Após mais um dia de trabalho, Allannia decidiu dar uma volta pelas ruas escuras de Iwagakure. Gostava do silêncio para auxiliar em suas reflexões, acalmar os ânimos e estimular sua criatividade. Num desses momentos de introspecção, notou uma situação controversa. Alguns vultos atravessavam as vielas do vilarejo. Aparentava ser uma perseguição. Preocupada, seguiu os sujeitos numa velocidade de 18m/s, ligeiramente abaixo de seus limites, visando poupar suas energias para um possível confronto. A busca durou somente dois minutos, após vislumbrar os shinobi ANBU nocauteados. Sentiu mãos ásperas tocando seus lábios, sendo puxada forçadamente para uma espécie de estabelecimento abandonado.

Tentou se debater e reagir, sem sucesso. O captor detinha de considerável força física, e a respiração estava prejudicada pela pressão em suas narinas. Quase desmaiou, impotente diante da morte praticamente inevitável. As luzes foram acesas, e a silhueta cessou a investida. Era um homem alto e esbelto, de belos fios louros e olhos azuis. Seus lábios eram rosados, e possuía um corpo definido invejável. Para Allannia, tais atributos físicos eram insignificantes, embora pudesse ser considerado uma deidade aos olhos de outros tipos.

Respirava debilmente, desferindo um olhar profundo na direção dele. Ódio amargo, latente em seu peito. A condição precária impedia uma investida imediata, focalizando suas atenções em uma possibilidade de ataque vindouro. Sorridente, ele analisava a Tsuchikage de cima para baixo. Seus braços estavam cruzados, e a pose era dominante. Caso um combate fosse iniciado, ele estava confiante de sua capacidades. Carregava consigo uma bolsa volumosa, projetando-se em suas costas como se fosse uma corcunda de tão atulhada.

— Quem é você? E o que você quer? — Allannia indagou, após recuperar o fôlego.

— Poxa, gracinha. Eu preferia você calada. Essa sua cara de brava é um máximo — o homem demonstrou frustração, suspirando em resposta. Todo o interesse que ele tinha outrora, acabou — Eu estava só de passagem por aqui, tá ligada? Nem queria precisar parar por aqui, mas uma galera da pesada me achou e tive que me esconder. Aí no caminho esses teus ninjas vieram atrás de mim, achando que sou algum bandido. Não que eles estejam tão errados assim — as explicações não faziam sentido para a Grey, gerando mais perguntas que respostas — Para uma Kage, você até que é bem baixinha. E parece frouxa. Se eu quisesse, você estava morta agora. Claro que eu jamais faria isso, não sou maluco. Não é todo dia que se vê uma elfa. Já te falaram que suas orelhas são engraçadas?

— Você fala demais — Allannia já estava se endurecendo.

— E você de menos.

— Não tenho tempo para jogar conversa fora — Allannia tentou puxar uma Kunai de sua bolsa de armas, mas ele reagiu mais rápido. Rapidamente, contorceu seu braço para trás, forçando uma desistência — Para com isso, está me machucando. Eu me rendo, só me deixa em paz — por um instante, teve seu pedido atendido. E não desperdiçou a chance. Conseguiu ter a lâmina em mãos, conseguindo cortar a face dele e forçar um recuo improvisado.

— Você joga sujo, orelhuda — o invasor tocou a área ferida, averiguando o sangue em suas mãos.

— Não sou eu quem ataco por trás, feito um covarde.

— Está tudo bem, mulher. Não é minha intenção discutir. E já que estamos aqui, talvez possamos deixar a coisa boa para nós dois — o tom dele mudou, assumindo uma postura diplomática.

— Ficou com medo de morrer?

— Na verdade, não. Quebrar essa sua cara é um desperdício, e não estou muito afim de me esforçar muito. Guarda a arma e vamos conversar — ele ergueu as mãos, negociando uma trégua

— Por que eu deveria confiar em você? Não tenho motivo nenhum para isso — Allannia não estava disposta a colaborar.

