A noite para ela é como uma dança sendo apresentada para ninguém, pode ser a mais bela que for que não haveria platéia. As estrelas seriam os olhos daqueles que foram para o outro mundo, o pós-vida. Irelia sabia que certas estrelas estariam a observando em sua jornada, os olhos das pessoas que morreram naquele dia. Lito, seu pai, nem mesmo a viu antes de morrer. Seus irmãos, seus amigos, todos mortos.

A Xan ficava no telhado de sua casa em Iwagakure, observando o céu, talvez desejando que algum dia aquelas pessoas voltassem para ela. Sabia que não voltariam, ela somente tinha que vingá-los por tudo que fora feito com eles. A mulher quis lembrar-se de sua infância, quando aprendia a dançar com sua avó. De cima do telhado, fez os movimentos suaves da dança que fora ensinada em seu pequeno vilarejo e no Placídio de Navori. O vento que tocava a sua pele era como falas de sua avó a ensinando, o som suave dos movimentos traziam as memórias de sua família, quando observavam à dançarina mostrar seu talento. Lágrimas saiam de seus olhos, viajando por suas bochechas e caindo devagar até chocar-se com o chão. Cada gota simbolizava a perda de um familiar, amigo ou conhecido nas mãos daquela vila que a dançarina somente decidia chamar de “Maldita Vila”.

A performance durou alguns minutos, depois a kunoichi desabou ajoelhada no telhado, cerrava sua mão direita com força. – Eu vou... Eu vou conseguir vingá-los! Prometo! – falava com aqueles que já morreram, socando o chão. Ali começou a ouvir um barulho anormal, vários pássaros voando em uma única direção, o som era até alto, todos indo para uma região pouco povoada da vila. Irelia levantou-se e observou para onde estavam indo, nisso decidira saber o que estava acontencendo.

O cantarolar das batidas dos pássaros negros atraia Irelia para segui-los para seu destino, a mulher observou em meio às lágrimas o que aquilo poderia significar, podia filosofar pela madrugada inteira se isso era um sinal divino ou que aqueles que ama haviam reencarnado em meros pássaros. Ela era mais do que isso, era a pessoa que agia, nisso então pulava de seu telhado e movimentava-se pelas ruas da vila para aonde as asas batiam. Vivera tempo o suficiente em Iwagakure para saber que esse tipo de acontecimento não era normal, nem mesmo no País da Terra. Seus passos eram calmos, não havia pressa, sabia muito bem que não era uma ameaça, coisa que realmente não era.

A luz da Lua a guiava dando a luminosidade necessária para caminhar pelas ruas, os pássaros voavam para seu destino e a dançarina os seguiam de forma tranquila.

A caminhada enfim chegara ao seu final quando Irelia deparou com a entrada do campo de treinamento, ela observou o campo de sexo e pedregoso, sem poucas árvores ou até mesmo água, estranhou. “Por que pássaros viriam até aqui?”, pensou a kunoichi. Deu um passo para dentro do local, e parecia que tinha ativado uma armadilha, os pássaros negros cantarolavam imediatamente, os sons dos corvos invadiam a mente da mulher de cabelos brancos, uma dor de cabeça começava a surgir, mas era leve e dava para aguentar. — Corvos… Por que estão aqui? – questionava a eles, mesmo sabendo que não poderiam responder. Observava os olhos avermelhados de cada um ali, algo estava acontecendo.

A reunião de corvos ali naquele local de certa forma assustou Irelia, que observava tudo aquilo com desconfiança. Os corvos, além de cantar, também olhavam para a mulher que havia entrado no território deles. Tinha cerca de cinquenta ou sessenta pássaros negros ali, distribuídos pelo redor do campo. Enquanto a dançarina caminhava para o centro, eles se adaptaram a posição dela, querendo que a kunoichi viesse a ser cercada pelos corvos. Os cabelos brancos da garota começavam a voar com o vento forte que batia ali. A dor de cabeça havia passado com os segundos, podia raciocinar melhor. Aquilo cada vez mais parecia ser uma convocação para uma reunião do que simplesmente a Irelia ser uma “invasora” do local deles. O cantarolar passou, as aves se calaram. Um clima tenso surgia, a mulher de cabelos brancos no centro daquele campo, rodeada de corvos, a qualquer segundo algum ataque em massa deles começaria. Os olhos avermelhados das aves obscuras se fixaram na dançarina, ainda quietos. Um julgamento por parte do reino das aves para a Xan? Sim e não. Uma avaliação seria uma descrição melhor. O silêncio durou pouco minutos, Irelia já estava atenta a qualquer movimento brusco e ofensivo dos arredores. — O que vocês querem? – disse ela. A pergunta surtiu efeito. Um corvo pousa em sua frente, a poucos metros dela. Emitia o som característico de sua espécie três vezes. A dançarina o observou com cuidado, percebia penas brancas em meio a maioria de penas pretas, um corvo mais velho? Depois de seu som, o silêncio retornou, e ela alçava vôo, um pouco acima de quatro metros e pousa na maior pedra do campo, uma sombra surgia por trás dela, Irelia percebeu e já postava em batalha. De repente, todos os corvos ao seu redor começavam a explodir em fumaça branca, com exceção daquela velha ave. — Você chamou atenção delas com sua dança… – disse uma voz, em tom feminino. — Gostaram de você, bela dançarina, onde aprendeu tais movimentos? – finalizou. Uma expressão séria surgia em Irelia, seria uma ameaça?

