Batsuki havia recebido as instruções da missão uma noite antes, pois, de acordo com os oficiais, ele precisava estar muito bem preparado para sua primeira missão saindo dos limites da vila. A viagem, porém, não era nada demais. Apenas ir até um centro próximo, conhecido pelas pesquisas de ervas do país. Além disso, o outro motivo, talvez o principal, para terem dado a ele mais tempo que o normal era a personalidade do contratante. Mandão, era a descrição. Ali também dizia que caso ele se sentisse incomodado durante a missão poderia conceder a falha ao ninja. Batsuki não era conhecido como uma pessoa calma, as pequenas explosões causadas na academia e ocorrências de brigas na escola eram prova de sua agressividade, portanto, era importante ter como refletir um pouco antes da missão e buscar maneiras de não explodir contra o pesquisador ao qual devia proteger a vida.

Naquela noite, ele pediu conselhos à mãe, que embora fosse explosiva tinha vivido por anos com um homem abusivo e violento sem causar problemas — mas ele ocultou essa motivação. Ela ensinou técnicas de respiração; puxar o ar contando até cinco, segurar até três e soltar pela boca até cinco. Era a única coisa que ela conhecia e a única que ele teria tempo para experimentar naquela noite. E, antes de dormir, foi isso que trabalhou. Aprendeu como fazer uma técnica tão básica de respiração, mas o resultado foi apenas ele atirando os travesseiros contra a parede.

Durante a manhã seguinte, ele estava pronto para a missão desde cedo. Vestiu o uniforme ninja, conferiu as armas dentro da bolsa e comeu um café da manhã reforçado. Quando saiu de casa, o clima primaveril era tão agradável que ele até sorriu. Também estava um pouco mais animado do que o normal porque estava se sentindo mais ninja naquela manhã. Sua primeira missão fora do vilarejo, mas ainda mais importante, era a primeira missão com riscos de combates reais. Sentia-se invencível.

Quando chegou nos portões, onde estava marcado para se encontrar com o pesquisador, não foi difícil achá-lo. O homem era uma figura… única. De cabelos brancos em pé, corpo esguio e óculos redondos fundo de garrafa, aparentava não ter sanidade alguma. Carregava consigo um compartimento coberto por um pano branco. Batsuki se aproximou dele, acenando, na esperança de ele não ser tudo aquilo que os relatórios insistiam em chamá-lo.

—— Bom dia! Meu nome é Mangetsu—
—— Tanto faz. Vamos logo, pirralho, essa belezinha aqui não será levada ao Centro Botânico da Terra sozinha.
—— Como é…? —— Batsuki fechou os olhos, o coração bateu mais forte, cheio de ódio. Detestava ser interrompido, ainda mais para receber ordens. O tom de voz contido revelava toda a sua ira.
—— Ouvi uma reclamação?! Posso agora mesmo ir pedir um ninja disposto a fazer esse serviço!
—— Não, não, não! —— Batsuki balançou as mãos à frente do corpo, notando a postura do homem prestes a seguir para dentro da vila. Respirou fundo, enchendo os pulmões até cinco, soltando depois. Uma veia acima da sobrancelha doía de tanta vontade de xingá-lo. —— Eu só não conheço o Centro Botânico, foi essa a minha pergunta —— mentiu.

O velho mexeu nos óculos e aproximou o rosto ao do menino. Batsuki trancou a respiração, com medo que ele percebesse a verdade. Após uma última ajeitada, ele assentiu. Apontou para o horizonte e gritou, eufórico, com o compartimento sacudindo o pano: —— Vamos então!

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Viajar não era um problema para ninjas bem treinados na Academia. Desde os primeiros meses, eram ensinadas táticas de sobrevivência, as melhores maneiras de fazer uma viagem, até como notar riscos na estrada. Batsuki nunca teve problema algum em aprender essas coisas. No entanto, nenhuma disciplina, professor ou colega lhe preparou para andar com uma pessoa tão excêntrica.

