O verão era sempre intenso em Iwagakure, e naquela tarde quente, qualquer forasteiro estaria sofrendo de insolação. Naquela ocasião em específico, Batsuki apenas ouviu batidas em sua porta e um pergaminho lacrado deixado para trás. Assim que aberta, ele poderia vislumbrar o Selo Exclusivo do Gabinete da Tsuchikage, reiterando a importância de sua missão. E o sigilo. Partiria sozinho, e assim que aberto, o documento informaria as coordenadas do seu alvo, tal como descreveria um mapa.

As posições eram de certo conhecimento do Chūnin, traçando a linha delimitada do noroeste do País da Terra. Havia passado pela região quando teve de lidar com Isao Ito, e graduou-se pela primeira vez. Um momento nostálgico, quase irônico, mas que não continha a mesma atmosfera de outrora. Sua missão era somente uma: localizar e eliminar Kayn Adelowo.

Assim que decidisse partir, descobriria em meio aos populares alguns rumores sobre festividades ocorrendo na região almejada por Batsuki, tal como uma caravana circense rumando o local. Eles forneceriam carona para ninjas que estivessem visando a região, em troca de proteção durante o percurso. Outros murmúrios, menos frequentes, mencionavam o surgimento de uma poderosa religião sediada na região Norte, tal como o fracasso de um jovem Genin que teria sido acusado de assassinato. Eles estariam em busca do “sangue de infiéis” para servir de sacrifício ao Deus Profano deles. Um homem, autoproclamado como “O Profeta”, espalhava a palavra santa por todos os quatro cantos. Acusava a Kage de ser uma pecadora, e exige que ela confesse os pecados na Pedra Mãe. Há alguns dias, não teriam recebido resposta alguma vindo dela.

Um homem barbudo, baixo e barrigudo, teria esbarrado no jovem enquanto as multidões abriam passagem pelos portões, visivelmente apressado. Ele carregava consigo uma maleta, e vez ou outra tinha alguns espasmos peculiares. De primeira vista, parecia somente um homem comum.

A jornada começaria adiante, e mantendo as informações inicias como pista, ele teria a escolha de seguir em frente.

Considerações:

A imutabilidade do passado é uma das mais absolutas realidades de qualquer indivíduo. Presos eternamente no presente, saber o que se passou é a única dádiva restante para aqueles que não são capazes de tocar o futuro. Mas será que isso deveria ser uma verdade? Quando se vive uma vida, com tantas questões e ações ocorrendo, qual o valor de um passado que sequer pôde ser vislumbrado? Foi isso que Batsuki teria aprendido. Se o aprendizado seria válido para a sua vida, era uma incógnita, mas estava gravado em sua face após atravessar o sujeito cujo qual prometeu poupar.

Se ele pudesse tocar o passado, poderia ver que a estranha caravana e as festividades numa zona supostamente devastada eram duvidosas. Dois ninjas de baixa patente teriam se oferecido para escoltar a principal delas, onde um indivíduo enigmático estaria escondido no banco de trás. Coberto por uma máscara de ANBU, ele estaria adormecendo enquanto aguardava a conclusão do que estava sendo sua fuga. O plano orquestrado por sua mente vil já estava em andamento quando o Chūnin decidiu seguir o cientista e descobrir um pouco mais sobre a realidade dos cientistas do vilarejo. Embora parecesse banal, suas ações foram capazes de salvar a vida de um homem de suma importância para a vida de milhares de pessoas. E, não obstante, sanar algumas incógnitas que permaneciam pairando no imaginário dos superiores.

Enquanto toda a ação ocorria, conforme planejado, a caravana circense seria interceptada. Após todas as testemunhas serem mortas, Isao Ito seria conduzido para destino que deveria pertencer ao Batsuki. Se não fosse as criaturas aladas que ele deteve sob seu comando durante toda a narrativa, todas as ações teriam ocorrido tarde demais para sequer chegar no local demarcado antes que a tragédia ocorresse. Eles queriam matar o verdadeiro Kayn, e atrair o Batsuki para uma cruel armadilha.

O jovem Chūnin encontrado na estrada sabia disso, e detinha em mãos uma carta contendo as informações confidenciais acerca do plano maquiavélico de Ito. A partir da correspondência seria possível descobrir sobre a fuga, e o desaparecimento de um dos ANBU responsáveis pela vigília deste em sua cela. Após uma duvidosa transferência para a prisão domiciliar no Centro Nobre de Iwagakure, ele teria conseguido molhar a mão de corruptos e se fortalecer novamente. Diversos outros integrantes da facção rebelde estavam presos há algum tempo desde os feitos de Batsuki em reunir as provas quanto os esforços de outros shinobi. A história estava sendo traçada desde o princípio, e naquele momento, tudo estava sendo interligado novamente para o começo.

A zona destruída na catástrofe memorável protagonizada por Batsuki guardava mais segredos do que maioria das pessoas imaginavam. Centenas de bombas estão guardadas no local, e o desabamento das montanhas e a destruição da fábrica de papéis explosivos não foram tão marcantes. Eles já possuíam suas reservas de armamentos. No solo do pequeno povoado, inúmeras toneladas de Kibaku Fūda estão prontas para uso. Um arsenal poderoso o suficiente para causar danos irreparáveis no vilarejo.

As caravanas que se reuniam era somente um pretexto para evitar suspeitas. Assim que os civis chegavam, eram abatidos. Os milicianos então planejavam utilizar os inúmeros veículos como transporte para mobilizar todo o estoque que estes detinham. Mas havia um único reduto problemático capaz de impedir toda a operação: Kayn Adelowo.