Uma nova presença, uma mulher nas sombras de um corvo. Irelia ouviu suas palavras, não a atrapalhou, esperou por sua deixa. A situação tomou rumos que a dançarina não esperava. Seria aquela voz uma ameaça para a vila? Os corvos… eram inimigos? — Por que eu teria que te contar? – retrucou Irelia, um pouco agressiva. A reação daquela que estava escondida foi de surpresa, não esperava ignorância por parte da kunoichi de Iwa. — Não sou uma ameaça, mulher. – a voz retornou. — Estou aqui para saber o porquê dos corvos gostarem de você. – revelou seus motivos. A Tokujō refletiu por alguns segundos: “parece plausível essa indagação?”, foi o que pensou. Como pássaros poderiam gostar de uma mulher que dançava, o que esta dança significava para os corvos? — A dança… eles gostaram da dança? – perguntou Irelia, um pouco menos agressiva. Das sombras então apareceu a tal voz, longos cabelos vermelhos e olhos azuis, ficou ao lado do corvo ancião. — Sim, sua dança tem algo especial. – respondeu. A misteriosa mulher era bonita, suas roupas eram negras e podia se esconder facilmente pelas sombras. A dançarina exitou por algum momento, devia contar sobre sua vida? Confiar em alguém que acabou de se mostrar? Teria que arriscar. — Aprendi com minha vó, na vila de Ionia. – abriu o jogo. A ruiva observou a Xan por alguns segundos. — Olha só… uma Xan. – disse ela. — Pensei que as Fontes Termais tivessem exterminados todos. – continuou, mas com algum pesar em sua voz. — Você é uma guerreira, Xan. – a elogiou. A domadora dos corvos parecia saber dos segredos da família Xan. — Como você sabe sobre minha família? – a agressividade voltou para a dançarina. — Notícias correm por aí, não é fácil segurar um acontecimento de tal gravidade. – explicou. — Não venho aqui para lhe ameaçar nem para te matar, os corvos sentiram interesse em você, sua dança os cativaram. – revelou. — Eles pediram… para se juntarem a você. – disse ainda com dúvidas. — Já ouviu falar em Kuchiyose no Jutsu? – perguntou. — Algumas vezes. – respondeu Irelia. — Isso pode parecer um estranho, mas irei lhe ensinar a invocação de corvos. — Hm? – a dançarina somente emitia esse som.

A fala daquela ruiva a frente de Irelia foi um tanto estranha para a dançarina. Soltou um único “hm” quando ouviu que ela ensinaria a invocar corvos. — Por quê? – indagou a Xan. A ruiva desce então de sua pedra com o corvo ancião em seu ombro. — Não sei, pergunte aos corvos. – respondeu a misteriosa mulher despreocupada. — Está brincando comigo?! – a típica agressividade de Irelia surgiu. A ruiva via que a kunoichi da Pedra poderia ser um perigo. — Estou de falando a verdade, se acalme. – explicou-se. — Os corvos parecem que se identificaram com sua dança, é como se fosse algo deles. – tentou se justificar. — A dança que fez era tão suave quanto eles. – falou. Irelia deu alguns passos em direção a ela, tanto sua expressão facial e corporal não diziam que seria algo amistoso e não-letal. — Por mim, eu continuaria sendo a única com a invocação, mas foram eles que pediram a mim, estou fazendo um favor a eles. – aquilo era tão sincero que fez Irelia questionar a si mesma se devia ser agressiva com ela ou não. — O que eu ganho com eles sendo minha invocação? – perguntou a Xan. — Eu consigo enxergar uma utilidade: ocultação. Você tem um estilo que pode combinar com os corvos se bem trabalhado. – respondeu a ruiva. Realmente Irelia decidira ser uma ninja que se trabalhasse nas sombras. — Como começamos? – perguntou Irelia com interesse.

