Segurava uma kunai na destra, firmando-a no punho. Do outro lado o oponente, um grande urso. Permanecia lateralizado, observando-o atentamente. Já batalhavam antes e se lembrava dele pelos cortes que lhe fizera nas pernas. E a besta também se recordava das feridas já quase fechadas em seu bumbum. Ela urrou e voltou a avançar. Não era ágil, porém tinha força o suficiente para arrancar uma árvore com suas garras. O garoto era justamente o contrário, tinha agilidade e lhe faltava físico. Desviou do animal com uma finta lateral, enganando-o. Tentou um arco com a lâmina, contudo a lâmina não cortou a pele grossa dele. O ataque foi revertido, uma patada certeira que o fez viajar no ar até uma árvore e nela cessar em um impacto.

Guinchou de dor e desmaiou. Bastava. A fera recolheu-se de volta à mata, contava com outra vitória. Despertou no dia seguinte irritado. Embora um Genin, já acumulava uma série de derrotas e, recentemente, seu rival aparentava estar em forma, possivelmente tendo treinado à exaustão. Não poderia perder tempo, odiava a derrota e a sensação que dela surgia. De pé numa noite escura e de ausentes estrelas, praticou o seu físico. Iniciou com uma série de polichinelos, seguido de muita flexão dos braços e do abdome, além de barras fixas executadas improvisadamente num galho grosso paralelo ao solo rochoso. Uma semana e bastava, estava finalmente com alguns poucos músculos.


Agora com alguma força física, decidiu que se dedicaria a outro atributo de mesma ordem: sua velocidade. Treiná-la continuava um grande problema. Afinal, o que além de corrida poderia fazer? Sem muita ideia, optou pelo básico. Rodeou o terreno ocupado pela fazenda de sua família, um grande pasto e plantação que somava alguns hectares de extensão. As passadas dadas eram imponentes, com técnica e discrição, todavia não menos aceleradas e graciosas. Avistado por seu pai adotivo, acreditou o senhor estar diante de alguém que pulava enquanto corria, quase um voo. O jovem ninja executou a corrida matinal por alguns dias, até que as pernas fadigassem e registrassem uma dor considerável. Na ausência de condição para praticar com os membros inferiores, voltou-se aos superiores.

Nos fundos de sua residência havia um quarto abandonado. Aquele era um lugar que guardava vários equipamentos de treinamento, e, dentre outros, havia um saco de pancadas. A partir dali, faria dele a sua nova rotina. A intenção? Simplória, era a de fazer com que os seus braços se movessem à velocidade das pernas, treinadas à exaustão. Reclamava de dor e coxeava, por sorte era detentor de uma determinação admirável. O urso lhe veio à memória e tão logo iniciou. Acertou uma sequência de socos, uma barragem sem fim. Inexistia um limite ao seu tentar. Exercitou-se durante o dia e à noite, sem fim, somente cessando quando desmaiou.


Foi levado à cama e despertou no dia seguinte com dores por todos os lados. Desconhecia tamanha enfermidade em treinamento, talvez seu ímpeto o tivesse feito exagerar. De qualquer modo, o urso conheceria sua fúria quando se reencontrassem. Fazia frio, este que piorava suas condições. De todo modo, arrastou-se à cozinha e bebeu café. Acordava, de fato. Transitava tranquilamente por entre o piso de madeira, deixando a cozinha e indo à sala. Viu seu pai extremamente concentrado à mesa, jogando contra si próprio numa partida de shoji. Ele não era nem um pouco versado, ainda sim era ardiloso e castigara vários letrados em partidas como aquela.
— Que tal uma partida, Ieyasu-kun? — convidou sorrindo.

O garoto pensava em recusar. Contudo, se o fizesse, estaria perdendo a oportunidade de aprender e exercitar a mente. Sentou-se de frente à velha fuinha e vislumbrou o tabuleiro e as peças. Iniciou-se o combate mental. Cada movimento do homem era provocativo e levava o menino a armadilhas que ele só se daria conta momentos mais tarde. Em trinta partidas foi derrotado e nas trinta sofrera com estratagemas distintos.
— Fufufu! E pensar que um velho como eu poderia derrotar Ieyasu-kun... — provocou ele.
No dia seguinte continuava dolorido. E, por isso, concluiu ser melhor arriscar-se outra vez numa partida de shoji. Enfrentaram-se. Duas personalidades completamente distintas, atacando um ao outro com o arrastar de pequenas peças de madeira. Findaram-se em um empate, depois de tudo. Era improvável, porém acontecera. Restaram os dois reis e não restavam possibilidades de finalizar aquela partida. Poderia jurar que sua cabeça trabalhava diferente agora, como se estivesse mais ágil. Poderia ser também o efeito colateral das dores, um delírio.


Desde o início de toda aquela loucura sob modelo de um treinamento, não houve sequer um segundo de descanso. Era isso que fazia nesse dia, observando a colina que descia à frente e formava um mar de grama baixa verde. Amava poder contemplar paisagens, sobretudo as belas. Seria aquilo a mão de deus? Isto é, não poderia os humanos terem criado algo tão bonito. Naquele instante, recrutou-se a voltar a ficar de pé. Escolheu o caminho do Ninshu, as proezas que somente um ninja era capaz. Já conhecia o raio e alguns jutsus básicos. E não lhe bastaria, decerto, o conhecimento raso. Aprofundar-se se revelou essencial.

Fechou os olhos e viu o escuro. Confinou-se na abóbada negra. Refletiu, então, de tudo o que aprendeu. Da academia até agora, cada pequena coisa vivida. Os pormenores residiam nas palavras ditas há muito por seus professores. Talvez fosse rebelde demais para entendê-los. Saiu do negro e observou ambas as palmas. Juntou-as, pressionando uma contra a outra. Transmitiu o trovão, confrontando ao seu próprio potencial. O chakra tem a função de conectar... filosofava o sensei em momentos inspirados. Pensou na conexão, em unir a sua energia na forma de uma linha. Praticou sem parar, até finalmente lograr sucesso. Ali estava, uma forte fagulha que se transmutou rapidamente numa tempestade. Atingiu o solo e o rachou em diferentes partes. Desvendou, enfim, o oculto no ninjutsu.

Senju Ieyasu; 525/525 525/525 00/04

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