Hanamaki, o contratante, era uma pessoa… estranha. Os primeiros minutos da caminhada foi silenciosa e sem maiores problemas. Até que se afastaram o suficiente da vila para o mundo externo começar a se erguer, revelando uma paisagem bastante única, que o menino só conhecia através de livros. O homem, porém, também parecia conhecê-los apenas de figuras, pois fazia questão de interromper a jornada para ficar observando, anotando e colocando o compartimento no chão sem nenhuma segurança. Aquilo foi incomodando o menino porque sabia que sua missão dependia da proteção daquele objeto, embora não soubesse do que se tratava.

A paciência do garoto, porém, não durou mais que uma hora.

—— Hanamaki-san, nós precisamos—
—— Hanamaki-sensei —— ele o corrigiu. —— E não gostei desse tom, deveria avisar os superiores como seu trabalho foi péssimo e deveria ser considerada uma falha?

Batsuki abriu a boca para xingá-lo, as palavras coçaram em sua língua, mas não podia. Tinha que se controlar. Trincou os dentes, baixou a cabeça, respirou fundo. A irritação não foi embora, mas conseguiu ao menos elaborar uma nova resposta ao invés de um simples vai se foder. Não forçou uma aparência simpática, contudo. Levantou o queixo com um sorriso forçado, claramente desconfortável.

—— Claro que não, sensei. Só precisamos ir mais depressa, do contrário, as estradas podem ficar mais perigosas do que o esperado para uma missão dessa classificação.
—— Por isso contratei um ninja.
—— Sim, mas…

Hanamaki o encarou esperando a grosseria do menino. Batsuki não mordeu a isca. Preferiu voltar ao exercício de respiração. De certa forma, o pesquisador tinha razão. Seu trabalho era protegê-lo. Se as coisas ficassem complicadas a culpa não era de Hanamaki e ele não devia resmungar essas coisas, apenas enfrentá-las como um bom soldado. Não era muito difícil dos treinamentos com seu pai, quando era atirado para sobreviver sem muitas condições; só que agora ele não acabaria com as calças molhadas.

Continuaram mais alguns minutos entre pausas e caminhadas. Se continuassem daquele jeito, o anoitecer cairia antes que chegassem no destino… e isso traria bandidos com toda certeza do mundo.

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Depois de um tempo ficava mais fácil aturar a excentricidade do pesquisador. Batsuki ainda estava incomodado, mas não ao ponto de estourar com ele. Porque viu nele um interesse genuíno no mundo ao redor. Algo difícil e estranhamente bonito de assistir. Embora fosse um velho rabugento, havia alguma coisa nele que em muito lembrava uma criança inocente que está aprendendo como o mundo funciona e existe ao seu redor. Lembrava ele mesmo, quando menor, antes da morte do pai e das tentativas constantes de provar-se digno de continuar vivo.

Contudo, o tempo estava passando. A viagem não devia durar mais de quatro horas, contando com pausas para descanso. Já estavam há três horas caminhando e ainda estavam na metade do caminho. Aquilo começava a preocupar o jovem — e isso significava irritá-lo. Enquanto o velho tomava anotações, ele fazia o exercício de respiração ensinado pela mãe. Àquela altura, começava a fazer mais efeito do que pensava ser possível. No entanto, conseguir manter a calma não significava não achar problemas na situação.

—— Talvez seja melhor fazermos uma pausa.
—— Não estou cansado —— Hanamaki protestou.
—— Eu também não, mas a estrada pode começar a ficar mais perigosa. Começando a anoitecer… não, antes mesmo disso, estamos entrando num caminho de risco. Muitos bandidos e contrabandistas passam por aqui, de acordo com relatórios.
—— Basta você me proteger. Ou será que você é incapaz?

Batsuki abaixou a cabeça, as mãos na cintura e o suspiro falavam por si. Precisava respirar fundo, não explodir. Tinha conseguido por três horas, conseguia mais um pouquinho, não?

—— ESCUTA AQUI SEU VELHO IDIOTA VOCÊ ACHA QUE EU NÃO CONSEGUIRIA DERROTAR UNS MEROS BANDIDINHOS DE MERDA? HAHAHAHAHAHA!
—— Isso foi rude, mas deixarei passar. É bom saber que está confiante das próprias capacidades.

A resposta pegou o menino de surpresa. Toda sua expressão irritadiça se desfez como areia no vento. O pesquisador se agachou para observar uma flor de pétalas brancas. Apoiou o compartimento no chão, mas dessa vez sem soltá-lo como vinha fazendo nas outras vezes. Tocou na flor com delicadeza, por mais emburrado que fosse tinha cuidado com a natureza.