A Xan cedeu às explicações daquela ruiva em sua frente, acreditou que os corvos estavam mesmo querendo se juntar a ela. A domadora das aves negras a observou mais uma vez, com certa surpresa por estar tomando a iniciativa de querer aprender. — Você não é tão cabeça-dura quanto havia pensado ser. – de certa forma a elogiou — Meu nome é Ana. – apresentou-se, simpaticamente. — Irelia. – rápida e seca disse a Xan. — Bonito nome. – Ana disse de repente, Irelia estranhou a fala e olhou com alguma dúvida para ela. — Obri...gado… ? – de fato aquilo soou estranha para as duas ali. Irelia não tinha dito uma relação amorosa, até por que o tempo nem as Fontes Termais deixaram isso acontecer. — Ai, isso foi muito estranho, vamos começar vai. – dessa vez a iniciativa era tomada por Ana. — Primeiro tem que aprender a invocação comum, os selos e etc. São esses. – com isso mordeu o dedão destro e fez uma sequência de três selos, em seguida bateu a mão no chão. — Kuchiyose no Jutsu! - anunciou e diversas fumaças brancas explodiram ao redor das duas. Depois de alguns segundos, os mesmos corvos haviam retornado. — É fácil. – falou Ana despreocupada. — Percebi. – respondeu a dançarina. A Xan então repetiu a sequência que a sua recém professora fez, mordeu seu dedão, porém a kunoichi havia a habilidade de fazer os selos com uma mão só. — Selos com uma mão? Você é diferenciada, Irelia. Vi poucos com tal treinamento. – novamente a elogiou. A mulher de cabelos brancos bateu a mão no chão. — Kuchiyose! – proferiu de forma agressiva. Uma fumaça surgiu ao seu lado, porém nada apareceu. — Por que apareceu nada? – perguntou a Xan. A ruiva abriu um sorriso.

— Por que está sorrindo? – perguntou Irelia não satisfeita com o resultado que obteve em sua primeira tentativa em invocar alguma coisa. — Não é nada, é que você não vai conseguir invocar nada sem um contrato. – respondeu Ana, ainda sorrindo. Contratos são um meio de um animal se ligar a um shinobi para que se possa invocar em inúmeras ocasiões. A Xan poderia ter aprendido bem na Academia a teoria, mas parecia que a escola esqueceu a parte mais importante das invocações. — Contratos são feitos através de pergaminhos que os animais têm em seus lares, aquele que quer invocar alguma espécie, deve escrever seu nome em sangue, entendeu? – explicou Ana para a dançarina, que prestava atenção em cada palavra dela. — E onde posso assinar esse contrato? – questionou a kunoichi da Pedra. A ruiva demorou um pouco para responder, ficou observando o corvo ancião por alguns minutos. — É isso que vocês querem mesmo? – a moça de cabelos vermelhos indagou a aquela ave que estava em seu ombro. — Sim... Sinto que ela tem uma ligação com nós. – revelou aquele velho corvo. — Então mostre o pergaminho para ela, oras! – brincou Ana. O pássaro negro desceu do ombro esquerdo da mulher e ficou a quatro metros a frente de Irelia. Bateu as asas algumas vezes até um pergaminho aparecer de repente em frente à mulher de cabelos brancos. — Ai está, assine seu nome ao lado do nome de Ana. – explicou. — Após isso, poderá nos invocar. – finalizou. Irelia agachou em frente ao papel, leu o nome da ruiva, realmente era para escrever em sangue. Aproveitou-se do sangue que usara na tentativa de invocar e escreveu seu nome: “Xan Irelia”. Finalizada a escrita, o pergaminho se fechou e desapareceu. — Agora você poderá invocar os corvos, quer testar? – falou a ruiva entusiasmada.

— Agora você pode invocar os corvos. – disse Ana a Irelia, que havia acabado de escrever seu nome em sangue em um pergaminho especial dos corvos. — Cada minuto que passa consigo identificar as semelhanças deles com você. – falou com uma voz até que doce para a situação, a estranheza voltou para aquele campo de treinamento. —... – a dançarina somente ficou quieta com a fala da ruiva, que corou ao perceber que havia passado vergonha. — Vamos esquecer isso, ok? – falou a domadora dos corvos ao perceber que sua tentativa de aproximação não foi muito efetiva com Irelia. — O próximo passo é aprender invocar os pássaros negros para lhe ajudar nas batalhas, já que esse é seu objetivo, certo? – pedia uma confirmação para a mulher de cabelos brancos. — Podemos dizer que sim... Ana. – respondeu a Xan. A kunoichi somente esperava pelo primeiro ensinamento de Ana, que refletia por alguns minutos sobre o que iria ensinar. Em um momento uma idéia veio. — Já sei o que iremos fazer! – falou a ruiva já tecendo alguns selos. Poucos corvos surgiram ao seu redor, planando em suas costas. — O que iremos fazer é simples: você terá que lutar contra os corvos. – explanou Ana. Irelia de momento estranhou, franzindo a testa em surpresa. — Como assim lutar? – perguntou um tanto curiosa. — Se lutar com eles, vai gerar uma afinidade entre vocês, facilitando o aprendizado da invocação. – explicou sua idéia, que não era de toda ruim. — Se prepare Xan Irelia, não será fácil. – Ana adotou uma postura de batalha. — Pode vir. – desafiou.

