eu já voltarei para casa e nós podemos fazer o que você quiser. - Explicou a mãe, quase como se estivesse se desculpando por não poder passar o dia com o filho, mas ela tinha um trabalho importante e o jovem sempre compreendia isso.

Dégel: Você pode passar o dia, ou uma parte do dia comigo, ver um pouco do que eu faço, me ajudar também se quiser. - Disse o pai tentando conter a animação, afinal o filho nunca demonstrou interesse nas tarefas do pai, mas este entendia, afinal era só um comerciante, não tinha nenhum segredo em seu trabalho, o oposto da Saori.

Inazuma olhava para os dois, ainda na dúvida, mas não queria ficar o tempo todo sem fazer nada, por isso acabou concordando em passar um tempo com seu pai e conhecer mais do seu trabalho, do seu dia a dia.

-Eu vou com você pai, agora de manhã mesmo, não tenho nada planejado para hoje, e até hoje eu não conheço muito do seu trabalho.

A falta de empolgação não era algo que Dégel viu como ruim, aquele realmente era o jeito do jovem, sempre mais controlado. Saíram então todos juntos, mas ao decorrer do caminho Saori seguiu seu rumo até o Hospital da vila e Inazuma foi com seu pai para a loja da família. Durante o caminho notaram algumas estátuas, cofres e paredes pintadas, mas não sabiam o que havia acontecido. Dégel era um pequeno comerciante de móveis dos mais variados tipos, tinha uma loja localizada bem no centro da vila, e lá vendia os móveis que ele mesmo fabricava, e por ser um excelente marceneiro sempre recebia elogios pelos seus trabalhos, além de possuir muitos clientes. Os dois foram conversando pelo caminho até chegarem na loja. Inazuma iniciou uma limpeza enquanto Degel preparava as ferramentas para criar mais móveis. Sempre quando não havia clientes o homem passava o tempo criando e montando novas peças, para as mais variadas funções, desde mesas simples até prateleiras enormes e entalhadas. Para o jovem Hoki era entediante, e o pai já havia percebido.

Dégel: Eu sei, deve ser extremamente chato pra você, não é? Ficar o dia todo sem fazer nada, esperando clientes.

- Desculpa, pai, mas é calmo demais até pra mim. Você gosta mesmo de fazer isso? Ficar criando móveis para outras pessoas, que talvez nem liguem tanto? - Foi direto ao assunto, mas sem querer parecer desrespeitoso, falando calmamente e sem transparecer nenhum desdém em suas palavras.

Dégel: Todo trabalho tem seu valor, meu filho. Esses móveis com certeza são úteis para alguém, satisfaz alguma necessidade em sua casa ou trabalho. - Disse o pai, um um leve sorriso no rosto.

- Perdão, pai, eu não quis ofender, não disse que seu serviço é inútil, só é…

Para uma maior experiência, se quiser, dê o play na música a partir deste momento.:

Dégel: Sem graça, eu sei hahaha. É totalmente o contrário da sua mãe, que possui uma incrível habilidade, além de ser de um clã com bastante renome. Além do que ela passa o dia todo lá ajudando as pessoas, ela é incrível, desde o dia que a conheci senti que ela era diferente, parecia amar as pessoas como se não houvesse amanhã… - Dizia o homem, não escondendo um sorriso gigantesco enquanto falava das qualidades dela, mesmo após tantos anos o amor entre eles era como no início.

- Você nunca quis mais? Fazer mais do que isso?

Dégel: este é o problema, meu filho, eu fiz até demais. Uma das falhas da comunicação entre pais e filhos é justamente isso, não é? Os pais nunca falam do seu passado, quer dizer, nós conhecemos nossos pais a partir do momento que nascemos, e lembramos de coisas a partir dos quatro ou cinco anos, mas e antes? Nossos medos, nossos pesadelos. Como era a vida dos nossos pais antes de serem nossos pais? Sua mãe já lhe disse como nos conhecemos?

- Não, nunca.

O desinteressado Inazuma agora, de repente, parecia bem interessado na história do pai, e o momento de tédio estava se tornando um momento de aprendizado.

Dégel: Foi aqui mesmo na vila, no hospital. Eu estava gravemente ferido, e fui levado até o hospital, por sorte foi logo sua mãe que me atendeu, e naquela época ela já era incrível. Todos achavam que eu não sobreviveria, mas ela fez com que isso fosse possível, e nem mesmo deixou uma cicatriz.

- Como assim gravemente ferido? - Exclamou o garoto, imaginando que o pai havia se cortado com algum desses instrumentos perigosos da marcenaria.

Dégel: Foi uma missão. Sempre esperei o momento certo para te contar, e isso tem um motivo, mas eu fui um Shinobi. Pertencia à Anbu de Konoha e era especializado em missões de infiltração, espionagem e, claro, batalha.

- Mentira… - As palavras saíram quase que automaticamente, nem se deu conta de ter dito aquilo de tão impactado que estava. O pai dele um Anbu? O homem que há anos ficava criando móveis, que era tão pacífico e calmo e que jamais usou um jutsu sequer? Dégel soltou uma gargalhada com a incredulidade do filho.