— Quando eu te mostrar o que tenho aqui comigo, você vai gostar — ele retirou a bolsa, alocando ela no chão delicadamente. Embora a abertura fosse perfeita para um ataque, a Grey decidiu aguardar — Acho que não nos apresentamos direito. Meu nome é Reid Garwin, mas eles me chamam de O Malandro, por motivos óbvios. Aliás, estou solteiro. E disponível.

— Cala a boca, e diz logo o que você tem pra dizer — detestava homens mesquinhos que tentavam se passar por galanteadores.

— Saca só isso aqui, gata — ele puxou da bagagem uma caixa de madeira envernizada, exuberante. Dela, uma manopla peculiar estava inserida, contendo um orbe em seu centro. Inicialmente, parecia uma luva comum — Chega mais, não precisa ficar acanhada. Ela não vai te morder, mas pode fazer pior. Relaxa que não vai rolar nada.

— O que é essa coisa? Não parece nada demais — aproximou-se timidamente, para avaliar o item.

— Isso é uma manopla, e ela tem um poder enorme. Depois você dá uma olhada nela, se usar de qualquer jeito vai dar uma merda das grandes — ele argumentou, entregando-a em suas mãos — Tava escondendo ela de uns caras, ia vender no mercado negro por uma nota. Mas se chegarmos num bom termo, nem vou precisar. Eu me livro dos caras, e você ganha uma parada daora. Topa?

— Eu não consigo entender nada, você fala de um jeito esquisito.

— Qual é, novinha. Você tem um jeitinho de tiozona. Mas é como dizem, panela velha faz comida boa.

— Não sei o que isso quer dizer, e talvez seja melhor que eu não saiba. Mas como pretende me vender um produto se não quer me dizer o que ele faz? — indignada, Allannia não estava disposta a negociar.

— Eu achei que tinha sido bem convincente, preciso fazer biquinho e cara de choro pra parecer sincero? Acha mesmo que eu viria de tão longe com uma manopla velha se ela não fosse especial? — por mais sincero que ele parecesse para Allannia, a história era absurda demais para se acreditar.

— Sim. Não sei nem ao menos de onde você é, quanto mais suas intenções. E se isso é tão valioso quanto diz, como conseguiu? — no fundo, ela não queria obter essa informação com medo do que sairia daqueles lábios venenosos.

— Se você soubesse tudo que precisei passar, talvez eu precisasse te matar — o tom de voz sombrio evitava continuações — Vai querer ou não? Se não quiser, tem quem queira. Esse lugar é fechado demais pra eu sair mostrando o que ela faz, vamos morrer se isso rolar. E se eu sair de mal jeito, você me mata também. Então eu te dou isso pra você, você me paga e ficamos certos.

— Mas o que você quer? — questionou, franzindo o cenho — Não temos muito dinheiro em nossos cofres, e estamos atravessando uma forte crise — ele se aproximou lentamente, murmurando sua proposta — Mas isso é demais!

— É pegar um largar. Veja bem, eu poderia estar cobrando valores que me beneficiam mais. E não precisa cumprir com o combinado agora, eu volto depois para buscar — ele sorriu, sedento.

Após alguns segundos, Allannia decidiu.

— Certo. Eu concordo com os termos. Espero que essa porcaria seja tão boa quanto você diz ser. Deixarei nos cofres do vilarejo até que seja necessária, mas retorne aqui com novos produtos para que eu possa me certificar de sua procedência — estendeu a mão, firmando o pacto. Esperava não se arrepender de nenhuma parte.

— Muito bem. Sendo assim, vou dar o fora. Foi bom fazer negócio com você — e após lançar uma bomba de fumaça no chão, ele desapareceu.

(...)

Allannia levou a nova relíquia do vilarejo até o Gabinete, onde ela seria guardada. Não sabia exatamente o que ela fazia, tampouco se seria útil aos seus propósitos, mas havia algo de convincente nas palavras do estranho mercador. Esperaria ele aparecer com mais artigos, na esperança de ter alguma certeza de suas qualidades.