Os últimos dias tinham sido turbulentos, tanto para o bem quanto para o mal. Eu tinha enfrentado diversos problemas, tudo em uma intensidade que nunca tinha precisado encarar antes durante a minha vida. Percebi que tudo isso estava me fortalecendo e me mudando. Sufoco atrás de sufoco, era como se tudo aquilo estivesse impregnando em mim e me mostrando como o mundo funciona. De pouco em pouco a visão de mundo daquela garotinha idealista estava sendo reconstruída com base na realidade, e era difícil me manter fiel às crenças que me impulsionaram a chegar até ali. Eu ainda queria ser uma grande kunoichi e que o mundo me reconhecesse, mas para mim ficou claro que conforme a minha jornada avançasse os problemas que viriam a surgir seriam cada vez piores que o anterior. Para vencê-los, eu precisaria dedicar cada dia da minha vida a ser mais forte do que eu era ontem. Eu sabia que a jornada não seria fácil, mas ter essa noção não me ajudava a vencer todos aqueles empecilhos.

Ao menos agora eu tinha alguém para me ajudar a trilhar esse caminho, sem precisar fazer tudo sozinha.

Kojiro tinha sido alvo de minhas desconfianças em um primeiro momento, muito em partes por já chegar sabendo tanto de mim e eu nada dele. Cedi às provocações e dancei conforme a música que ele gostaria, chegando até o extremo de aceitar quase morrer para poder me tornar mais forte. Olhando para trás eu vejo que fui muito corajosa. Agora que um bom tempo já passou e as memórias da missão de escolta já estavam esfriando em minha frente, eu conseguia ver que só aceitei chegar até o ponto de me submeter àquela maldição porque ainda estava muito ferida pelo meu quase fracasso. Fiquei rindo sozinha durante o trajeto até o ponto marcado para o meu encontro com Kojiro. Eu pensava que se ele me fizesse a mesma proposta naquele momento eu provavelmente não aceitaria de novo, mas uma vez que já estava feito eu ficava agradecida por ter tido essa coragem antes. Uma vez eu dominasse aquele poder a minha força aumentaria exponencialmente. E como dito, eu não podia me permitir estagnar.

Aquela escadaria era enorme e provavelmente muito cansativa, mas eu acabei ficando tão imersa em meus pensamentos que sequer percebi a fadiga me alcançar. Usando uma roupa mais pesada que a usual por causa do frio, eu levantei um pouco mais da minha gola acolchoada de uma forma que cobrisse a minha boca. Meus lábios estavam começando a ficar frios, então precisava protegê-los. Assim que coloquei os pés no topo daquela colina e avistei o portão eu olhei para trás. A vista da vila sendo recoberta pela neve era linda. Quando percebi que tinha me distraído por tempo demais apenas observando a paisagem, eu corri para atravessar os portões do templo. Kojiro já estava me esperando.

— Relaxa, nem é tão longe assim. — eu disse enquanto me aproximava. Com certa curiosidade, tentei discretamente ficar observando aquela espada que Kojiro parecia estar usando para algo. Ele não estava com ela da última vez, então chamou minha atenção pela possibilidade dele querer dirigir um treino de kenjutsu. Logo percebi que me precipitei e o objetivo ali seria outro. Ainda assim, me permiti brincar — Controlar minha maldição? — perguntei em meio a risadas — Qual das duas?

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Kojiro entrou na brincadeira e riu de minha pequena piada, mas assim que sua expressão se tornou séria eu percebi que o momento de brincar já tinha passado. Eu ainda estava otimista e bom humor, então apenas mantive um sorrisinho no rosto enquanto o homem explicava o que faríamos naquele dia. Eu já suspeitava que o convite era para darmos uma melhorada no meu controle sobre o Juinjutsu, então tinha ido preparada psicologicamente para aquilo. Eu nenhum momento eu esqueci das palavras do Jounin sobre aquele ser um poder que vai tentar a qualquer custo tomar controle do meu corpo. Ter que ceder o meu corpo a um tipo de poder estranho não é algo que eu vá desejar para a minha vida, portanto quanto mais rápido eu conseguisse dominá-lo então melhor seria.