Dégel: Eu sei, difícil de acreditar não é mesmo? Logo eu que só fico mexendo com madeira. A verdade é que a maioria dessas ferramentas poderiam facilmente ser usadas para assassinar alguém. Naquele dia algo deu errado em uma missão, mas consegui chegar até Konoha e despistar meus perseguidores, precisava fazer com que uma informação chegasse até a vila, e consegui. Nunca havia falhado em uma missão, e não seria aquele dia que deixaria isso acontecer.

-Você… um Anbu? Um ninja de elite, deste nível? Como é possível pai, está me enrolando? Você não tem nada a ver com um shinobi!

Dégel: Isso quer dizer que ainda sou excelente no que faço, hahaha!! Um anbu não pode retirar a máscara e se revelar, por isso ninguém nunca soube quem eu era, nem mesmo faziam ideia de que eu era ou fui um shinobi. Parei alguns anos depois de casar com sua mãe, que obviamente sabia quem eu era. As missões se tornavam cada vez piores, nunca sabia se iria voltar vivo ou não, e isso também acabava com a Saori. A decisão veio após outra missão, novamente fiquei entre a vida e a morte, e novamente ela me salvou, desta vez de um terrível veneno.

- Eu jamais imaginaria isso.

Dégel: É porque as pessoas, meu filho, apenas veem o que querem. Nós temos o costume de querer que as coisas sejam do nosso jeito, que as pessoas sejam como precisamos que sejam. Normalmente não se respeita a decisão ou o modo de viver dos outros, e não se olha além do óbvio. Por isso é tão fácil ludibriar a percepção das pessoas, elas não ligam para você desde que faça sua função na sociedade. Você precisa aprender a não julgar as pessoas pelo que ela parecem, ou como se diz popularmente, julgar o livro pela capa. Se você realmente parar pra pensar na verdade, não há muita coisa que vai ver.

Inazuma estava reflexivo, absorvendo toda aquela informação na qual ele nem mesmo poderia imaginar. Seu pai, um ninja? Toda aquela história parecia uma grande loucura, mas qual foi o motivo para ele ter parado? Ficou com medo da morte? Não, Inazuma não acreditava naquilo, não daquele homem que ele estava conhecendo agora.

- Mas por quê você parou? Você parecia ser bom no que fazia, então pra que parar? E eles simplesmente deixaram?

Dégel: Medo. Eu jamais desistia ou fracassava em missões, e este era justamente o problema e também meu ponto alto como ninja, se eu fracassasse seria por ter morrido. Nesta última missão, que eu estaria morto se não fosse sua mãe, recebi a maior notícia da minha vida: ela estava grávida de você. Eu nunca tive muitas ambições como Shinobi, mas sempre quis ter uma família. Naquele dia, pela primeira vez na minha vida, eu tive medo. Medo do meu filho crescer sem um pai. Medo do meu filho saber que eu fui um fracasso, como pai e shinobi. Medo de não te ver crescer. Naquele dia, com a autorização das únicas pessoas que conheciam o homem por trás da máscara, o Anbu morreu por causa do veneno. Naquele dia eu, Dégel, nasci. Naquele dia eu comecei a me tornar um homem inteiramente feliz.

Lágrimas escorriam pelo rosto do jovem Inazuma, não apenas pela história, mas ao ver o sorriso de felicidade do pai ao narrar esse trecho da sua vida, ao ver o brilho nos olhos dele. Queria falar algo, fazer outra pergunta, mas sua voz não saiu. Precisou respirar profundamente para contornar o nó na garganta.

- Você jamais foi um fracasso, pai, jamais seria! - O pai sorriu levemente, mas demonstrando alegria ao ouvir aquilo.

Dégel: E então eu me tornei um marceneiro, pois era algo que eu sabia fazer razoavelmente, e me dediquei até aprender a fazer isso tão bem quanto como eu era um ninja. Gostava de ser um Shinobi, mas nem chegava aos pés do quanto eu amei ser um pai de família. Inazuma, é preciso saber o que você quer, de verdade. Uma pessoa não pode viver sem um sonho ou um objetivo, não importa quanto tempo demore. Nós somos apenas mais uma gota d’água, mais um grão de areia, se vivermos sem propósito o que nos restará? Você que ainda é tão jovem precisa se perguntar, o que você quer ser, quando você crescer? É preciso ver além das pessoas, das suas ações, das suas intenções. Nem tudo o que parece realmente é.

Automaticamente o jovem entendeu por que seu pai nunca lhe ensinou um jutsu, mesmo sabendo tanto, ele não poderia se revelar ou de repente aparecer sabendo as artes ninja sem nenhuma explicação.  Aquela conversa havia mudado para sempre a mentalidade de Inazuma, e o tornaria uma pessoa mais tolerante e mais respeitosa quanto às escolhas das pessoas, apesar de ainda não tolerar maldades e crueldades de forma alguma. Claro que sentia um amor incondicional pelo seu pai, mas saber mais da história de vida dele o fez respeitá-lo ainda mais, e entender sua escolha. É preciso muita coragem para mudar totalmente sua vida depois dos 40 anos, ainda mais para um Shinobi que, durante toda sua vida, só aprendeu a fazer isso.