—— Porque se você não tiver confiança em si mesmo, quem terá em você? Lembre-se disso, garoto, não mostre insegurança diante da vida, pois ela irá tentar derrubá-lo mesmo sem que faça. Transforme seus medos em motivação, encontre razões para continuar enfrentando as adversidades e floresça belamente.

Hanamaki se levantou e deu batidinhas nas roupas, tirando a poeira. Batsuki assentiu, desviando o rosto de bochechas vermelhas. O velho passou na frente dele ainda com o compartimento balançando, chamando sua atenção para continuarem a jornada. Desconsertado, o garoto não reclamou, nem deu nenhuma sugestão adicional. Apenas o seguiu achando que era o certo, ignorando os riscos que sabia existir por estar submerso demais naquele momento motivador.

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Cada escolha tomada nos leva a um caminho diferente. Batsuki entendia isso perfeitamente. Pensava assim sobre o próprio passado; se o pai não tivesse escolhido atacá-los ele não teria despertado seus poderes, muito menos o assassinado com eles. No entanto, às vezes, tomamos decisões sem nos aprofundar nos riscos. Batsuki não estava isento disso, ainda mais com toda a inexperiência como ninja. Talvez se tivesse um pouco mais de anos de caminhada shinobi não tivesse sido levado pelas emoções ao ouvir o discurso motivacional do pesquisador. Com isso, teriam se preparado melhor, feito uma pausa, planejado melhor a jornada dali em diante. Contudo, não foi essa a escolha tomada.

O clima foi amenizando conforme o dia findava, as árvores ao redor deles começavam a ficar cada vez mais altas e cheias de vida. Aquele não era um ambiente comum na vila. Contudo, ele não percebeu que, além disso, era também diferente das estradas que ele vinha cuidado até então, todas muito abertas e fáceis de notar presenças incomuns. Hanamaki agachou-se para observar uma série de cogumelos crescendo no pé de uma árvore e deixou novamente o compartimento no chão. Teve de soltá-lo por um instante para manusear o cogumelo com ambas as mãos. Tempo suficiente para um vulto descer do galho da árvore, escondido num manto preto, agarrar a alça do compartimento e correr.

Batsuki não teve uma reação imediata, pois levou alguns segundos para entender o que estava acontecendo. Hanamaki precisou gritar para ele não deixá-lo fugir com a pesquisa dele. A distância entre eles já era considerável, mas nada que um ninja não pudesse quebrar. Lançou-se na direção dele, sentindo o vento raspar suas bochechas. A primeira batida mais forte do coração trouxe um sorriso aos lábios do menino, a emoção de estar entrando em um combate de verdade pela primeira vez como ninja. Conseguiu alcançar o bandido, empurrando-o com o antebraço contra suas costas, ficando em cima dele com os joelhos pressionando um dos braços dele e a coluna, uma mão agarrou a outra dele o imobilizando completamente.

O compartimento caiu rolando, os panos se perderam na ação. Tratava-se de uma redoma de vidro com uma flor dentro. Uma rosa negra, com espinhos pronunciados em seu caule e uma espiral no centro da folhagem. Ele nunca havia visto nada parecido. Hanamaki correu agarrando-se ao compartimento como se sua vida dependesse daquilo, pedindo desculpas à flor. Cobriu-a novamente cheio de desculpas. O bandido tentou se mexer debaixo do genin que impôs mais força nele, mandando-o ficar quieto.

—— Juro que se você tentar alguma coisa que te explodo —— falou sorrindo como um verdadeiro maníaco. O rosto do bandido se encheu de medo. O ninja voltou-se ao pesquisador. Estava furioso com aquilo, pois, se não tivesse sido tão bobo em soltar o objeto no chão daquela maneira, nenhum susto teria ocorrido. No entanto, bastou puxar bem fundo o ar e soltar todo de uma vez, acalmando não só os pensamentos como a própria expressão. —— Está tudo bem com o material?

Hanamaki assentiu calado.

