Eu detesto calor. Completa e absolutamente. Em um nível cósmico, eu diria, sem falar das debilitações que ele causa ao meu corpo. Agradeço muito — mentalmente — quando fazemos uma pausa à sombra. Tiro o cantil da bolsa e sacio a sede antes mesmo do meu vício me chamar. Me sento no chão sem cerimônias, resfolegando. Eu sei que não estou o mais apto dos shinobis no momento.

A proposta de nos conhecermos melhor me pega de surpresa. A viagem até ali havia sido majoritariamente silenciosa além do papo geográfico. Já fico feliz assim, eu penso. Não estar sozinho já me basta.

É nosso mestre quem começa e, não sabendo que era possível, consigo achá-lo ainda mais legal. Eu também tinha um apreço muito grande pelo conhecimento e pela ciência. Não havia me aprofundado no estudo do Chakra, afinal, os arquivos eram limitados para um Genin como eu. Apesar de parecer muito interessante, recolho minhas perguntas enxeridas por timidez. Quem sabe quando demonstrasse ser merecedor daquele conhecimento. Minha curiosidade maior, todavia, flutua naquele alerta da Mizukage: os tais vícios. Levanto a mão para perguntar, mas novamente sou impedido pela vergonha. Abaixo-a.

Na vez de Nanami, foi inevitável não vê-lo como um irmãozinho. Assistir aquela euforia era contagiante, uma sensação boa. O pequeno tem mais coragem e experiência que eu. Aquilo não me ofende, muito pelo contrário; era admirável ver a determinação estoica de alguém mais novo, uma motivação para melhorar.

Minha vez. E agora? Devo me abrir? É vergonhoso demais, concluo. Porém... Quando alguém tinha perguntado sobre mim, diretamente? Desde a formatura na Academia, tudo que eu vinha fazendo era ir para lá e para cá sem pestanejar. Se eu queria valorizar aquela equipe, eu devia começar com honestidade. Começo a falar, então — para minha surpresa, tudo vem numa torrente.

— E-eu quero ser bom... nisso — digo, e minha mão vai até a bandana em meu pescoço. — Nisso. Meu corpo é frágil e sou péssimo em combate. Meu avô é um bêbado e minha mãe é uma Hōzuki que preferiu ter uma mercearia do que o caminho shinobi. Eu cresci com as lendas piratas do nosso clã, com os pergaminhos de histórias fantásticas do passado, e achei que poderia fazer algo parecido se virasse um ninja — dou uma risadinha amarga e me encolho, sentindo minhas bochechas corando. — Demorei mais tempo que os outros pra me formar, meu controle de Chakra é péssimo, sequer consigo utilizar minha técnica principal direito... Quase morri em Sunagakure. — Kira. Evito a lembrança. — Eu só quero... pertencer. Lembro da sensação de quando meu corpo virou água pela primeira vez, enquanto eu estava nadando no mar. Estar à deriva, sendo parte de algo maior. Quero... isso. — Suspiro. — Algo que valha a pena dedicar minha vida. Ou então morrer. Achei que fazer parte da força militar de Kiri seria o suficiente, mas as coisas tem sido mais complicadas do que eu esperava. — Sorrio sem jeito. — Bom, ao menos, agora... t-tenho... v-vo-vocês...

Espera, o que tinha acabado de acontecer? Por que eu falei tanto? E esse final constrangedor... Me encolho mais ainda. Agora já era, não dava para engolir aquelas palavras de volta. Apenas iria prosseguir timidamente com os comentários sobre meu desabafo e qualquer outro relato pessoal advindo dos dois, caso fossem feitos. A única coisa que busco acrescentar é direcionada à Nanami:

— Nanami — chamaria baixinho o loiro agitado. — S-Se possível, um dia, eu gostaria de conversar mais sobre o seu clã... Como eu disse, tinha um Yamanaka na missão que fiz. Tenho curiosidade de entender como vocês fazem... aquilo — diria, apontando pra minha própria testa. — na mente.

Finalizadas as interações e recuperado o cansaço pelo calor, seguiria em conjunto para Uzushiogakure, nervoso, ansioso e atento para investigar o lugar novo.

Faço uma reverência para a hospitalidade da taverna e sigo pela cidade junto do time. Tento bocejar da forma mais sutil que posso, mas o cansaço da noite mal dormida cobra seu preço. Ainda assim, nesse estado de sonolência, não deixo de sentir certa inquietude enquanto passeamos por Uzushio. Ainda estão por aqui planejado alguma coisa? Penso em Kumo e na perigosa perspectiva de ataque à Kiri. Sabia que o ideal era que eu não me preocupasse muito com aquilo — afinal, o que eu poderia fazer? —, mas era inevitável.

A ideia de voltar ali fora de uma missão era muito agradável. Acabou que não comprei o artefato que prometi, penso no velho artesão com um pouquinho de culpa. Um dia, vou recompensá-lo pelo meu pequeno teatro. O pedido de retorno sobre nosso saldo da missão me pega de surpresa, então penso com cuidado por alguns momentos antes de murmurar, com um pouco de incerteza:

— E-eu gostei da parte investigativa. Pra falar a verdade... estou um pouco grato por não termos tido nenhum combate — admito, meio sem graça. — Lutas não são o meu forte, mas essa coleta de informações foi até... divertida. Nunca pensei que seria capaz de... m-mentir daquele jeito, então fico feliz. E-espera, isso soou estranho? — dou um sorriso com as bochechas coradas. — Tivemos que nos dividir, o que foi desafiador, mas até que seria interessante lutarmos juntos um dia. Só espero não atrapalhá-los... — Dou uma última olhada para Uzushiogakure e suspiro. — Eu amo história. É a segunda vez que saio de Kiri. Visitar esse lugar é uma experiência que não está nos pergaminhos. Olhar essa arquitetura de perto, ouvir sobre os Uzumaki, até os artefatos daquele senhor e as bandanas de Kumogakure, que vi pela primeira vez... Todos esses conhecimentos novos... me fazem valorizar o caminho shinobi.

Aguardaria outros retornos com atenção e, caso tudo estivesse tranquilo, seguiria de volta para casa — ansiando pela névoa característica.