Um sinuoso rio, peixes de todos os tipos e tamanhos além de um belo pássaro, o Sol iluminava tudo com sua solidariedade infinita, tudo isso desmoronou quando o menino despertou de seu sono com um terrível cheiro de fumaça. Olhou de um lado para outro atordoado, sua expressão era de perturbação e medo mas, como tudo em sua vida, seus pensamentos foram cortados por alguém que jogou em sua janela um pergaminho com um selo oficial da vila.

— Outra missão? — ainda lembrava da última, quando tinha explodido um ser humano e feito ele em pedacinhos de carne. — Alguém está atacando uma floresta na aldeia?  — Ainda não estava pleno em seu raciocínio, mas não podia se negar a defender sua aldeia, tinha que levantar e resolver esse caso, ou melhor, reunir pistas do paradeiro do homem, dessa vez ele não precisava matar, não é mesmo?

O menino não tinha certeza de nada, mas uma coisa ele tinha menos certeza do que as outras, a natureza humana. O homem é essencialmente bom ou mau? Seriam essas discussões válidas de qualquer forma? A maldade justifica o assassinato? E, afinal, o que seria maldade? Esse tipo de coisa realmente existe? Quais eram os objetivos desse renegado?

Não sabia a resposta para nenhuma dessas perguntas, aliás, tinha mais perguntas que respostas e isso o assustava. A ideia de que o mal é apenas questão de perspectiva iria assombrá-lo por muito tempo. E o perdão? A quem cabia essa função naquele mundo caótico? Talvez ninguém fosse digno, digno de conceder perdão, a partir do momento que a solução contra o outro é a morte, a humilhação e violência, o perdão deveria ser uma morte rápida, honrada e pouco sofrida! Maldição, talvez pensasse o garoto, enquanto ia a passos largos ao local indicado. — Não seria muito ruim se o mundo acabasse agora — Concluiu.

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Para muitos o conceito de desordem é a pior coisa que pode existir, só coisas terríveis surgem da desordem, não é mesmo? Não, Amaterasu via de outra forma, a desordem cria, não destrói, a desordem cria a chuva, a neve, o movimento e o homem! A ordem é a ausência de movimento e portanto ela é a morte, é a ausência de viver. Foi assim que o menino reagiu quando encontrou aquela área completamente queimada.

— A ordem foi posta por um desordeiro, a vida cessa seu movimento... — Lágrimas brotaram de seu rosto, que patético, a máquina de matar, o demônio, o patricída chorando como uma criança. — Talvez eu devesse parar, eu estou cansado de corpos, todo dia, todo dia eu vejo mais corpos que pessoas — parou de chorar. Respirou e viu surgir um homem de casaco vermelho, ali estava o inimigo, ou pelo menos era aquilo que se forçava a acreditar.

— Criança? Eu não tenho tempo pra ser criança — pensou assumindo uma feição de seriedade. Ao mesmo tempo que não se sentia confortável na frente daquela pessoa. O medo tomou conta do menino, pela primeira vez temia a própria vida, não queria cessar seu movimento, não, ainda não, tinha tanto o que fazer! Existem tantas perguntas para serem respondidas e ele só podia fazer isso em vida. Mas a medida que o medo inundava sua alma sentia em sua pequena mão a mão de sua mãe e na outra a de seu pai, amor e ódio, perdão e vingança, bem e mal, tanto faz, viver para se perguntar é um princípio mais importante do que viver para achar respostas. Morrer com dúvidas é melhor que morrer com fatos.

Talvez você tenha razão — disse monótono, sua expressão agora era bem mais tranquila — Eu não valho nada para aqueles caras, no fim eu sou só um número que pode morrer e ninguém vai chorar, ninguém vai derramar a porra de uma lágrima! — apertou as mãos com tanta força que um pouco de sangue começou a pingar delas — Mas isso não me importa, porque cada pessoa que eu já ajudei como ninja vai sempre lembrar de mim. Tanto faz se para os ninjas mais fortes eu sou fraco e que minha presença é insignificante, eu não ligo pra eles, eu ligo pra criança que tem o coração preenchido de felicidade quando o pai vendedor chega em casa seguro, quando eu consigo resgatar alguém em perigo ou ensinar na academia as nossas crianças!

— Sim, eu sou substituível pra eles, mas me importar com isso seria mediocridade e só os medíocres vivem por si mesmos, afinal, a gente só é um pedaço de carne a procura da aprovação de outros pedaços de carne e isso faz de todos nós escravos, eu quero me libertar e por isso não temo você, nem a morte e nem qualquer um que atente contra a segurança de qualquer cidadão da minha vila.

Quando terminou sua fala seu corpo já estava na forma completa. Soltou a algema de seu demônio interior, estava pronto pra briga, porque sabia que não era um escravo, não era um escravo da vida. Lançou contra o homem duas shuriken, que iam em linha reta, a primeira mais lenta que a segunda, de maneira que elas se colidiram, dividindo para esquerda e direita, na tentativa de surpreender o inimigo numa tentativa de esquiva. Manteve uma distância de 20 metros do homem, preparando duas kunai com papel bomba, afinal, era um perito em armamento básico.

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"Meu filho, a gentileza é a maior arma de um homem, seja gentil com as mulheres, com as crianças, com outros homens, seja gentil com os animais, com a água e com as árvores e elas nunca te abandonarão. A verdade Amaterasu é que você é meu sol, você é o que me faz levantar todos os dias, você é meu filho, meu amor e meu perdão. Seja gentil, adeus."

Tudo estava branco como a neve, uma luz forte começava a brilhar e seu brilho intenso cegava qualquer um que ousasse olhá-la diretamente.

"Pai... Papai... Eu estou... Morto?"

A luz ia se tornando negra, como se sugasse toda a energia e vontade, a morte não ronda os lugares obscuros, ela é a rendenção e a oportunidade do novo, é o retorno etéreo de toda matéria

Amaterasu abriu os olhos, sentiu o facho de luz solar aquecer seus olhos, colocou a mão sobre seu corpo e sentiu o sangue. Estava perdido, caído, era a primeira vez que havia sido subjulgado daquele jeito, mas ainda estava ali, vivo.

"Afinal qual o propósito disso tudo? Por que me deixou viver? Para conviver com a humilhação da derrota?"

Obviamente ele não se referia a derrota física, mas a derrota de espírito, foi mais fraco que o homem porque acreditava que podia não ser um escravo protegendo os outros? Mas não fazia isso só porque pagavam? Não importa, Amaterasu reuniu as pistas, não foi pra isso que foi mandado? Levantou com dificuldade, as feridas ainda doíam, todavia, sua alma doía ainda mais, sua cabeça latejava.

"Eu vou te encontrar novamente... E eu espero que eu ou você tenha as respostas, as respostas sobre a essência da humanidade."

Olhou para o céu e um pássaro cortou o céu, a partir daquele encontro que quase custou sua vida, um novo Amaterasu nascia.

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