A caminhada de volta e um gole de água do cantil me acordam—ajudam a assentar o horror do que acabara de acontecer. Surreal. É preciso encarar o limite. Não quero, mas é um choro vazio que só atrasa a dor diante daquela barreira—alta, inexorável e invisível—que te diz, fria e cruelmente: para você, isso acaba aqui.

Ao reencontrar os sobreviventes da Torre Oeste, tentaria não numerá-los. Todos voltaram, decido logo. E não quero estar aqui para ouvir suas condolências. Dada a oportunidade, ergueria a mão ao ar num estupor—sentindo o peso do membro quadruplicar. Não, não, não. Não! Porém, sim, eu anunciaria:

— O-Olá de novo. E... perdão, s-senhores. A-aqui é o fim da linha para mim — diria. Está feito. Agora já foi dito. Quero morrer. É curioso como o gaguejo foi sumindo durante a noite. Talvez não haja mais dignidade a proteger com a timidez? Sinto um ardor subir aos olhos, mas reprimo-o com toda a violência que consigo. Não ouse chorar na frente dessas pessoas! — O que acabamos de enfrentar... s-sinceramente... não faço ideia de como eu seria útil pra vocês — pintaria um sorriso mecânico no rosto. — Deixarei o resto com os semideuses, os imortais, os invocadores de sombras, madeiras e sei lá mais o quê.

Com todo o esforço do mundo, me dirigiria à Nanami, agachando-me levemente:

— Nanaminho, você pretende ficar? Eu gostaria muito que voltasse comigo — Pequeno, pense bem. Não aguento te perder também. Tentaria localizar Hakari-sensei entre os outros. — Mestre — chamaria. Se houve remorso por não ter sido escolhido para seu grupo, isso evapora. O que resta é o alívio em vê-lo com vida... e o desespero em perdê-lo. Aquela manhã naquele gabinete mudou minha vida. Graças a três pessoas. Só me restam duas. — O maior cientista do mundo — começo, sentindo meus olhos arderem. No fim, não consigo segurar as lágrimas. — m-me d-deve algumas missões, viu? P-por isso, v-você não pode m-morrer.

Quando percebesse, já estaria correndo para um abraço rápido, caso Hakari aceitasse. Seja breve. Não quero demonstrar fraqueza ou envergonhá-lo. Me afastaria enxugando o rosto.

Hora do próximo alvo.

— Senhor Karma — dirigiria-lhe a fala, caso possível. Tão belo, e eu, tão idiota. Olharia para ele. Me salvou mais de uma vez. Encararia aquele violeta fascinante. É então que decido: não foi você. Não pode ter sido. — Obrigado por tudo, de Oasis até aqui — Por que meus olhos voltaram a arder? Droga. — É uma pena que só nos encontremos assim, não é? — Cruzo meus braços atrás do corpo, sem jeito. Outro sorriso falso e já estou chorando de novo. Fito aquele semblante melancólico com a sensação aterradora de que será a última vez. E assim, estou despejando-lhe tudo: — E-eu espero q-que você... c-conclua s-seu propósito. E que... você possa sorrir de verdade de novo. A-acho que... seria uma coisa muito bonita de ver.

É o máximo que aguento. Se não houvesse impedimento, giraria os calcanhares para longe dali sem dar muita atenção à resposta. Minha despedida final seria para a pessoa mais importante da noite—e a mais difícil também. Respiraria fundo, recuperando o tom de voz controlado. Haviam várias interações possíveis—Hakuryū, Nidaime, Rekken... as razões de minha sobrevivência—, mas me dirijo até uma única pessoa.

O rapaz Kaguya estaria lindo como sempre quando eu o indagasse, caso ele aceitasse minha interação:

— Estive me perguntando — começo, titubeando meus passos — se é a primeira vez que um garoto flerta com você durante uma missão? — há certo divertimento na minha voz, o que ajuda a mascarar o que não consigo dizer de verdade. Obrigado por tornar esta noite suportável. Você me salvou mais do que imagina. — Bem, não é a minha, mas caso seja a sua...

Com o coração acelerado e uma coragem súbita, eu me inclinaria à Ken, erguendo-me um pouco na ponta dos pés e, caso ele não me impedisse, depositaria um beijo sutil em sua bochecha. Um gesto rápido como uma faísca, mas com energia o bastante para eletrizar todo meu corpo.

— Aí está, então — murmuraria com um sorriso, tão próximo que seria possível sentir sua respiração tocando meu rosto. — Fique com meu primeiro beijo e assim igualamos. Primeiras coisas pra nós dois. — Quando te verei de novo, Kaguya? Tocaria seu ombro delicadamente, sentindo seu calor transpassar entre meus dedos. Os garotos bonitos só aparecem em batalhas de vida ou morte? Que vida cruel é a dos shinobis. — Vença Soramaru, não ouse morrer e, então... venha me visitar em Kiri, sim? Vou estar te esperando.

Aguardaria a reciprocidade de sua ação, caso a fizesse, antes de partir dali—na esperança de ter Nanami em meu encalço.

E é assim que acaba—com uma angústia dilacerante no peito e o cheiro de morte acompanhando meus passos. Só espero que não sejam capazes de ouvir o choro soluçante que liberto ao atingir os degraus finais daquela maldita torre.

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