”O que houve a partir dali eu não posso explicar muito bem, pois nem mesmo me recordo. Senti que naquela situação desesperada, uma medida desesperada foi necessária para nos salvar. Eu sei que aquele demônio nunca gostou de ficar preso no corpo de um humano... mas diante do perigo de ser aprisionado em um homem pior, ele preferiu a mim.

De bom grado eu cedi o meu corpo e a minha consciência ao demônio da areia. Permiti que ele se libertasse naquele momento, sem nem mesmo exigir ou pedir para que o Ichibi não me matasse no processo. Eu aprendi com Fukasaku que se um demônio de caudas toma o controle do seu Jinchuuriki, inevitavelmente ele morre, deixando o demônio vivo para seguir seu caminho. Era a oportunidade perfeita para ele, e eu não pedi para que agisse diferente... eu apenas confiei e lhe cedi o controle, sem oferecer resistência, me desligando da minha mente e do meu controle de chakra... Shukaku estava livre e eu podia, finalmente, descansar.

Quando acordei eu estava novamente no meu corpo, longe daquele abismo sem luz... olhei para as minhas mãos, para um vidro quebrado no chão e me enxerguei. Logo depois eu olhei para toda destruição em minha volta e os pedaços que sobraram daquele malfeitor. Bem como eu confiei, eu tive a minha confirmação... aquela besta no final das contas possui honra. Ele não joga sujo, e eu gostei de saber disso.

No decorrer da caminhada para casa eu pude conversar com o Shukaku. Aquela experiência destravou em mim uma habilidade de mergulhar em meus pensamentos... e quando mergulho fundo eu o vejo em sua jaula. Durante dois dias de caminhada eu o visitei sempre que repousei na sombra de uma árvore... conversei com ele do outro lado da grade, tentei entender como ele pensa, como ele se sente... e no terceiro dia eu o libertei daquela prisão, lhe dando novamente a escolha de fazer o que quiser. Mas quem diria? Ele escolheu ficar.

Não sei como aquela sintonia foi possível, mas ao longo dos dias, semanas... eu e o Shukaku nos tornamos próximos. Eu não tinha ninguém mais, nem familha, nem amigos... apenas o velho Fukasaku que é muito ocupado em suas obrigações. A besta da areia também não tinha ninguém, e eu entendia bem a dor da sua solidão. Talvez a solidão seja um laço que nos fez aceitar a nossa condição... eu Jinchuuriki, ele um demônio aprisionado.

A partir daquela espécie de amizade eu pude aprender melhor a controlar aquele poder... o próprio demônio foi o meu professor. Em troca, eu prometi que jamais permitiria que alguém o escravizasse como um dia aconteceu... e mais... um dia eu o levaria para ver o mundo, e o levaria de volta ao deserto, onde ele sente falta e onde ele se recorda com saudades de um grande amigo de outrora. Assim como o Shukaku, eu manterei a minha honra... e farei valer a minha palavra.”
[Tobirama Uchiha, Jinchuuriki no Ichibi]