Ano 1.

As manhãs não eram as mesmas. A chuva constante em Kirigakure a fazia lembrar de casa, e dos tempos que havia passado com seu mestre nos restaurantes, comendo pratos quentes da região nessa época do ano. A barriga estalou, fazendo o som característico de alguém com fome – e de fato ela estava, não havia comido nada já fazia alguns dias; por isso, deslizou pela casa como uma serpente até a cozinha, onde fez um café e pegou alguns pedaços de bolo que guardava na geladeira, para se alimentar. A mulher sentou-se no sofá, olhando a janela e toda a névoa que cobria o vilarejo, pensando no que faria dali pra frente. Estava mais forte, mas ao mesmo tempo, mais fraca; sem direção. Pensou em até largar a vida Kunoichi e ir para alguma terra distante, aposentar-se e arranjar um emprego como lojista ou algo do tipo, mas afastou a ideia da mente quando imaginou seu falecido sensei a reprovando pelas ideias estúpidas, assim como a própria besta de caudas dentro de seu âmago. A xícara foi posta em cima de uma mesinha, e a loira se afundou no sofá, fechando os olhos e imaginando o que faria num futuro próximo.

—— Você não o visitou desde aquele dia. —— Kurama interrompeu os pensamentos da loira, fitando-a com os grandes olhos. A fera permanecia em sua pose predileta: com as patas à frente do corpo e a cabeça repousando nestas.
—— Não sei se consigo ir. —— Respondeu a fera, se aproximando deitando nas patas da criatura, juntamente da própria.
—— Leve Musashi. Você sequer a avisou e já fazem semanas. —— Kurama comentou, lembrando-a de que sua amiga ainda não sabia da morte do companheiro.
—— Quando a chuva abaixar, nós vamos. —— Concluiu, fechando os olhos.

[...]

O sobretudo negro a protegia da chuva, mas mesmo assim “água” corria por seu rosto, indo até o queixo e pingando no chão. Musashi estava na frente da loira, paralisada. Os olhos outrora dourados agora portavam o vermelho vivo, e sua forma era diferente de todas as outras, o que deixava claro sua evolução. A suna-nin agarrou o braço de sua antiga líder e a puxou para dentro de casa, levando-a até o sofá e sentando-se com a própria. Lágrimas verteram dos olhos de Miyamoto, e Altria a abraçou, chorando em conjunto com a amiga.

Sinto muito por não ter ido atrás dele. É culpa minha. Você estava salvando o mundo e eu… A jonin culpou-se, mas não era sua culpa, e sim da própria loira por não ter ido atrás dele depois do hospital.
—— Não é culpa sua. E ele ia odiar nos ver assim. —— Comentou, limpando os olhos da amiga com o dedo indicador enquanto a canhota buscava um lenço.
Eu estou com o cantil dele, e ainda tá cheio… A mulher continuou, agora, mais calma. Preciso entregá-lo. Onde ele está? Questionou.
—— Nos arredores do vilarejo. Eu o enterrei num lugar que achei que ele gostaria. A voz da kunoichi era embargada, mas clara o suficiente. —— Deixe a chuva chiar e nós iremos lá. —— Concluiu.

[...]

Através dos portões, ambas mulheres se dirijam ao túmulo do amigo caído. O caminho foi silencioso, e apesar da chuva ter diminuído, ainda permanecia. Os trajes negros que ambas usavam representavam o luto, assim como o o silêncio. Não faltavam palavras, mas ambas não tinham ideia do que dizer. Estavam diante do túmulo de Zoro. As três lâminas faziam a decoração, e agora, o cantil com seu saquê. Antes de colocá-lo, Musashi deu um longo gole, limpou a garganta e passou para Altria; a loira pegou o cantil e repetiu o mesmo que sua amiga, sentindo o queimar da garganta graças ao álcool. —— Como ele conseguia beber isso? —— Questionou. O item foi pendurado no cabo da lâmina, ornamentando-a. Todos os adereços do homem estavam posicionados junto dele, assim como uma pequena placa de madeira adornada com flores.

Ele era um beberrão. Isso era doce para ele. Constatou a Jonin, abrindo um largo sorriso. E o que você vai fazer agora? Questionou, fitando a amiga.
—— Eu não sei. Pensei em ir embora, mas ele não gostaria disso, assim como Kurama também não. —— Comentou, com a cabeça baixa e os olhos fitando o túmulo.
Você deveria continuar em frente. Tire um tempo, mas cumpra com as promessas feitas a ele. Você se tornaria uma exímia espadachim, não? Lembro dele comentar que te tornaria uma especialista. Falou, pondo a destra no ombro de Altria. Você consegue. Por si mesma, e por Zoro-sama. Concluiu.