—— Graças a você.
—— É meu trabalho —— disse tirando um rolo de fios de aço da hip-pouch. Mordeu uma ponta e puxou uma quantia considerável. Amarrou as mãos do meliante atrás do corpo, guardou o equipamento e levantou-se, colocando-o junto dele como um refém. —— Esse merdinha aqui vai ter muito tempo pra pensar na merda quando estiver preso.
—— Não fique muito ansioso por isso, Batsuki-kun —— Hanamaki avisou. —— Embora tenhamos um sistema militar forte, certas coisas passam batidas. As forças militares estão preocupadas com pessoas com poderes como os seus, não com arruaceiros como ele.

Batsuki não quis acreditar naquilo, mas o sorriso no rosto do bandido parecia confirmar aquele pensamento. Apesar da decepção, ele apenas aceitou o momento.

—— Vamos, você ainda tem que me levar até o Centro Botânico.
—— Hum-m. —— Batsuki balançou a cabeça. Não quis xingá-lo, apesar do estresse enfrentado. Depois daquele instante de combate, parecia inútil continuar a discussão.

Ainda teve de fazer a técnica de respiração algumas vezes nos passos seguintes, mas não estava pronto para explodir — estava pronto para concluir aquela missão com êxito.

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Os últimos momentos da caminhada foram amenos, embora estivessem com um criminoso durante boa parte dele. Hanamaki não fez mais pausas, manteve-se próximo do ninja e agarrou-se ainda mais forte ao compartimento da rosa negra. Batsuki notou como ele estava agindo estranho e, embora estivesse se irritando com aquilo, preferiu uma abordagem mais tranquila.

—— Essa rosa negra é muito bonita.
—— De fato, mas também muito perigosa.
—— Sério? Não parece.
—— Tenho certeza disso. Ela, no entanto, pode causar mudanças significativas no curso da história do nosso país. Nunca vista antes, os primeiros testes que fiz indicam capacidades...

Batsuki não estava entendendo nada. Aquela não era uma área que ele apresentasse interesse genuíno. Hanamaki notou, é claro. Como um bom pesquisador que sabe o momento de parar. Balançou a cabeça, como se não importasse. O menino não insistiu, a entrada da cidadezinha de destino surgiu diante deles e assim o silêncio os envolveu. Cumprindo o dever ninja, ele entregou o criminoso ao guarda local, avisando que precisava terminar sua missão. Seguiram juntos em silêncio até a frente do Centro Botânico, uma enorme construção de fachada branca cheia de vidros.

—— Parece que você concluiu a missão apesar de não ter modos.
—— Olha quem fala —— Batsuki debochou, mas não havia agressividade alguma na sua voz. Hanamaki sorriu.
—— Qual o seu Caminho Ninja? —— ele tirou um carimbo do bolso, a missão só determinava levá-lo, não voltar com ele para a vila. Pediu o pergaminho com um aceno e o menino o abriu com as informações da missão. Bateu o carimbo dando a aprovação que ele almejava.
—— Me tornar o maior ninja de Iwagakure.
—— Maior ninja… hein? Um sonho enorme. O meu é encontrar formas de melhorar a vida das pessoas. Talvez estejamos em sintonia, pois seu sonho começou a ajudar o meu quando aceitou essa missão. Por isso, deixe-me ensinar uma lição que meu antigo mentor me ensinou.

Batsuki ficou atento ao que ele diria — seria, provavelmente, o último contato deles. Hanamaki guardou o carimbo e ao tirar a mão do bolso fez um V de vitória emendando seu grande ensinamento: —— Vai com tudo —— e pôs a língua para fora. Apesar de não ter a profundidade filosófica que esperava, foi o suficiente para fazer o menino sorrir.

—— Eu irei.
—— Por isso chegará lá.

Hanamaki tocou no ombro dele como um agradecimento silencioso e deu as costas entrando no Centro Botânico da Pedra. Sorrindo, o menino também deu as costas para o pesquisador, mas na direção oposta, ao caminho da guerra e do militarismo. Voltar para a vila sozinho não seria tão divertido assim. Ele achava até que sentiria falta da estranheza do cientista. Estarei mais forte da próxima vez que nos encontrarmos, ele prometeu em silêncio e foi embora da cidade deixando apenas a silhueta do enorme prédio para trás.

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