Um assassino de elite estaria esperando o momento certo para ceifar a vida do sujeito, mas após encontrar o homem e concordar em poupar sua vida, o tiro saiu pela culatra. Infelizmente para o rapaz, a forma como ele chegou ao recinto tornaria as coisas piores. Cercado e despreparado, ele se viu no epicentro da armadilha. Acusado de colaborar com um criminoso de altíssima periculosidade, aos poucos as mortes de todos os civis eram atribuídas ao shinobi. O noticiário ao vivo gravava cada um dos detalhes, e a manchete ficaria marcada para sempre nos anais do vilarejo.

Não houve espetáculo circense algum, exceto se for considerar toda a trama uma apresentação de fantoches. Manipulados por uma cadeia de acontecimentos que vão além do próprio sistema, todos os integrantes daquele evento estavam condenados a desconhecer tanto o próprio futuro quanto o passado.

E quando todos foram mortos, nas explosões, isso ficou cada vez mais claro.

As caravanas partiam levando consigo o objetivo primário de sua operação. O corpo de Kayn Adelowo despencava dos céus para guardar consigo por toda eternidades mais segredos do que poderia ser mensurado.

(...)

Após sua fuga do local, Batsuki efetivamente conseguiria retornar ao vilarejo. Recebido por um misto de vaias e aplausos dos populares, o Chūnin seria prontamente convocado para o Quartel-general de Iwagakure no Sato.

O rosto do comandante era familiar, sendo exatamente o mesmo semblante responsável por graduar ele pela primeira vez. Tamanha nostalgia talvez não fosse vista da forma adequada, considerando os pensamentos que passaram por sua mente nos últimos eventos, mas seria a conclusão irônica para tudo que teria acontecido até então. Teria acabado da mesma forma. Mais uma vez, milhares de civis mortos. Teria concluído sua missão, mas falhado com o povo. Qual seria o papel de um ninja, então? O que realmente significava portar uma bandana? Essa resposta, somente ele poderia dar a si mesmo. Ninguém naquela sala, nem seu superior quanto Rei Kamizuru, seriam capazes de respondê-la.

— Você é um homem de sorte, Mangetsu Batsuki. Uma recomendação direta de Rei Kamizuru, nada melhor que isso pra limpar sua ficha um pouco. Grande parte do povo ama ele, e salvar uma celebridade dessas alivia um pouco sua barra. A turma dos direitos humanos está falando que você foi manipulado pelo Kayn, e ao matar ele, você teria percebido a cagada que fez. Parabéns, moleque. Nossa vila foi salva. — ele sorriu-lhe, embora a simpatia fosse tão azeda que sequer seria possível destacar que era realmente disso que se tratava. — Quem quer rir tem que fazer rir, Batsuki. E você me fez rir bastante hoje. Parabéns, rapaz. Hoje você sairá dessa sala como um Tokubetsu Jōnin. Que satisfação, aspira. — levantando-se, o brutamontes daria uma tapinhas nas costas dele. — Vamos te pagar uma boa nota por isso tudo, hein? Aproveita e dá uma volta, pode sair para pegar umas gostosas vez ou outra. Tô indo agora num baile, se quiser colar “tamo” junto. Percebi que você é fechamento com nós. Mas aí. — pondo o óculos escuro nos olhos sombrios, ele teria dito: — Da próxima vez vê se não é curioso pra caralho. Se não fosse mano Ito pra livrar sua pele, você tava era fodido. Aí, vai ter uma CPI daqui uns dias. Queremos que você deponha lá. Lembre de seguir nosso migué pra sair tudo nosso. — Isao Ito, outrora condenado pelo mesmo homem por traição, estaria aguardando na porta. Vestido com trajes de festividades, ambos teriam saído animados para curtir um momento empolgante com o resto da ralé do vilarejo.

Sobraram somente Mangetsu Batsuki e Rei Kamizuru, frente a frente. A face do cientista era marcada pela mais profunda melancolia, e os espasmos, permaneciam frequentes. Após um longo período sem dizer uma palavra sequer, quando estiveram a sós, ele pôde dizer-lhe:

— O sistema é foda, parceiro. Ainda vai morrer muita gente. — envergonhado, ele sequer conseguia olhar nos olhos do agora Tokubetsu Jōnin. — Se não fossem eles, seriam nós. O mínimo que eu poderia fazer por você, uma criança tola e ingênua nisso tudo, era ajudar a livrar sua pele. Sabe por qual motivo eu protegi você? Eu sou um filho da puta. Todo mundo nessa porra é um filho da puta. Mas quando eu estava fodido, você quis ajudar. Infelizmente, gente parecido com você sempre vai se foder. Quando eu virar as costas, vão me matar para limpar os arquivos por ter descumprido com ordens e cansado dessa patifaria. Por trás de tudo, há somente máscaras. Mas não cometa o mesmo erro que eu. Viva sua vida. Seja um shinobi. Ensine isso para os seus filhos, e peça para que eles ensinem aos seus netos. — ele teria se levantado, vagarosamente indo até a saída com os olhos direcionados para o piso. Era o olhar de um homem morto. — Não adiantaria muito você me salvar ou não. Mas saiba que serei eternamente grato por isso. Aproveite sua vida, Mangetsu Batsuki. E adeus.

Assim que ele bateu as portas, foi a última vez que ele teria sido visto. No mesmo dia, no cair da noite, Rei Kamizuru foi assassinado a sangue frio. Quando amanheceu, seu corpo sequer foi encontrado. A comoção pública estava garantida. E com ela, eles poderiam pavimentar o caminho para os próximos passos.

(...)

”Kayn Adelowo”:

Considerações: