Em Kumo, a chuva era frequente. As tempestades, ainda mais. Raios e trovões partiam os céus – afinal, esse era o país do relâmpago.

A luz baixa de uma vela iluminava meu quarto, dentro do meu aconchegante apartamento. Minhas mãos seguravam uma xícara relativamente grande de chá de menta e camomila, doce e relaxante. Suspirava, deixando condensação presa ao vidro enquanto eu olhava meu reflexo completamente despido na janela onde as gotas d’agua constantemente batucavam, coberta apenas por um lençol jogado sobre minhas costas.

Eu adorava isso. Poucas coisas me deixavam tão contentes como apenas... parar, e respirar, e aproveitar um copo de chá. Mas ainda assim, mesmo em estado de relaxamento, mesmo estando agraciando-me com uma bebida quente, no conforto do meu lar... Um único pensamento cruzava minha mente.

Eu precisava ficar mais forte.

Sim, isso era algo que eu reconhecia sobre a mim mesmo já a algum tempo. Talvez, por tempo demais, mas agora, com os eventos que ocorreram em Uzu, me sentia incapaz de agir – Minha última jogada era mostrar a todos que eu era, de fato, uma Jashinista, ora bolas...

Não, isso não iria prestar. A arte do Genjutsu era complexa e muito, muito poderosa, mas para ser repentinamente rebatida por vários especialistas em Genjutsu em um único momento? Não bastava força e disciplina psicológica. Eu precisava de força ofensiva. Eu precisava rasgar meus oponentes – tirar a carne de seus ossos.

Mas a questão que cabia agora era... Como?

Haviam várias maneiras de descobrir como, de fato. A que mais me saltava a cabeça era de simplesmente ir até o gabinete do Raikage, e, desta vez, exigir ao Sandaime que me desse o devido treinamento – devíamos ser um time, afinal, e quase nunca compartilhava tempo sequer com o homem... Os males de ser um Kage, imaginava.

Então, cabia a mim mesma descobrir...

...E eu encontrei meu reflexo contra a tempestade.

De fato, nunca me senti fora de lugar na chuva. De fato, quando consegui após tantos anos escapar dos escravistas, o primeiro cenário que me recebeu foi a chuva – fria, quase congelante. O vento, rasgando meu rosto. Os trovões, partindo o céu e iluminando a terra...

A Tempestade. Uma tempestade. Esse era o grande resumo em uma palavra de minha vida até agora, apenas uma longa, cruel e terrível tempestade, balanceando-se na tênue linha entre tortura e má fortuna.

Mas eu havia-o superado. Até agora, não parei de caminhar, e a cada dia, meus objetivos ficavam mais próximos... Mas não era rápido o suficiente.

Como se fosse a centésima vez durante o dia, suspirei. Com minha xícara de chá finalmente terminada, calmamente me levantei do meu descanso, e me dirigi para uma pequena caixa na minha estante onde eu guardava alguns equipamentos mais exóticos.

Desta caixa, retirei uma pequena lâmina de papel. Papel de Chakra, criado para possibilitar a identificação dos elementos e afinidades do usuário.

Vislumbrei a pequena lâmina de papel em minhas mãos. Eu sabia minha afinidade elemental, afinal – Suiton. A Personalidade da água... Calma, esperto, introspectivo, independente e autossuficiente. São pessoas penetrantes, criticas e escrutinadoras, que procuram maior conhecimento e compreensão do mundo ao seu redor... Errei em algum ponto? É isso algo que eu não sou...?

...Mas é só isso que eu sou?

Naquele momento, reneguei minha afinidade – com meu pleno domínio sobre meu próprio Chakra, cancelei minha afinidade natural, sentindo o fluxo de Chakra Suiton em meu núcleo e o reduzindo. Entre o polegar e o indicador, firmemente segurei a pequena folha de papel... e foquei.

Com Katon, o papel se queima. Com Doton, o papel vira pó e desintegra. Com Água, o papel fica encharcado...

Quando o papel se rasga nos cantos e fica amassado...?

‘Raiton e Futon’ – Pensei para mim mesma. Vento, fluído e adaptável, intelectos rápidos, mas com mentes ocupadas. Trovão, impiedoso, potente, imprevisível. Aspectos da minha mente que, lá no fundo, eu sabia que estavam lá... Mas nunca havia os sentido de maneira tão clara.

‘Suiton, Raiton e Futon’ Novamente refleti, deixando uma pequena risada sair dos meus lábios. ‘A Chuva, o Trovão e a Ventania. Parece que eu realmente sou a tempestade, então?’

Meus pés me traziam, mais uma vez, para fora de meu apartamento, na rota cênica – escalando as paredes pelo lado de fora da janela. A chuva forte e fria irritava minha pele e meu corpo, e o vento ameaçava me derrubar dali. Os raios brevemente iluminavam minha silhueta contra o fundo escuro.

Me sentei, ali em cima, ignorando o frio, e me pus a meditar. Minha nudez naquele momento não me incomodava – pelo contrário, em poucos momentos em minha vida eu já havia me sentido tão unida com o mundo ao meu redor... O vento contra minha face, a água escorrendo pelos meus cabelos soltos, o barulho dos trovões...

Sim, eu estava em casa. Aqui era meu lugar, e esse é quem eu sou...

- “Nora.” – Escutei o chamado, calmo, mas confuso, vindo de alguns metros de distância. Suspirei, abri meus olhos. – “Tanki-senpai” – Respondi, olhando o homem em suas fardas típicas, o meu instrutor no departamento de inteligência. – “Que porra tu tá fazendo pelada no teto, menina!?” – Exclamou o homem, incrédulo.

Apenas balancei a cabeça. – “Treinamento de resistência e aclimatização a condições climáticas severas. Decidi aproveitar a chuva. E você, o que vem fazer aqui?” – Falei para o homem, ignorando seu olhar de confusão. O homem, por sua parte, apenas encolheu os ombros e gesticulou para que eu o seguisse.

...Hora de voltar ao trabalho, parece. Paz nunca dura.