Altria estreitou os olhos e chorou. Tinha promessas feitas com seu mestre, havia jurado ultrapassá-lo na arte da lâmina, e agora que ele havia partido… não havia ninguém para auxiliá-la. Apesar de Musashi ser uma exímia lutadora, a mulher não tinha as mesmas capacidades que Zoro para com a lâmina, o que tornava a tarefa ainda mais difícil. Difícil com certeza, mas não impossível. Era uma promessa, e ela não podia quebrá-la. A loira respirou fundo. Levou a destra até o cabo de Kusanagi e a retirou, apontando-a para o céu. O capuz negro caiu, revelando sua face. A chuva se intensificou, e um trovão ribombou no céu. O coração palpitou, intenso, como se estivesse para estourar. Kurama no íntimo da mulher se aprumou, abriu bem os olhos e aguardou. Outro trovão correu pelo céu, iluminando o local onde ambas kunoichis estavam.

—— Obrigada, Zoro-sama. Obrigada por todo o ensinamento em vida. —— Falou, abaixando a espada e pondo a mão desnuda na mesma. —— Eu juro proteger meus amigos e vilarejo daqui em diante. —— Proferiu, fazendo um pequeno corte na palma da mão, deixando o sangue escorrer até o solo. Musashi deu as costas à Altria e preparou-se para voltar ao vilarejo.

Vamos? Questionou.
—— Sim, vamos. —— Finalizou.

[...]

Ano 2 — 5.

O encontro de ambos foi algo totalmente ao acaso, Altria rondava por Kirigakure numa noite qualquer, e acabou por encontrar um ancião sábio cujos olhos brilhavam com uma intensidade inigualável. Os cabelos prateados esvoaçavam com o vento, como rios de prata; suas mãos calejadas contavam histórias de batalhas passadas. Uma pequena troca de olhares foi o suficiente para a Uchiha descobrir de quem se tratava. A passos lentos, se aproximou do ancião.

—— Nichirin-sama. —— O chamou e curvou-se em respeito. —— Treine-me! —— Pediu.

O homem a observou por um momento, como se sua alma estivesse sendo lida pelo ancião. Um sorriso gentil formou-se no rosto do homem, e ele meneou a cabeça em afirmação.
Vejo determinação em você. Mas saiba que o caminho que quer trilhar não é fácil. A maestria exige disciplina, humildade e uma sede insaciável pelo conhecimento. Constatou, fitando-a.

—— Estou preparada. —— Assentiu, e deu início ao treinamento no dia seguinte.

[...]

O treinamento começava antes do nascer do sol, quando o céu ainda estava tingido de tons azuis e rosa. A Uchiha acordava quando as estrelas ainda brilhavam, provando sua dedicação ao mestre e à arte do kenjutsu. Tanto Altria quanto Nichirin meditavam juntos, encontrando a serenidade em meio à quietude matinal; o ritual não apenas acalmava a mente, mas também preparava os corpos para os treinos árduos que se sucediam. As manhãs eram totalmente dedicadas aos treinos para com a lâmina, e Altria se saía muito bem, porém, Nichirin demonstrava o quão polido era. Mesmo em seus movimentos mais básicos, como sua postura e método para empunhar o armamento, ele se mostrava infinitamente superior à mulher, por isso, fez a Uchiha treinar dia após dia, semana após semana, os princípios básicos da esgrima.

Os golpes eram repetidos, polidos, e repetidos novamente. Tudo isso para torná-los um reflexo natural do corpo da loira. O caminho era árduo, mas era necessário. Os movimentos não podiam ser desperdiçados, pelo contrário, cada um destes deveria ser aproveitado ao máximo, trazendo toda a força da lâmina, assim como a de seu portador, para acabar com seus inimigos. Cada movimento tinha seu propósito, uma intenção por detrás deste, algo que a loira aprendera através das palavras e gestos do velho ancião.

As tardes eram reservadas para treinar o corpo e o espírito. Dia após dia, Altria nadava pelas águas tumultuadas, fortalecendo sua resistência e seu próprio corpo. Havia um motivo por detrás daquele treino, ele fornecia a adaptabilidade e resistência necessária para enfrentar situações adversas em meio à uma batalha. O ancião a acompanhava, sempre, observando-a e sempre ajudando-a com conselhos e orientação ao longo da jornada.

Os dias tornaram-se semanas, e semanas, meses. À medida que o treino progredia, Altria se envolvia em treinamentos mais complexos. Utilizava de espadas de bambu, simulando um combate real contra o velho Nichirin, aprendendo do mesmo. A idade avançada do homem permitia-o compartilhar estratégias, antecipações de movimento e até mesmo a leitura completa de seu adversário. Graças aos olhos da loira, ela teve certa facilidade em pôr em prática tais coisas, mas ainda sim, era completamente subjugada pelo homem em combate. Os duelos, porém, duravam horas a fio, e a cada encontro, a Uchiha era forçada a pôr em prática o que aprendera no dia anterior.