Observei com atenção a demonstração do dito Nível 1 do Juinjutsu de Kojiro. Ao contrário do meu que estava localizado no peito e era algo como uma shuriken fina de três pontas, o dele parecia com o doujutsu que carrego e estava localizado no pescoço. As marcas se espalharam pelo seu corpo seguindo esse padrão que pareciam vírgulas. Enquanto aumentavam a área dominada, as marcas brilharam como fogo e então estabilizaram em um tom de preto bem escuro (este eu reconheci ser a tonalidade padrão do Juinjutsu quando desativado). Eu pensei rapidamente naquele momento como aquilo era legal, mas assim que percebi estar perdendo o foco eu balancei a cabeça para me impedir de continuar me dispersando.

Acompanhei os movimentos da espada de Kojiro bem desconfiada. Em um primeiro momento pensei ser uma arma que de alguma forma auxiliava no controle da maldição, mas quando ele anunciou que seria um treinamento de combate comigo tentando manter o controle sobre o selo, eu percebi que era mesmo somente uma arma comum. Acenei positivamente com a cabeça e fechei os olhos, tornando mais fácil de me concentrar na dita sensação de vulnerabilidade.

As lembranças que evoquei foram as mesmas do pesadelo quando lutei contra o poder do selo anteriormente. O laboratório, o porão, o mar de sangue... Tudo o que senti naquele dia sendo  chamado de volta para a superfície. Mesmo que eu já tivesse adquirido a determinação para vencer aquilo tudo, eu ainda lembrava muito bem daquelas emoções ruins que me deixaram desacordada por dias. Eu senti aquele ardor que estava cada vez se tornando mais familiar irradiando do meu peito. Aquela sensação de quente se espalhou gradativamente e eu senti desta vez ela atravessar meu tronco e dar a volta até as costas, passando meu rosto e até mesmo os pés. Quando abri os olhos eu notei que todo o meu corpo estava coberto pelas marcas, mas a sua coloração alaranjada indicava que ainda estava se espalhando. Era a hora de estabilizar.

Concentrada naquela dor incomoda sobre todo o me corpo, eu foquei agora na sensação de momentos antes de despertar o pesadelo, basicamente quando venci o ímpeto da maldição. Eu vi a coloração das marcas oscilarem e começarem a ficar negras como as de Kojiro, mas foi um cabo de guerra intenso. A linha tênue entre fazer o selo regredir e apenas estabilizar foi difícil de calibrar. Em alguns momentos ele pareceu recuar, o que me forçava a oscilar entre as sensações ruins e as boas para atingir o nível necessário. Quando finalmente consegui fazê-lo desistir de tentar algo e apenas estabilizar, eu senti a dor também se tornar menos incômoda.

— Ainda é doloroso.  — comentei — Sinto como se ainda tivesse consumindo a minha vida, mas agora pelo menos consigo me mover. — completei por fim dando um pequeno passo para frente. Eu me sentia de alguma forma mais forte. Não acreditava que aquilo seria o suficiente para me fazer superar Kojiro, mas seria o bastante para aquele treinamento.

Sem mais enrolar, parti na direção do Jounin. Eu levantei uma mão na metade do caminho como se estivesse pronta para lhe desferir um soco. Eu me sentia mais forte fisicamente, mas minha aptidão de combate ainda parecia a mesma. Não me agregaria em nada entrar em combate de Taijutsu, que sou péssimo. A mão era apenas uma finta, porque me joguei no chão para aproveitar o impulso e passar pelo lado do homem afim de ir para nas suas costas. Me senti mais veloz, e essa sim foi a diferença mais notável para mim. Enquanto eu derrapava no chão, tentei mover as mãos em selos. Eu estava confiante de que minha manobra seria um sucesso, então mantive o último selo pronto para quando tivesse o ângulo necessário para pegá-lo de costas.

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