Uma luta teste, os corvos contra Xan Irelia, a kunoichi de Iwagakure. O contrato estava feito, mas ainda precisava ter mais afinidade com as aves da noite, por isso Ana trazia a ideia de uma luta entre eles e a dançarina. Cerca de vinte corvos de posicionaram ao redor dela, já batendo suas asas a quinze metros de altura. — Preparada? – perguntou a ruiva com um sorriso no rosto. — Pode mandar! – exclamou Irelia, a mulher dos cabelos brancos gostava de uma boa luta, e ali era um bom treinamento. Os corvos então começaram a cantar direcionando suas vozes aos ouvidos da Xan, que se sentiu incomodada, mas logo acostumou-se ao canto agudo deles. Um corvo atrás do outro foram em direção a Irelia, que os observava com atenção a cada movimento deles, a investida do primeiro fora facilmente desviada com um passo simples para o lado, a velocidade dele não se equiparava com a da dançarina. Os ataques subsequentes eram na mesma velocidade que o primeiro, lentos demais para a mulher, para ter uma fluidez melhor em se defender, começou a dançar por entre as aves, a mesma dança que aprendia durante sua infância. A graciosidade de Irelia cativava Ana, que boquiaberta observava. — Que linda... – soltou sem querer. — É por isso que a escolheram, a dança é um conjunto de movimentos de defesa... E com ela, isso vira um espetáculo! – exclamou, impressionada com a capacidade da dançarina se movimentar e desviar. Dado todos os ataques, era hora de revidar. Irelia não pestanejou em retirar uma kunai da sua bolsa ninja com a destra, e logo já saiu cortando, em sua velocidade máxima, todos os corvos que ali estavam fazendo todos explodirem e voltarem para seus lares. Não durou um minuto sequer para todos serem derrotados para ninja, que ficava de cara fechada após a vitória. — Você foi ótima! – elogiou Ana. — Com essa pequena luta, você conseguiu alguma afinidade com eles, está na hora de invocá-los. – anunciou a ruiva. — Tudo bem... – falou Irelia, um tanto cabisbaixa. Aqueles movimentos de defesa... a dança... fizeram a Xan lembrar de sua avó e dos professores do Placídio de Navori, todos mortos nas mãos daquele almirante e sua vila maldita, ela tinha que derrotá-los o quanto antes, por isso deveria terminar logo seu treinamento com os corvos.

— Está tudo bem, Irelia? – perguntou a ruiva para a kunoichi, estava preocupada com a feição triste dela. — Sim, sim, estou bem. – respondeu a Xan meio sem graça, abrindo um sorriso falso, ela podia ser agressiva, mas tinha um fundo de tristeza em sua personalidade. — Agora você tem que invocar os corvos. – Ana então se pôs a frente de Irelia. — Ei, se está acontecendo alguma coisa, me fale. – a misteriosa mulher disponibilizou-se para ajudá-la, mas isso não foi tão aceito por Irelia. — Conheci você essa noite, eu ainda nem confio em você, por que está agindo assim?! – respondeu de forma agressiva, retornando a sua personalidade. Ana ficou um pouco assustada, e logo ficou triste por ter sido recusada. — Somente faça os selos e invoque os corvos, depois disso estou sumindo. – falou seca. —... – Irelia respondeu nada. A dançarina se afastou de Ana em dez metros para trás com isto. O sangue que havia sido usado para escrever seu nome no pergaminho já estava seco, inutilizável para realizar a invocação. Mordia a ponta de outro dedo, saindo alguns pingos do líquido carmesim, passou na palma da mão direita em um traço horizontal. A destra sozinha fez selos rápidos. — Kuchiyose no Jutsu! – proferiu Irelia ao bater a mão direita no chão. Dezenas de pequenas fumaças brancas surgiram ao redor dele e logo se revelaram como corvos. Ana sorriu ainda um pouco triste. — Você conseguiu, parabéns. – parabenizou a kunoichi da Pedra. — Estou indo, fiz a vontade dos corvos, aproveite-os. – uma lágrima caiu de seu olho direito quando se desmaterializou nos próprios corvos, que voaram para o céu e seguiram seu caminho. Irelia observou tudo aquilo sem cair a ficha do que havia feito com Ana, ela tinha seus motivos. Para finalizar, desfez todas as invocações e começava seu caminho para casa.