Ao final de cada dia, tanto Altria quanto Nichirin sentavam-se em silêncio para meditar. A reflexão era parte essencial do treinamento, pois eles absorviam a sabedoria e a energia do ambiente ao seu redor, crescendo como seres humanos. Nichirin falava bastante sobre seu passado, como se tornou um mestre na arte da espada, transmitindo lições que não podiam ser ensinadas através de movimentos. Esses momentos de conexão de Altria e Nichirin a lembravam de como era sua relação com Zorojuro. Apesar de ter lidado com o luto, ainda sentia falta de seu mestre, e agora, estava ali tornando-se uma espadachim completa pela promessa que fizera em seu túmulo naquele dia com Musashi. Tornaria-se forte para nunca mais perder ninguém. Altria estava crescendo como indivíduo cada dia passado ao lado do ancião, aperfeiçoando a si mesma e sua mente.

Os dias se repetiam, mas agora, conforme o progresso, mais complexos se tornavam. Nichirin havia abordado Altria há alguns dias e dito para a mulher que deviam observar os animais, a natureza, pois ela deveria encontrar a harmonia com a própria. A mulher seguiu o homem pelas florestas de Kirigakure, observou a natureza selvagem agir, seus padrões, sentiu as texturas das árvores sob os dedos calejados e o sussurro do vento através das folhas. Nichirin sempre a encorajava em incorporar essa sensibilidade em sua técnica de espada, e deixar de lado àquela forma bruta e mal lapidada. Agora, ela deveria se mover com fluidez e a graça dos elementos naturais que a circundam. Era uma só com sua lâmina, ou pelo menos, estava se tornando, e tudo isso graças aos ensinamentos do velho ancião.

Os meses tornaram-se anos. Os desafios aumentaram, agora, Altria era posta em desafios para testar sua adaptação e progresso. Através de lutas simuladas com estilos diferenciados, ela se aperfeiçoava, rapidamente se adaptando a diferentes inimigos e estratégias, assim como cenários. Hora não utilizava dos olhos, e lutava vendada, hora lutava em locais escuros, florestas, encostas escorregadias sem o uso de chakra, sendo forçada a aplicar suas habilidades em em ambientes desafiadores, para quando pudesse utilizar de suas aptidões para com o ninshū, tornar-se uma oponente letal.

Além do físico e técnico, havia também o espiritual. Aprendeu a controlar sua mente, encontrar o foco em meio à multidão graças à calmaria que possuía. Canalizar suas energias internas em cada golpe, tornando-os ainda mais devastadores. Suas meditações tornaram-se ainda mais constantes, e como fora guiada por Nichirin, ela aprofundou-se nisto, permitindo que encontrasse uma paz interior que fortalecia sua determinação de proteger seus entes queridos, além de seu vilarejo. Com o tempo, a persistência e o comprometimento de Altria começaram a dar frutos. Cada desafio superado, cada lição absorvida e cada gota de suor derramada a moldava em uma espadachim incomparável. O seu relacionamento com Nichirin evoluiu de aprendizagem para uma amizade profunda, baseada em respeito mútuo e admiração. E assim, após anos de treinamento incansável, Altria emergiu não apenas como uma especialista em Kenjutsu, mas como uma verdadeira mestra da espada, uma herdeira digna dos ensinamentos de Zorojuro e Nichirin. Cada movimento de sua espada carregava consigo a sabedoria acumulada ao longo dos anos, a determinação incansável e a vontade inquebrável de se tornar a melhor que ela poderia ser.

Cinco anos se passaram desde a morte de Zorojuro. A dor do luto havia sido uma tempestade avassaladora, mas tal qual uma folha que se ergue após um temporal violento, ela havia achado a força dentro de si mesma e continuado em frente. Suas lembranças e o ensinamento do homem permaneciam vivos dentro da Uchiha, guiando-a a cada passo, principalmente durante os cinco anos que passaram, onde estes ensinamentos a fizeram tornar-se uma Especialista em Kenjutsu. As cicatrizes do passado eram marca de sua jornada. O coração outrora frágil e triste, agora bombava com a determinação de um guerreiro.

Um novo capítulo na vida da mulher havia começado. Estava mais forte, mais em paz consigo mesma. Sentia falta de seu mestre, mas ao mesmo tempo, aprendeu com Nichirin que a perda não era o fim. Zorojuro estava junto dela, em suas memórias, em sua alma. Ambos mestres estavam presentes na vida da Uchiha, principalmente em suas habilidades para com a lâmina. Cada golpe da sua espada, a presença de Zorojuro e Nichirin a acompanharia, lembrando-a de suas origens e da jornada que a levou a se tornar a mestre espadachim que seu amigo queria que ela fosse, e que ela havia se tornado.

Considerações:

Técnicas:

Habilidades:

Itens: